case thirty nine:season two

Capítulo trezentos e um.

Second season:three hundred and one.
★ Tô na mesma ★
{Tacoma, Washington}
<Victor Jones narrando>

Já passava da meia-noite, e a sala estava envolta em uma calma estranha. Eu estava jogado no chão, sem ânimo para subir no sofá, assistindo a algum programa de televisão que não me interessava. Era apenas o barulho de fundo que mantinha a solidão à distância. Lara chegou em casa, tropeçando nos próprios pés, e jogou os saltos altos longe, sem se importar onde caíam. Ela praticamente se desmanchou no sofá, resmungando algo ininteligível enquanto se encolhia.

— Dia difícil? — perguntei, sem tirar os olhos da televisão, mas inclinando a cabeça no acolchoado do sofá para vê-la melhor.

— Você não faz ideia... — ela respondeu, virando-se para se deitar sobre o braço do sofá, o olhar perdido no teto.

— Onde você estava? — perguntei, tirando o gorro branco que usava.

— Assistindo modelos desfilarem pela Dior... — respondeu num tom meio amargo, ainda olhando para o teto.

— Parece divertido. — Ironizei, tentando entender o tom. — Eram bonitas pelo menos?

— Lindas — respondeu sem hesitar, e eu ri. — E você? Como foi o seu dia?

— Estressante.

— Tô na mesma. — Ela suspirou. — E o que você tá assistindo?

— Não sei, só está passando. — Deixei escapar um riso baixo, mas logo voltei ao assunto. — Mas aí... o que aconteceu de tão ruim?

Ela ficou em silêncio por um momento antes de falar.

— Não foi ruim... foi ótimo. Esse é o problema.

Franzi a testa, intrigado.

— Seja mais específica — insisti, pegando meu celular.

Ela se mexeu no sofá, jogando as pernas para o encosto, ficando de cabeça para baixo enquanto me encarava de maneira quase infantil.

— Lembra da Tainá, aquela amiga de quem eu te falei?

— Lembro. — Balancei a cabeça, me sentando mais direito, agora curioso.

— Então... — Ela hesitou. — Eu e a Tai nos beijamos. — Suas palavras saíram num tom entre arrependido e confuso.

Arregalei os olhos por um segundo, pego de surpresa, mas tentei manter a calma.

— A Tainá tá em Tacoma? Vocês foram pro desfile da Dior juntas? — Perguntei, desconfiado, algo no tom dela parecia... estranho.

— Claro que não! — Ela se mexeu no sofá, nervosa. — A Tainá tá em Tacoma, mas a gente viu o desfile na televisão... na casa dela. — Explicou com a voz fina demais, claramente forçando uma desculpa. Eu conhecia Lara desde que ela nasceu; não havia mentira que ela pudesse esconder de mim.

Franzi o cenho. Algo estava errado. Por que ela mentiria sobre algo tão simples como ir a um desfile? A não ser que tivesse algo mais envolvido com essa história. Minha mente começou a divagar, mas sacudi a cabeça, afastando os pensamentos. Talvez eu estivesse delirando de sono. Pelo menos era o que eu esperava.

— Tá... e qual o problema? Vocês se beijaram, então deixa rolar. — Falei, tentando minimizar a situação.

— O problema é que... — Ela fez uma pausa, claramente frustrada. — Depois que ela me beijou, ela disse "desculpa" e saiu! E agora tá me ignorando, não responde minhas mensagens, nada. — Ela cobriu o rosto com as mãos, o desespero escorrendo na voz.

Eu não pude deixar de rir, achando graça na ironia da situação.

— Oh, que fofo... a Ariel tá de coração partido! — provoquei, referindo-me ao codinome dela, e ganhei uma almofadada bem no meio do peito.

— Qual é a sua moral, Victor? — Ela rebateu, zombeteira. — Você disse que tinha desistido da Babi, mas tá aí sofrendo pelos cantos. — Ela arqueou uma sobrancelha, me desafiando.

Soltei um suspiro pesado. Não era o tipo de coisa que eu queria falar naquele momento, mas já que o assunto estava na mesa...

— A gente se beijou hoje. — Confessei, e, para minha surpresa, Lara começou a rir alto.

— Ah é? E aí? — perguntou, um sorriso malicioso surgindo em seu rosto. — Como foi?

— Não foi muito longe... — admiti, emburrado. — Milena e Carolina entraram bem na hora, estragando tudo. Antes que eu pudesse falar qualquer coisa, a Babi saiu da sala sem nem olhar para trás. Aí, claro, um tiroteio aconteceu logo depois, e agora ela tá me evitando. — Dei de ombros, sem conseguir disfarçar minha frustração.

— Oh, que coisa fofa... o nerd tá de coração partido também! — zombou, imitando o tom que eu tinha usado mais cedo, fazendo uma careta exagerada.

Eu revirei os olhos, mas no fundo sabia que ela estava certa.

— É diferente, Lara — murmurei, olhando para o teto. — Eu sempre soube que as coisas com a Babi não seriam fáceis. Ela é complicada, cheia de paredes ao redor dela. Só não achei que... — fiz uma pausa, tentando encontrar as palavras certas — ... que eu seria sempre o idiota que ela deixa para trás.

Lara ficou em silêncio por um instante, talvez refletindo sobre o que eu tinha dito.

— Não acho que você seja o idiota que ela deixa pra trás. Ela só leva mais tempo pra perceber as coisas. — Ela disse e eu dei de ombros sem esperanças. — Eu entendo — respondeu finalmente, sua voz mais suave agora. — Tainá também me confunde. Um minuto parece que ela quer algo comigo e no outro, ela age como se eu fosse só amiga dela mesmo.

— É irritante pessoas confusas — acrescentei, e ela assentiu.

— Sim, muito.

Ficamos em silêncio novamente, ambos presos em nossos próprios pensamentos, refletindo sobre as pessoas que nos confundiam e nos quebravam um pouco a cada dia.

— Eu só queria que... — comecei, sem saber como terminar a frase.

— ... tudo fosse mais simples? — Lara completou, como se lesse minha mente.

Assenti, fechando os olhos por um momento. A gente era mesmo irmãos de sangue.

— Às vezes, eu me pergunto se vale a pena — ela murmurou, sua voz quase um sussurro. — Se ficar aqui, com tudo isso... com a máfia, com a Tainá... se algum dia vai compensar.

Eu sabia que ela não estava falando só da Tainá. Ela falava de tudo — das escolhas, das mentiras, dos sacrifícios.

— Só você pode responder isso, Lara — disse, finalmente. — Mas eu acho que algumas pessoas valem o risco... mesmo que a gente se machuque no processo.

Lara olhou para mim, seus olhos cansados, mas talvez com uma centelha de esperança.

— Talvez você tenha razão — sussurrou. — Talvez...