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amor que cura - Chris Mc.

JÚLIA.

24 de outubro, 2023. - 21 semanas.

Hoje eu sonhei. E foi um sonho tão lindo, um sonho que parecia ser real. A bebê estava no meu colo, numa roupinha branca, ela era tão perfeita, delicada. Ela era a junção perfeita entre mim e Lucas, as bochechas grandes, o nariz arrebitado, o cabelo pretinho e cheio e a mão dela era tão pequena.

E ela tinha um nome.

Ísis.

Esse era o nome dela. Eu sussurrei seu nome e, quando ela parecia que iria olhar pra mim, eu acordei. Mas eu sinto a presença dela até agora. O rostinho dela não sai da minha cabeça.

Enrolo a toalha no meu cabelo e paro em frente ao espelho, vendo que minha barriga está mais evidente, pego meu celular na bancada e tiro uma foto. A primeira foto evidenciando a gravidez. Analiso ela, o espelho embaçado pelo vapor da água quente, a barriga pontudinha, mas ainda pequena. Solto um sorriso feliz.

Eu penso três vezes antes de postar nos melhores amigos do instagram, até porque pouquíssimas pessoas sabem sobre. Mas eu posto. Uma hora ou outra todos vão saber.

E na mesma hora saio de lá, colocando uma playlist pra me arrumar. Coloco uma cueca que roubei do Lucas e a parte de cima de um top de academia. Analiso meu armário pensando em o que vou usar, minhas calças jeans já não servem a maioria, ficam me apertando, alguns vestidos também ficam pequenos na parte do seio ou, então, não fecham por terem zíper na lateral ou nas costas.

Procuro alguma saia e uma parte de cima pra vestir. Uma música começa a tocar e eu começo a cantarolar junto enquanto experimento peças de roupas para ir trabalhar.

- Assim como sou, eu prestei atenção quando cê apareceu... Cê me fez achar que meu pior defeito seria ser eu. - coloco a saia branca e sento na cama, de frente ao espelho. - Como se não sentisse nada de bom, cê foi o que doeu. Sentia que nada andava no caminho, que algo em mim morreu.

...

E eu me deixei me levar pelas suas frases, me afastei do que eu amava, eu me tornei metade. Da sombra do que um dia eu fui, só me faltou coragem.

Eu precisava me entender pra não me ver covarde.

Eu precisei me entender pra não ser covarde por você. De ter aquelas atitudes que com certeza eu me arrependeria depois...

- Um dia alguém vai chegar, o amor que cura. Me abraçar e me segurar, só não me segura, me mostrar que ainda vale amar e cumprir a jura de ficar e não abandonar da forma mais pura.

Minha voz parece querer sumir pra dar espaço ao choro que quer aparecer. Mas eu não vou chorar, não hoje, não quando eu me olho pro espelho admirando essa barriga, não quando essa música toca pra ela. Essa música é de nós duas.

Ela é o amor que cura.

E eu estou cantando pra ela. Ainda não toquei a barriga nesses quatro meses, ainda não consegui conversar com ela, mas eu tenho certeza que a bebê sente que eu estou dedicando isso pra ela. Por mais que não tenha sido a intenção no início.

- Cantar as canções que fiz pra falar da sua, importância pra mim, só cê não me rotula. Pra cuidar de onde me feri sem lembrar a tortura, o que é sempre melhor pra nós parece loucura.

Eu achei essa gravidez uma loucura. No início é até pouco tempo. Mas talvez ela veio para me mostrar que a gente nunca vai ter o fim que queremos. Desde a primeira respiração, da primeira batida do coração, nós já somos destinados a algo. Muitas vezes não entendemos. Não compreendemos do por quê das coisas fugirem da nossas vontades, mas sempre é pro melhor. Para sermos a nossa melhor versão.

- Um dia alguém vai chegar, o amor que cura. Me abraçar e me segurar, só não me segura, me mostrar que ainda vale amar e cumprir a jura de ficar e não abandonar da forma mais pura...

Uma lágrima cai em cima da minha barriga. E quando encosta na minha pele eu fico estática, minha respiração falha, minha boca fica entre aberta e a música continua.

Ela mexeu.

Eu tenho certeza que eu senti ela se mexendo.

Me levanto e fico ainda perto do espelho olhando diretamente pra minha barriga.

- Um dia alguém vai chegar, o amor que cura... - cantarolo o final da música. Meu coração tá batendo muito forte. - Me mostrar que ainda vale amar e cumprir a jura de ficar e não abandonar da forma mais pura.

Uma mini ondulação na minha barriga. Eu vi. Eu de novo senti essa sensação maluca e tão única.

Cumprir a jura de ficar.

Desculpa, neném. Desculpa ter me desfeito de você quando descobri e por mais uns dias. Você não tem culpa de nada, você só veio pra mostrar que eu precisava melhorar, que eu não posso ser egoísta, que eu posso sim vencer meus medos.

- Irmã, você vai a... - a Luísa adentra meu quarto. - O que foi? Por que está chorando?

Vem até mim limonada meu rosto. A barriga dela já está enorme também, em três meses o bebê nasce.

- Ela mexeu, Lu. Ela mexeu. - sussurro, controlando a vontade de me debulhar em lágrimas e mais lágrimas.

- Ela quem mexeu? - pergunta, sem entender.

- A bebê. Ela mexeu! - solto um sorriso e me viro de novo pro espelho.

- É uma menina? - pergunta, eufórica. Concordo com a cabeça e ela me abraça. - Não acredito! Ai, meu Deus! Ela mexeu, Júlia.

- Eu... eu só senti. Ela se mexeu duas vezes...!

- Você vai ser uma mãe perfeita, Júlia. Você já está conseguindo. Olha pra sua situação; feliz porque ela se mexeu, feliz por ser uma menina. Você está conhecendo a sua melhor versão, ela está te fazendo ser.

- Eu quero ser a mãe dela.

- Você é a mãe dela. Não há nada que te impeça, está me ouvindo? Nada e nem ninguém vai te impedir de você viver isso.

Eu sou a mãe dela.

E ela é o meu amor que cura.

NASCER DO SOLOnde histórias criam vida. Descubra agora