Intitulado

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"Está escuro quando ele chega.

Os sinos da cidade eterna ecoam, cortando o ar, junto ao desespero de crianças e machos e fêmeas destreinados.

Aqui é um lugar de paz. Aqui, homens, mulheres e crianças, independente das diferenças, convivem em harmonia. Não crescemos para a guerra. Aquela há 500 anos fora o bastante para todos nós."

O escrivão mergulhou a pena no nanquim, suas mãos estavam trêmulas.

"O vento dele traz morte. Sei pelos gritos daqueles que estão perdendo seus entes queridos. Espadas tinem, deixando meus ouvidos zunindo com a agressividade. Ao longe, no mar, certamente não desconfiam do pandemônio instituído aqui, ou do sangue que mancha as pedras das ruas, enquanto observo de minha janela.

Não tenho mais saída, de todo modo. Vejo uma figura escura atravessando até o templo. Vejo uma jovem de vestido branco e cabelos castanho-dourados. Ele ri enquanto mata nossos guerreiros com a mesma facilidade de piscar.

Não podemos sair.

Ouço as vozes esganiçadas de meus senhores, as últimas defesas contra o que sabemos que ele veio pegar. Eu não sou defesa o bastante. Eu sou apenas metade do que já fui e me deleito de ser aquele que guarda a sala do grande artefato de destruição. Tudo silencia neste que deveria ser o prédio mais seguro da cidade.

Algum golpe poderoso atingiu meus senhores, pois luz entrou pelas fendas da porta de carvalho."

O queixo do escrivão agora tremia também. Ele tinha tempo para mais um parágrafo, um que sabia que aconteceria, portanto, adiantaria sua escrita. Mergulhando a pena no nanquim, escreveu, com a letra garranchada e manchada:

"O deus sombrio é rápido, forte e impiedoso. Vejo sua sombra da morte passar pela porta enfeitiçada onde estou. Nesta sala, estamos eu e ele.

O artefato sussurra um nome: Aengus, Aengus, repetidas vezes.

Não há escapatória.

Ele arrombou a porta.

Sorriu para mim.

Ele o levou."

Sorrindo para o escrivão, Aengus entrou. Suas botas estavam sujas de sangue e criavam pegadas no piso de pedra cinzenta. Ele se voltou para o escrivão diante do artefato.

O escrivão ergueu seu cajado, mas a magia do deus sombrio o fez soltar imediatamente. Estando a vida do escrivão acabada, a última barreira para o artefato também estaria.

Aengus jogou o macho no chão e se abaixou diante dele, a cabeça virando para o lado, com uma observação letal.

Aquele era o deus sombrio. Ele não poupava ninguém.

O escrivão arfava conforme ele chegava perto e encostava os lábios em sua testa.

Era um beijo de morte.

Um segundo depois, o escrivão caiu. Em seu peito, não mais um coração batia, o que fez a torre tremer.

A barreira de energia ao redor do Artefato se rompeu.

O deus sombrio se levantou, assobiando como se estivesse em um passeio tranquilo em uma campina banhada de sol. As mãos da besta terrestre — as mesmas do deus sombrio — se ergueram, por mais que ele tentasse lutar para ter o controle do corpo de volta.

Era inútil.

Inevitável.

Era o destino.

Levantando mais, o deus sombrio sorriu e suas mãos tocaram o Artefato.

Poder. Os dois eram poder.

Aengus se aprumou e fechou os dedos ao redor da borda do Caldeirão.

***


Último bônus do ano. Agora é oficial, até dia 07/01/2021, corações de fogo! 

Corte de Fogo e GeloOnde histórias criam vida. Descubra agora