141.

977 122 40
                                    

LUCAS.

Eu apareci aqui de maluco mesmo. Tava ligando e mandando mensagem, mas ela nem dava papo. Aí tive que apelar pro Caio, perguntando onde a irmã dele está com a minha filha, pedi endereço e tudo. Brotei aqui só pra resolver, mesmo sabendo que dava para esperar ela voltar pro Rio.

Minha mãe já dizia que quem quer faz as paradas. Então eu que mexa os pauzinhos, né? Porque se depender da Júlia...

- Pneu furou, Júlia. - no exato momento que paro na porta da casa dos avós dela acontece isso. - Puta que pariu!

- Tem o estepe. Vou pedir pro meu vô vir te ajudar a trocar. - fala, saindo do carro e entrando pra dentro da casa deles.

Desço e vou pro pneu dianteiro, colocando o pé e vendo que realmente furou. Vim resolver a parada legal e saio daqui com outro b.o, por isso que chamava ela de problemão. Quando levanto depois de ver que tem um rasgo, tem três cabeças aqui fora: ela, do vô e da esposa dele.

- Pneu furou, moleque? - Adenor fala, vindo pra perto de mim com uma lanterna. - Tá feio, rasgou fora a fora...

Concordo com a cabeça e vou pro porta malas na procura de ferramentas pra trocar até ir em uma borracharia para que eu volte pro Rio. E lá eu troco o pneu.

- Já são onze da noite, não sei acha uma borracharia aberta essas horas por aqui. - o homem fala pra mim, enquanto mexe no pneu do meu carro.

- Não, vó... - Júlia sussurra e eu olho pra ela, que se cala.

- Lucas, não acha melhor dormir essa noite aqui? Amanhã você procura uma e volta pro Rio. - Cida diz. O velhote olha incrédulo pra ela e ainda solta uma tosse. - Não é, Adenor?

- Hm? - solta outra tosse. O velho vai morrer nessa possibilidade. Tá igual a neta, incrédulo. - Dormir aqui?

Nego com a cabeça agradecendo. Já tentando achar algum lugar aberto essas horas, mas nem isso tá dando. Desvio meu olhar pra Júlia que está encostada no portão, em silêncio, só analisando o avós conversando e não olha pra mim só porque sabe que meu olhar está nela.

- É... Dorme aqui, vai ser melhor. - o vô dela diz bem contra gosto, mas a dona Cida deve ter falado tanto que o coitado aceitou. - Amanhã a gente resolve isso.

- Não, obrigado. Vou arranjar um jeito, qualquer coisa eu peço pra alguém vir me buscar. - nego mais uma vez. A Júlia suspira e arruma postura, vindo pra perto de nós. - Podem despreocupar, dou um jeito aqui. Valeu!

- Lucas, faz o que meus avós estão pedindo. Realmente pode ser perigoso voltar essas horas. - ela diz.

Não respondo. Só continuo a procurar o contato do Felipe pra vir até aqui me pegar, mas a mensagem nem chega pra ele. Nem pro Matheus.

- Lanterninha, Cida, vão lá pra dentro. Vou ajudar a colocar o carro dele pra dentro. - o velhote diz. Eu suspiro fundo e a Júlia concorda.

Tô nem com vontade de dormir aqui. Até porque a Júlia nem parece querer. Quando elas entram, eu viro pro homem e já volto a falar que não precisa colocar o meu carro pra dentro porque eu vou voltar hoje. E também porque nem ele quer eu dentro da casa dele.

- Cala a boca, cabra. Vai botar o carro lá dentro sim, faz o que a mãe da sua filha disse! - desliga a lanterna. Pega a chave da minha mão e entra no carro, ligando.

O portão se abre e ele faz uma manobra pra colocar na garagem, onde tem outros dois carros. O da Júlia e um que provavelmente é deles. Coço a barba e vou pra dentro, tenho nem nada pra fazer mais.

Ele me devolve as minhas coisas e eu o sigo, que vai até a sala onde as duas estão. Elas me olham e a Cida fica em pé.

- Júlia, arruma a cama pra dormirem. - pede, desligando a televisão. - E Lucas, fica tranquilo. Amanhã resolve isso.

- Ele vai dormir junto da minha lanterninha? - o avô pergunta. E aí eu lembro que esse é o apelido da Júlia. - Ô, Cida...

Coé, já meti uma filha nela e ele nessa de não dormir junto? Deve achar que foi cegonha, pô. Segurei até a risada.

- A gente não vai dormir juntos, vô. Ele vai dormir no chão lá no quarto. Ou aqui na sala.

E aí minha vontade de rir até some. Olhei pra ela, mas nem contestei nada. Não era pra eu estar aqui essas horas. Mas na sala? Porra, esculacho já.

- Vocês que resolvam aí. Nós já estamos indo dormir. - a avó responde, puxando esse velhote junto.

Eu olho pra Júlia e ela vai até o quarto, acendendo a luz e eu vou junto, né. Paro no batente, com os braços cruzados, vendo ela arrumar a cama e tirar um colchão de um armário que tem no quarto, junto de uns lençóis e travesseiro.

- Esculacho fazer eu dormir no chão, Júlia. - falo, tomando a atenção dela pra mim. - É assim que você trata o pai da sua filha?

- Cala a boca, Lucas. Já estou fazendo muito te fazendo dormir no mesmo cômodo que eu. - arruma meu colchão e depois a cama dela. - Pode deitar aí já. Só não ronca pra me atrapalhar, porque a sua filha já não me deixa dormir direito.

- Como assim não deixa você dormir?

- Ela começou a se mexer, aí noite passada nem dormi muito bem. - responde.

- É sério? Ela já tá mexendo? - concorda com a cabeça. Eu fico até que feliz por saber que a minha filha está se mexendo, que a Júlia pareceu gostar disso, e que até ama ela. Mas também fico mexido por saber que não estive junto quando isso aconteceu pela primeira vez. - Será que ela mexe agora?

- Não sei. - dá de ombros e deita na cama de casal. Eu fecho a porta e fico vendo ela esparramada na cama, com a barriga apontada.

Eu vi a foto que ela postou nos melhores amigos. Ela grávida. Foi a primeira que ela postou, a que ela mostrou pras pessoas que está grávida. E eu até tirei print e fiquei vendo por minutos.

- Posso tentar? - pergunto, sentindo um receio de chegar perto. Podemos ter conversado, mas ainda não sei se estamos bem.

- Pode. - tira a atenção do celular e me olha. Eu sento na cama junto dela e olho pra barriga que está tampada por uma blusa de frio. - Você é o pai dela, Lucas. É certo criar um laço desde a barriga.

Ela puxa um pouco da blusa pra cima e deixa a barriga a mostra. Toco e começo um carinho.

- Como foi sentir ela se mexer? - pergunto.

- Estranho. Mas muito bom! - responde. - Não estava preparada. Foi enquanto ouvia uma música.

- Qual?

- Amor que cura. - diz. Lembro que foi eu quem apresentei essa música pra ela. - Aquela que você me mostrou. E aí ela se mexeu. E foi... foi emocionante pra mim!

- Entendi. - encosto minha testa na barriga dela. Movimento minha mão de um lado pro outro. - Filha... É o papai.

Tento conversar. A Júlia está prestando atenção. E não faço mínima ideia se ela está gostando ou não desse toque.

- Continua, vai que ela mexe.

- Filha, esses dias eu sonhei com você. E tu era a coisa mais linda, e também tinha um nome, mas isso a gente vê com a mamãe depois... Sabe, deixa eu te contar um pouco da história: de início, até hoje, foi um pouco difícil pra nós, você veio de supetão, mas eu tenho certeza que veio pra mudar a gente. Não tivemos boa fase desde a descoberta, essa é a nossa primeira vez em família. Mas nós prometemos por você.

E ela não se mexe. Eu já não sei o que falar, porque eu fico meio bolado por ela não mexer pra mim. A pessoa que sempre quis ela, desde o início.

- Não fica assim não. Quando menos esperar ela mexe. - diz, também parecendo estar desconfortável.

- Hm, vou deitar então. - concorda. Eu apago a luz e nós ficamos em silêncio. - O nome dela no meu sonho era Ísis...

- Ísis...

Ela queria falar mais. Só que ela se calou.

Mas ela é a nossa Ísis.

NASCER DO SOLOnde histórias criam vida. Descubra agora