Parte 60

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16 de Setembro de 2014 – Botafogo – Rio de Janeiro, Brasil

Como de costume, Dulce saiu do trabalho pouco depois das seis horas da tarde, e assim que pisou para fora da revista, viu o carro do namorado estacionado ali.

O sorriso surgiu de forma involuntária em seu rosto, e ela apressou os passos até o automóvel.

— Hm, mas está tão pontual esse meu namorado. – abriu a porta ao falar.

— Se é pra te ver, eu nunca me atraso. – piscou. – Entra aí, vida.

— Achei que hoje eu fosse voltar de ônibus. – entrou no carro e lhe deu um selinho.

— Não combinamos nada, mas te imaginar andando de ônibus não foi uma imagem muito legal. – sorriu de lado. – Não gosto de você passando aperto.

— Já falei que eu me viro muito bem, seu teimoso. – apertou a bochecha dele e deixou a bolsa no banco detrás. — Antes de você sair daqui, já te aviso que preciso dormir na minha mãe hoje.

— Porque amanhã você tem assessoria do TCC logo cedo. – riu ao falar. – Já decorei a sua agenda, meu amor.

— Você é maravilhoso! – pousou uma das mãos na perna dele.

— Também já sabia disso. – brincou. – Mas mesmo com a assessoria amanhã, acho que hoje valia um jantar pra nós, né? Só pra aproveitarmos um pouco.

— Todo tempo com você é sempre válido. – olhou-o. – Topo o que você quiser.

— É por isso que eu te amo. – riram juntos. – Escuta, Alejandro me ligou hoje a tarde.

— Hey! Eu disse que topo tudo, mas falar dele já é pedir demais pra mim. – ela revirou os olhos.

— Dul... – olhou-a de soslaio. – É sério.

— É que não quero falar sobre isso. – deu de ombros. – Ele já me ligou na hora do almoço, já encheu o saco que eu nem tenho, e eu já disse pra ele que dispenso qualquer contato.

— Amor, o velho quase bateu as botas hoje.

— Ok, sinto muito por ele. – suspirou. – Christopher, você não pode obrigar que eu me importe com ele. Alejandro não pode me obrigar a isso, ninguém pode.

— Eu sei, eu não...

— O amor é um sentimento puro e espontâneo. – cortou-o. – Ele nasce, cresce e se mantém firme por aquelas pessoas que sabem semeá-lo dia a dia. Não existe essa reciprocidade com o meu pai. Eu não desejo mal algum a ele, de coração mesmo, mas eu também não me importo com ele, ele não ocupa grau algum de importância na minha vida. Foi indiferente durante tantos anos, não é agora que vai mudar. – explicou-se. – É isso que eu gostaria que você entendesse, que Alejandro entendesse, que todos entendessem, na verdade.

— Eu entendo, meu amor. – sincero. – Eu entendo, e de verdade, não acho que você esteja errada, ok? Eu te apoio.

— Ótimo. – encerrou o assunto. – Obrigada.

— Mas ao mesmo tempo... – ela suspirou. – Dul, só me escuta, ok? Me escuta essa vez, e se você achar que não tem sentido, eu prometo que não me meto mais.

— Jura? – olhou-o séria. – Jura que não vai mais se meter? E não vamos ter que voltar a esse assunto?

— Juro. – levantou uma das mãos. – Embora tudo o que eu fale seja apenas para o seu bem e pensando no que é melhor pra você, mas tudo bem.

— Fale. – concordou.

— Seus sentimentos estão completamente corretos em relação ao seu pai, não acho errado que você sinta essa indiferença, não acho errado que não se sinta confortável perto dele ou se vendo obrigada a ter qualquer tipo de convivência. – ela assentiu. – Mas penso em tudo o que ele te fez, penso em como ele foi errado e injusto por te deixar ir embora, por fechar os olhos diante de um problema sério e que ele poderia ter resolvido antes... Eu penso que ele errou ao negar amor à você, mas você não comete o mesmo erro ao negar isso pra ele agora? – ela cruzou os braços. – Eu sei que são situações que não se comparam, eu sei que o que ele fez pra você é imperdoável. Tudo bem. Mas você é muito melhor que ele, melhor que todos eles, você tem uma força e um entendimento sobre a vida que, honestamente, poucas pessoas no mundo têm da mesma forma. – sincero. – Ele vai morrer com o peso na consciência, ele vai morrer com a culpa de ter aberto mão da única filha que tinha. Não há tempo no mundo capaz de apagar isso. – ela desviou o olhar. – Pelo o que eu te conheço, acho que se sentirá mal em carregar uma culpa assim também. Vai aguentar saber, de repente, que ele morreu sem o seu perdão? Que morreu depois de você ter negado ajuda? Sei que você não é médica, que acha que sua presença não faz diferença, mas ele conta com a sua ajuda psicológica, ele... ele considera a sua presença mais importante do que qualquer remédio ou cirurgia. É o que eu acho.

Leblon após às 22hOnde histórias criam vida. Descubra agora