Capítulo 50, parte IV

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— Me senti mal hoje. – ele disse, fazendo-a abrir rapidamente os olhos. – Me senti mal durante todo o tempo na casa do Christian. – ela não moveu-se. – Acho que só ali eu entendi o quanto eu não queria estar ali.

— Uhum. – ela sussurrou, deslizando a ponta do dedo pelo peito dele.

— Você estava certa, eu queria qualquer motivo para não ter que falar sobre a decisão que ele tomou antes. – confessou. – E esperava conversar com ele, mas o fato de ter que fazer isso logo que cheguei me deixou... me senti sem paciência. Passei todo o tempo cuidando das minhas palavras para que não me descontrolasse e o magoasse. – arfou. – Porque eu estava magoado... eu ainda estou. Quero seguir em frente, mas ainda estou. – apertou levemente a mão no braço dela. – Não foi só por ele me afastar e não me ouvir, mas por se recusar a estar presente para mim. Eu estava sem você, eu só o tinha, e ele... ele escolheu não estar para mim. – pigarreou para controlar-se. – Olho para aquela foto e para o cara que eu tinha na minha frente hoje, e tenho dificuldade para entender que se trata da mesma pessoa. Não consegui dizer que o amava. Em nenhuma das vezes em que ele me disse, eu não consegui dizer de volta. – exalou pesadamente. – E te juro que não quero ser assim, eu não... eu não sou assim. Mas sinto que não consigo controlar essa sensação que tenho e que me deixa tão pé atrás. Eu perdoo, mas não sei porque eu não... eu não consigo confiar.

Dulce ficou em silêncio, apenas beijou suavemente a pele dele e manteve-se quieta, deslizando a mão na mesma velocidade e região, esperava um sinal dele para saber o que fazer.

— Amo como você me respeita. – a voz dele tornou-se leve outra vez. – Sabe quando falar, quando calar... sabe ouvir. Você me escuta e me vê, mesmo quando a minha versão não é das melhores. – beijou o alto da cabeça dela. – Nunca preciso ter máscaras com você.

Dulce beijou novamente a pele dele, apoiou o antebraço no colchão e mirou o homem nos olhos, vendo-o com o sorriso acolhedor e a mirada apaixonada. Aproximou os rostos e lhe deu um demorado selinho.

— Você estava realmente sozinho quando toda a situação do Christian veio à tona e ele tomou as decisões que tomou. – mirou-o. – Mesmo depois, você nunca se aprofundou sobre isso comigo, e não acho que o tenha feito com ninguém. – ele negou. – Hoje foi a primeira vez que você se permitiu dizer algo em voz alta. E é por isso que soou tão diferente e teve tanto impacto dentro de ti, porque agora você está elaborando. – contraiu os lábios. – Minha psicóloga diz que cada vez que contamos uma situação, nós a elaboramos. E é daí que vem a cura, dessa elaboração.

— Você tem feito isso? – perguntou baixo. – Tem elaborado certas questões?

— No início, contei e recontei a história com o Dan, de como eu o enterrei e enterrei o nosso bebê. – disse sem receios. – Depois, contei a nossa história, e para cada uma das vezes, eu encontrei uma justificativa diferente para as suas ações. Até aceitar que não dava para fingir que não dávamos certo. – deu um leve sorriso. – E que eu errei contigo e precisava ser responsável não pela perda do nosso filho, mas pelas decisões que tomei diante disso.

— Nós tomamos muitas decisões, naquela ocasião. – deslizou uma das mãos entre os fios lisos e castanhos dela. – E algumas foram tremendamente equivocadas, mas acredito que aprendemos disso. Eu acredito que você me perdoou.

— Por inteiro! – frisou.

— E eu te perdoei! – firme. – E não me lembro do que passou, apenas... ficou para trás.

— Haverá um momento, quando for a hora certa, que o seu sentimento pelo Christian será assim de novo. Leve. – passou a língua pelo lábio inferior. – E se, por acaso, esse momento nunca chegar, tudo bem. Não se force. A vida tem o seu próprio curso, pessoas não devem ser forçadas.

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