101. Capítulo 33 - Caleidoscópio - 3ª parte

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Capítulo 33 – Caleidoscópio – 3ª parte


Echo


— Sobreviver é tão fácil agora que não estou sozinha, nem com invasores. É quase entediante. — Eu me ajoelhei na frente dela, esperando que ela me olhasse nos olhos e visse que eu estava a me expor. — Eu não me importo com o acampamento, ou com essa base, ou com uma maldita cura. — Eu não diria a ela que a amava quando ela perguntasse. Para ser honesta, eu nem tinha certeza de que sabia mais o que era o amor – isso nunca foi o que eu tinha em mente. Eu nem tinha certeza se o amor que eu tinha para dar valia a pena, se isso teria algum significado para ela vindo de uma assassina. Essa foi a melhor resposta que tive. — Eu gostaria de ter outro propósito, outra motivação, Genevieve, mas você é tudo o que eu tenho.

— Pare — murmurou ela em seus braços. — Eu não me importo.

— Talvez não — eu consenti. — Mas você sabe o que é viver para outra pessoa. Eu vejo você fazer isso todos os dias, porque você se preocupa com o acampamento, essa base e uma cura. — Antes de continuar, alcancei seus braços para colocar uma mão sob seu queixo, forçando-a para cima no intuito de fazê-la olhar para mim, para fazê-la ver a sinceridade em meu rosto. — Você pode brincar com minhas emoções, pode ficar furiosa e até ser maldosa, mas não desacredite nas coisas que eu sacrificaria por você. — Eu não tinha a intenção de me emocionar, mas agora, especialmente porque parecia que eu tinha chegado até ela, eu não conseguia evitar de fungar. — Você não precisa me dizer o que vale para você, no entanto, o sacrifício é a única coisa valiosa que me resta dar. Por favor, não aja como se não valesse nada.

— Echo — sussurrou Genevieve. Ela apertou os olhos com força enquanto respirava fundo, e depois se recusou a abri-los novamente. Como se ela não pudesse dizer o que queria se estivesse olhando para mim. — Não importa o quanto eu possa odiar você, vale alguma coisa.

— Tenente! — chamou uma voz grave de algum lugar no escuro, procurando, mas sem medo.

Parecia Lee, e normalmente Genevieve teria me afastado para longe, com pavor de ser vista tão de perto, mesmo que eu estivesse apenas de joelhos na frente dela. Dessa vez, ela soltou uma longa respiração e esfregou os dedos nos vincos sulcados de sua testa. Quase quis perguntar se ela estava bem.

Ficou claro o quanto ela estava estressada com essa missão desde o início. E com a forma como ela vinha a me tratar a oscilar mais do que o normal, talvez ela estivesse perdendo a cabeça. Já se irritando por estar sob pressão.

— Você está realmente confusa — eu disse a ela em vez disso, não querendo pressioná-la longe demais e mudar o fato de que ela estava sendo sincera novamente.

— Tenente? — Dessa vez, soou como Hunt.

Genevieve me deu o menor dos sorrisos conciliatórios. — Quem me dera não ter que ser. — Em seguida, ela chamou na direção dos soldados: — Estou aqui.

Ela se levantou, retirou a lanterna de um bolso de seu traje antimotim e a acendeu na direção das vozes para que pudessem nos localizar. Eu me endireitei também, e alguns segundos depois que o aperto de botas na neve se tornou audível, Hunt e Lee apareceram no feixe de luz de Genevieve.

— Harvey disse que terminou — Lee informou a ela.

Isso colocou um sorriso no rosto dela. Estávamos um passo mais perto de trazer os civis para cá. — Perfeito. — Em um aceno, peguei minha mochila e segui Genevieve até o caminhão com Hunt e Lee. No momento em que viu Harvey, questionou: — Está funcionando?

— Ainda não — respondeu ele, arremessando o que restou do fio elétrico na caçamba do caminhão. — Quando o sol nascer amanhã e atingir os painéis solares, ele deve entrar em funcionamento.

— E as baterias vão armazenar energia? — Em resposta ao seu aceno, ela lhe deu um tapinha grato nas costas. — Tudo bem, vamos arrumar as malas.

Depois de reunir os suprimentos restantes e de carregá-los de volta no caminhão, Genevieve e eu entramos na cabine. Ela seguiu uma trilha de terra até a estrada e, em seguida, a estrada para o portão, onde Blake e Jarvis saíram para abri-lo. A entrada principal não podia ser eletrificada, por isso, depois que o Esquadrão Bravo terminou de consertar os pontos quebrados da cerca, Genevieve os mandou revestir o portão com arame farpado. Ainda não havia muito mais em que eu pudesse pensar para tornar nossas defesas muito melhor.

Enquanto Blake e Jarvis abriam o portão, meus olhos se voltaram para o prédio mais próximo, do qual nós estávamos a dormir no telhado ao amanhecer. Eu só olhava para poder examinar o prédio ao lado, curiosa para saber de que tipo ele era agora que começamos a limpá-los. No entanto, não foi o edifício adjacente que chamou minha atenção. Tratava-se de algo entre os dois. Na escuridão, era muito difícil distinguir algo revelador – homem, mulher; selvagem, não infectado. Não havia como eu saber. Quase como um espectro ainda negro, ele estava ali parado, a olhar por trás da esquina do nosso prédio. Inclinei-me para a frente no veículo, apertando os olhos para tentar enxergar melhor pelo para-brisa, mas não adiantou.

— Qual é o problema? — Perguntou Genevieve, fazendo a caminhonete avançar pelo portão aberto.

O questionamento desviou minha atenção e olhei para ela. Não podia ser um Feral, ou então não estaria parado ali. Porém, o Segundo Pelotão havia feito um reconhecimento sem encontrar nenhum sinal de sobreviventes ou de invasores.

Além disso, o Esquadrão Bravo devia estar quase a terminar de trancar todos os prédios da base. Eles haviam feito isso na última noite e meia. Não havia nenhum lugar de onde um não infectado pudesse ter vindo.

Quando meu olhar se voltou para o para-brisa, procurando a figura que eu havia visto, ela havia desaparecido. Meus olhos deviam estar a me pregar peças, dobrando as sombras para se divertir.

Eu balancei a cabeça em negação. Genevieve provavelmente levaria isso mais a sério do que eu, mesmo que eu estivesse errada, e a última coisa que eu queria era aumentar o estresse dela. — Nada.

Genevieve puxou a caminhonete até o meio-fio do lado de fora do nosso prédio e, enquanto nós saíamos da cabine, o restante dos soldados saltou da caçamba. Não faltava muito para o amanhecer, então, em vez de nós continuarmos para procurar o Esquadrão Bravo, subimos até o telhado para aguardar o retorno deles.

Amanhã à noite nós começaríamos a limpar Fort Mayor de Ferais, e eu fui até a beirada do telhado para observar a extensão da base.

Entretanto, ao chegar lá, eu o enxerguei novamente, desaparecendo na esquina de outro prédio. Dessa vez, vi apenas um vislumbre fugaz de um pé correndo. Ou foi o que pensei que fosse. Poderia muito bem ter sido um pequeno animal, entretanto, no fundo da minha mente, eu estava ficando cética.



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Continua...

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Caronte Atraca À Luz Do DiaOnde histórias criam vida. Descubra agora