Capítulo duzentos e quatro.

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Second season:two hundred and fourteen
As vezes, é bom extravasar ★

— Sabe o que eu vi no dia em que briguei com a Carolina? — Thaiga começou, a voz carregada de frustração. — Eu vi a minha família. As pessoas que deveriam estar ao meu lado, me julgando e jogando toda a culpa em mim.

— Thaiga… — Comecei a falar, mas ela me interrompeu, o desabafo vindo à tona.

— Eu posso ter todos os defeitos do mundo, mas não tive culpa da minha mãe ficar doente. Não tive culpa dela morrer. Nem tive culpa do meu pai ter ido embora. E claro que tudo isso afetou meu comportamento, mas o que eles esperavam?

Ela passou a mão no rosto, claramente arrependida por ter explodido.

— Tudo bem, relaxa. Não estou aqui para te julgar. — Ofereci um sorriso de compreensão, tentando aliviar a tensão.

— Desculpa. Não deveria ter surtado, isso é coisa minha. — Ela balançou a cabeça, tentando se recompor.

— Às vezes, é bom extravasar. — Minha voz saiu calma, tentando lhe passar alguma paz. — Mas saiba que você não é a única com problemas de família.

Thaiga olhou para mim, surpresa. Eu hesitei. Não era o tipo de pessoa que se abria com facilidade. Na verdade, eu era conhecido por ser mais fechado, um tanto tímido quando o assunto era falar sobre mim mesmo. Preferia evitar as emoções, guardá-las onde ninguém pudesse alcançá-las. As pessoas costumavam dizer que eu era reprimido, e talvez estivessem certas.

Respirei fundo e decidi continuar.

— Sabe por que eu sou tão bom em pilotar, lidar com carros e fugas? — Comecei, a voz um pouco mais baixa, como se parte de mim ainda resistisse a compartilhar aquilo. — Meu pai sempre foi extremamente autoritário. Ele não deixava que eu tivesse opinião sobre nada. Tudo tinha que ser do jeito dele. Eu não escolhia minhas amizades, meus gostos, nem minha própria personalidade. Eu era praticamente uma extensão do meu pai, uma marionete que fazia o que ele mandava.

Thaiga ficou em silêncio, absorvendo o que eu dizia.

— Sinto muito, GS... — Ela murmurou, visivelmente tocada.

— Uma vez, eu não aguentei mais e surtei. Saí de casa, sem destino, sem pensar nas consequências. No meio do caminho, encontrei um racha. Eu estava tão fora de mim que acabei participando. Era a minha primeira experiência com corridas de carros, e depois daquele dia, continuei voltando todas as noites.

— Era o jeito que você encontrava pra aliviar tudo? — Ela perguntou, com um tom de compreensão.

— Sim, era o meu escape. O único momento em que eu me sentia no controle, livre das expectativas do meu pai. Mas no fundo, eu odiava fazer algo errado. E rachas são ilegais. Aquilo começou a pesar em mim.

Suspirei, lembrando dos momentos em que as corridas eram o único alívio, mas ao mesmo tempo, o peso moral que carregava era grande demais para que eu pudesse ignorar. Continuar com aquilo significava me afastar ainda mais do que eu queria ser.

— Acabei me tornando o rebelde da família. Briguei feio com o meu pai e ignorei todas as tentativas dele de me manter sob o controle. Foi quando decidi entrar na faculdade de Justiça Criminal. Esse foi o meu jeito de mostrar que podia fazer as coisas do meu jeito, sem seguir o caminho que ele planejou para mim. E foi assim que acabei no FBI.

Era estranho, mas ao contar isso em voz alta, me senti mais leve. Thaiga me observava, seus olhos revelando que ela entendia o que eu havia passado. Era como se, por um breve momento, nossos traumas se entrelaçassem.

Desliguei o carro ao chegar no prédio do FBI, mas o peso nas minhas costas parecia menor do que antes.

— Bom, então acho que somos dois problemáticos. — Thaiga riu de leve, me lançando um sorriso que carregava empatia.

Sorri de volta. Talvez ela estivesse certa.

case thirty nine:season twoOnde histórias criam vida. Descubra agora