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JÚLIA.

25 de outubro, 2023 - 21 semanas.

Guardo a última peça de roupa na mala. Estou organizando tudo pra ir pra Itacuruçá, o ar daqui do Rio parece estar pesado pra mim, sufocante. Então eu me dei esse luxo de ir ficar na casa dos meus avós por no mínimo três dias.

Vai ser bom pra mim e para ela.

- Eu achei que você ia estar aqui pra conhecer a casa...

- Oi? Como assim? - pergunto, parando de fechar a mala e olhando pra minha melhor amiga.

- Eu e o Caio compramos a nossa casa. - responde. Eu abro a boca em choque com a informação. Não achei que ia ser assim tão rápido. - E eu queria te levar pra lá.

- Oficialmente abandona! - faço um drama e me deito na cama junto dela. - Brincadeira, amiga. Ou não, porque vou ficar um pouco sim... mas fico feliz por vocês. Estão construindo uma família, já já esse neném vem, vocês vão se casar, e eu fico muito, muito, muito feliz com tudo isso. Depois de todo aquele auê de vocês, finalmente encontraram a paz no amor de vocês.

- É tão maluco pensar nisso tudo, no que estamos construindo, sabe? Olha pra nós, tempos atrás estávamos pulando janela pra sair escondido, hoje estamos grávidas, construindo uma família, indo morar junto, casando em breve.

- Você, né, Lu... - murmuro, sentindo o peso dessa frase.

- Júlia, vocês tem que se resolverem. Não tem como ficarem assim pra sempre, você sabe. - minha melhor amiga diz. E eu fecho os olhos  querendo ignorar tudo. - O amor de vocês foi lindo, é lindo, tanto é que tá vindo uma garotinha pra provar um tanto de coisas.

- Não, Lu, ele não acha isso! Ele não achou isso a partir do momento que colocou um contrato na minha frente com dez cláusulas diferentes, entre elas: eu nunca poder ter o direito de me intitular mãe dela e receber o pagamento de cem mil reais. - rebato, relembrando desse dia. - Se fosse a Júlia de antes, com certeza eu assinaria sem pensar duas vezes, mas agora não, eu não sou mais aquela garota que vê a gravidez como uma destruição. Errei em ter reagido daquela forma? Sim! Já reconheci.

- Irmã, você sabe muito bem que não tenho lado nessa história. Sabe também que apoio você em absolutamente tudo, mesmo muitas das vezes não concordando, e sabe que eu falo mesmo... mas poxa, você também tinha que pensar no lado dele. Não me contou que ele já sofreu com a perda da noiva e de um filho? Então, coloca isso na balança, assim como de início foi complicado pra você, também está sendo pra ele. Longe de mim defender esse contrato maluco, mas aquilo ali pra ele era só uma garantia.

- Garantia do que, Luísa? De ter a certeza que me humilhou?

- A garantia que, caso você vá embora e volte depois de anos querendo ser a mãe dela, não quando tudo estiver bem pra eles. Porque querendo ou não, isso tudo ia causar uma confusão enorme na vida dela. Uma hora ela não tem mãe e depois outra hora surge? Tem que pensar assim também.

- Eu me senti humilhada, Lu. Você não tem ideia...

- Júlia, eu não tô defendendo o Lucas. Mas você também se colocou no lugar dele? De ter que lidar com perda de pessoas que em um momento era tudo na vida dele e depois virou um nada? Que ele recebu a notícia por um telefonema e teve que ir até o lugar pra tirar o corpo?

- Ele nem sabia da existia do filho ainda.

- Viu, ainda pior! E aí você ia querer tirar o direito dele de ser o pai que ele não pôde ser do primeiro? - pergunta, e eu fico calada. - O problema de vocês é que nem um dos dois enxerga que vocês podem sim ser os pais dela, só querem jogar um na cara do outro os deslizes que cometeram desde o início de tudo, a falta de conversa de vocês para se resolverem não deixa nem ele e nem você viverem nada juntos. O que vão colecionar dessa gravidez? Choros, brigas, dores? A gravidez é a coisa mais linda, tenho certeza que você está sentindo isso, mas aos poucos ela se torna dolorida pelo o que vocês andam fazendo com vocês mesmos. Principalmente com a bebê, que não tem culpa alguma.

- Eu não quero mais olhar na cara dele, Lu! Por mais que a minha maior vontade seja ficar, eu estou sentindo que ele não quer isso. Então talvez essa seja a única solução. - ela me abraça. - Porque se não estamos dando certo em tratar assuntos assim, imagina quando ela nascer?

- Tenho certeza que ele quer que você fique, Júlia. O Lucas só deve ter medo de ser algo passageiro essa aceitação sua, deve ter medo de uma hora pra outra você sumir, não é justificando essas atitudes dele, mas essa é a forma que ele encontrou de se defender caso aconteça.

- Ele tem vinte e oito anos na cara e ele encontrou o jeito de se defender assim? Me rebaixando como mãe a partir do momento que joga na minha cara que todas as responsabilidades serão dele já que estarei usufruindo do dinheiro. - sento na cama pra voltar a organizar minhas coisas pra pegar estrada. Vovó já deve estar me esperando. - Não, Luísa, isso é demais pra mim.

- Vocês dois tem que sentar e conversar. A partir daí vão decidir o que é melhor pra ambos, porém eu tenho total certeza que o orgulho de vocês vai acabar com o que pode ser lindo. Só precisam deixar ele de lado e conversar. Isso não signica que vocês vão voltar, mas sim que terão uma boa relação por conta dela. A única coisa que importa de verdade.

LUÍSA.

Paramos em frente a nossa casa. Depois que a Júlia pegou estrada o Caio chegou pra me buscar e cá estamos nós, na nossa primeira casinha. Com a nossa família.

Solto uma sorriso quando ele encosta na minha barriga, e o nosso filho já se remexe todo quando ouve a voz dele.

- Tua casa nova, moleque! Vai ter altas paradinha pra você e tua irmã...

- Já está me engravidando de novo, Caio? Pelo amor de Deus.

Saímos da garagem e entramos na primeira porta que dá acesso a uma sala enorme, com vidros, paredes brancas, lustres. Muita coisa que nem nos meus sonhos era possível.

- Nossa família, Loira. Depois do Miguel vem a nossa Alice.

- O nosso Miguel vai ter que esperar um pouquinho a irmã, amor. Nós temos que curtir um pouquinho mais também...

- A gente vê isso. - ele pega a minha mão e vai me levando nos cômodos, já tinha algumas mudanças nossas aqui que fomos comprando e deixando. - Pensa neles brincando ali, a gente aqui curtindo de boas vendo eles.

- Eu tô maluca pra ter ele aqui  nos nossos braços. - abraço ele de lado, olhando o gramado que tem alguns brinquedos.

- Não é que a gente virou uma família mesmo... igual quando falávamos quando adolescente.

- Depois de quase dez anos aqui estamos nós. - sorrio, passando o outro braço ao redor do corpo dele. - Agora só falta o casamento.

- Já já. Só nosso menininho nascer e a gente faz.

NASCER DO SOLOnde histórias criam vida. Descubra agora