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LUCAS.

Minha cabeça tá fervendo. Eu tô pilhado pra caralho por conta dessa notícia. Eu não esperava ser recebido assim, com uma descoberta de uma gravidez, uma negação, gritos nossos.

Pô, não esperava mesmo. Só queria chegar em casa depois de um longo dia exaustivo e ver que está tudo bem com a minha mulher, que iríamos sair pra jantar que nem programado, que a gente ia ficar tranquilinho a noite toda.

Eu queria estar feliz com essa situação. Mas não tem como, tá ligado? Minha maior vontade realizou, e ainda com a mulher que eu escolhi dividir uma vida, mas a situação que nós dois estamos não me deixa ser contagiado por uma vibração de alegria. Na real me faz sentir afoito, medroso. Medo de passar por tudo novamente.

Sei o quão complicado é ser mãe, é uma puta responsabilidade. São noites sem dormir, o filho se torna primeiro plano e as algumas coisas que antes eram prioridades, vão sendo deixadas de lado. Mas tudo isso piora quando não tem um apoio, uma pessoa que vai dividir tudo.

que ela me tem.

Mas não consegue ver isso. Não enxerga que juntos podemos ser uma família. Não enxerga que eu vou estar ao lado sempre, dando apoio, dividindo tarefas para não sobrecarregá-la, que nós dois damos certos demais.

- Como descobriu isso? Você ia colocar o diu.

- É, eu ia. Mas pra colocar é feito várias exames. Desde o beta hCG, até ultrassonografias, e o valor do exame de sangue deu maior que o normal, e quando fomos refazer a ultrassonografia tinha um feto lá. - responde. Eu sei que ela passou tempo demais chorando, o rosto tá bem inchado, a voz bem rouca. - A médica me enviou, aqui.

Me mostra o celular e ali tem uma foto. Não consigo ver nada, mas ela senta ao meu lado, receosa, e aponta pra uma parte mais pra cima, uma manchinha branca, borrada.

- Isso é o bebê? - pergunto e ela concorda. Dou um zoom e meu coração acelera. - Então é sério mesmo, caralho...

- Acha mesmo que eu brincaria com isso? Com a coisa que menos desejei pra minha vida?

- Eu tô tentando entender seu lado, Júlia. De verdade, de coração mermo, mas é difícil pra caralho, pô. - devolvo o celular pra ela e me levanto. - Só que você não tá pensando em mim. Eu te contei aqueles bagulho todos, eu te dei oportunidade pra você falar sobre o assunto, custava abrir a boca e dizer que não tinha vontade de ser mãe? Tenho certeza que não, mas tu fugia. Eu só não quero perder mais duas pessoas especiais pra mim. Só isso que eu não quero.

- Eu sei, eu realmente não pensei em você, na situação que passou. Mas é que é complicado pra mim, eu não sei lidar com isso. Eu tenho só vinte e dois anos, eu acabei minha faculdade agora, minha vida tá no auge, e logo agora eu recebo essa notícia?

- E ao invés de me ligar, falar que precisava conversar comigo, você sumiu. Foi pra Itacuruçá, mas não teve coragem de pegar o celular e me responder. - falo chateado. Isso me estressou muito ontem. - Foi responder duas horas da manhã e ainda com uma coisa nada a ver.

- Errei, Lucas. Reconheço, tá legal? Mas por favor, tem como a gente não falar mais sobre isso, pelo menos por hoje. - levanta, calçando o chinelo, desligando o computador e indo pro nosso quarto. Sigo ela e vejo ir pro closet, pegando a maioria das roupas dela e jogando na cama, pegando uma mala pequena e colocando tudo dentro. - Vou ir pra minha casa. Se eu ficar aqui nós vamos discutir de novo e eu não quero isso. Então pelo nosso bem, amanhã a gente conversa.

- Faz o que quiser. - respondo, indo pra fora do quarto.

Minha vontade é de esmurrar a parede. Pego um copo de dose e coloco whisky dentro, saio pela minha casa procurando minha maconha pra dichavar e ver se alívio um pouco da tensão que tomou meu corpo por completo. Quando estou terminando de dichavar pra puxar balão, ela aparece na sala com a mala do lado, a bolsa no ombro.

- Tô indo nessa. Eu te envio uma mensagem amanhã pra gente sentar e conversar, tudo bem? Ou você me avisa quando quiser ter esse conversa.

- Vai de que? - pergunto.

- Pedi um uber, está chegando já. - responde, dando carinho pro nosso cachorro. Ele tá tristão, percebi isso já. - Tchau, filho, depois a mamãe volta pra gente ir passear.

Ela consegue chamar o cachorro de filho e se intitular mãe dele, mas não consegue pensar na possibilidade de que agora ela é mãe. Que nós dois somos pais.

- Cancela! Eu vou te levar. - levanto, já pegando o controle do carro e indo pra porta. Ela diz alguma coisa e eu nem dou bola. Entro no carro primeiro e fico esperando ela, que entra minutos depois.

O caminho que era feito sempre com ela conversando, contando sobre o dia, sobre qualquer coisa fútil, foi o oposto hoje; total silêncio.

Paro em frente a portaria do prédio dela e desço pra retirar a mala do banco de trás. Quando coloco no chão, ela me olha, respira umas três vezes pelo que posso contar e abre a boca.

- Eu já tomei minha decisão. Vou esperar você retornar pra que resolvemos como isso tudo ficará.

- Tá bom, Júlia. Depois das quatro da tarde estou livre, você me avisa e a gente resolve isso. - respondo.

Ela parece estar sem graça. Sem saber como agir. Seu corpo vem pra frente, mas ela para, me olha e se afasta, dando um sorriso sem graça.

A gente tá igual dois estranhos. Não teve um beijo, um abraço, um toque. Volto pra dentro do carro quando vejo que ela já adentrou e o cheiro doce do perfume tá por todo o carro. Piso no acelerador e vou fundo, sem ligar que precisarei pagar multa, que quase causei dois acidentes.

Eu só quero esvaziar a porra da minha cabeça.

Talvez eu realmente não seja merecedor de um final feliz. Que todas as vezes que a minha felicidade tá completa alguma coisa acontece, me frustrando pela quebra de expectativas.

Depois de quatro anos eu consegui ser eu mesmo. Eu deixei alguém entrar na minha vida de vez, tomar espaço por espaço, só que agora existe chances dela ir embora. E tudo isso por causa de um filho.

criei um grupo de leitoras. O link está disponível no meu perfil.

NASCER DO SOLOnde histórias criam vida. Descubra agora