Sentimentos confusos (91)

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Obsidiana:91

Eu e a Tatiana entramos em casa. Já era tarde. Estivemos no velório da mãe da Tatiana. A Caracolinhos estava muito abatida. Não disse uma palavra no caminho para casa. Temos estado assim o dia todo. 

É estranho, nós costumamos falar. Nem que seja a implicar um com o outro. Mas não apetece falar. As palavras que a Tatiana disse sobre mim, ainda andam à roda na minha cabeça. Eu sei que ela tem razão. Eu sou um monstro e só estrago a vida dela.

Eu tenho que me afastar dela, definitivamente. Eu sei que sou egoísta que por mim eu não me afastaria dela, mas agora não posso ser egoísta com a Caracolinhos. Eu vou deixa-la viver a sua vida e vou deixa-lhe esta casa.

A Tatiana sentou-se no sofá, dobrou-se sobre as pernas e respirou fundo. Eu sei que ela está a tentar não chorar. Eu não sei o que se passa comigo, mas sinto um sentimento estranho quando a vejo assim.

Eu a observo de pé. Não sei o que fazer. Sentei ao seu lado e a olhei. A Caracolinhos soltou alguns soluços, levantou a cabeça, limpou as lagrimas e olhou timidamente para mim, eu não aguentei e abracei-a. A Tatiana voltou a chorar e a soluçar alto. Eu fiz-lhe algumas festas no seu cabelo encaracolado.

Passado algum tempo, ela já estava mais calma. Nós continuávamos sentados no sofá, a Tatiana tinha a cabeça deitada sobre o meu peito. Eu continuava a fazer-lhe festas no cabelo. Há quanto tempo, eu não fazia um carinho a alguém. Pensei que já nem sabia o que fazer.

A Tatiana retirou a cabeça do meu peito e olhou-me nos olhos. Os seus olhos castanhos são tão bonitos e os seus lábios são tamanho prefeito, parecem ter sido desenhados.

" Obrigado, Joel." Ela agradeceu.

" Não tens que agradecer." Eu disse-lhe, fazendo uma festa delicada no seu rosto.

" Tenho sim. Apoiaste-me o dia todo e oferecestes a tua casa. Alias, eu amanhã, vou procurar um lugar para ficar." Ela disse e afastou a minha mão da sua cara.

" Não precisas, Tatiana. Eu já tinha decidido ir embora da cidade, antes do incendio e vou embora. O Jean vai ficar, mas a casa é grande podes ficar com ele, o tempo que quiseres." Eu disse-lhe.

" Vais embora?" Ela pergunta estranha.

" Vou. Eu não quero estragar mais a tua vida." Eu afirmei.

" Agora, que estavas a começar a fazer as coisas bem, é que vais embora." Ela refletiu sem olhar para mim.

" Tu própria já admitiste várias vezes que querias que eu me afastasse. Mesmo hoje de manhã, tu disseste que eu era muito complicado para ti. E tens toda a razão." A Caracolinhos estava a olhar para um ponto fixo no chão enquanto me ouvia. " O que é que foi? Não é isso que tu queres?" Eu perguntei.

" Era, Joel. Era isso que eu queria." Ela levantou-se. " Eu vou-me deitar, já é tarde." A Tatiana comunicou.

"Até amanhã!" Eu disse e ela nem respondeu. O que é que ela tem? Ela sempre quis isto. Fui até a mesa de bebidas e enchi um copo com whiskey. Dei um gole, bebendo metade do copo.

Eu preciso de ir o mais rápido possível. A Tatiana está confusa e eu ainda mais. Fui ao meu quarto e pus uma mudada de roupa num saco. Eu vou embora, agora. Não quero esperar nem mais um dia. 

Eu quero-me livrar do que sinto pela Tatiana o mais rápido possível. Eu não posso arriscar a ficar mais um dia e não conseguir deixa-la mais. A Tatiana está frágil e ainda me deixa mais vulnerável a ceder aos sentimentos.

Eu desci a escada. A casa estava em silêncio. Todos estavam a dormir. Não atrevi a ir ao quarto dela. Não a quero ver. Olho uma última vez para o interior da casa. Daqui um seculo, eu estarei de volta.

Saí decidido de casa. Fui na direção ao carro. Eu gosto de conduzir durante a noite. Eu estava a pensar em fazer uma viagem pelos países todos da europa. Abro a porta do carro.

" Joel!" Ouço a Tatiana chamar atras de mim. Eu paro. Viro-me para trás e encaro a Tatiana de pijama vestido. " Onde é que vais?" Ela pergunta.

"Vou-me embora. Já te tinha dito isso." Eu respondi.

" Não pensei que fosses hoje. Nem que fosses embora sem te despedir." Ela afirmei um pouco confusa.

" Eu não gosto de despedidas." Eu fechei a porta do carro e caminhei para ela.

" Mas podias pelo menos avisar. Eu tinha esquecido de como é que tu és." A Tatiana afirme parecendo magoada.

" Tatiana! Porque é que esperar mais? Eu tenho que ir embora. Ir hoje ou ir amanhã. É igual." Eu afirmei.

" É igual para ti. Porque devirias saber que para mim, não é. Mas tu só te preocupas contigo." Ela acusou-me. Eu fiquei confuso.

" Eu não estou a perceber." Eu disse.

" Joel, eu preciso de ti. É assim tao difícil de perceber. O chão abriu-se aos meus pés. Eu não tenho mais família, eu sinto sozinha e tu que estás a dar-me apoio, agora vais embora." Ela desabafou com lagrimas nos olhos.

" Tu disseste que não me querias na tua vida." Eu refleti.

" E não quero. Mas eu estou perdida e preciso de apoio. E esse apoio, és tu que estás a dar." Ela começou a chorar e eu não a consigo deixar.

Eu corro na direção da Caracolinhos e abraço-a. Ela chora. Eu seguro o seu rosto, acariciando-o. Desloco o meu dedo sobre os seus lábios. Quero tanto sentir o toque dos lábios dela nos meus. Olho os olhos castanhos dela, cheios de lagrimas. 

Aproximo-me lentamente o meu rosto da Tatiana. Fecho os olhos e sinto o toque dos seus lábios nos meus. Nós beijamo-nos calmamente, como eu há muito não beijava ninguém.

Eu não sei o que ela faz comigo, mas eu sinto-me bem. Nós paramos devagar o beijo e apenas ficamos olha-nos nos olhos. Eu não sei o que fazer. A Tatiana faz-me quer mudar, faz-me quer guardar o monstro que soltei numa gaveta e voltar e encarar o mundo dos sentimentos. Eu fiz-lhe uma festa no rosto, analisando-o.

" Não me deixes, pelo menos por enquanto. Eu preciso de ter alguém ao meu lado." Ela choraminga.

" Eu vou ficar por mais uns dias." Eu decido. Eu não a posso deixar. A Tatiana está muito frágil.

Um Monstro em tiOnde histórias criam vida. Descubra agora