Capítulo 30, parte III

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— Você está receosa. – concluiu.

— Muito. – assumiu. – E o triste é que nunca pensei que pudesse me sentir assim com o Christopher.

— Dulce...

— É como se não nos reconhecêssemos. – sopesou as palavras. – Sobra amor, sobra carinho, mas falta...

— Vontade? – franziu levemente o cenho.

— Coragem, talvez. – mordeu o lábio inferior. – Acho que tudo se resume a coragem, porque o demais sobra de ambos os lados.

— Eu entendo. – disse baixo.

— E tanta covardia, pouco a pouco, vai ganhando espaço demais e engolindo todo o resto. É assim que a gente se desconecta. – os olhos marejaram, mas ela rapidamente passou a ponta do dedo pelo canto dos olhos.

— Sinto muito que as coisas estejam assim. – fez menção de tocá-la, mas logo recuou. – Eu acredito, de verdade, que entre vocês existe volta, e acredito que não demorará muito.

— E o que é isso? Previsão do futuro? – brincou e cortou o pancake.

— Talvez, mas honestamente... – deu de ombros. – Conheço bem o irmão que tenho. E por outro lado, as lágrimas nos seus olhos me dizem que ele não ama sozinho.

— Acho que gostava mais quando era eu a te aconselhar! – sorriu de lado e negou levemente com a cabeça. – Obrigada por emprestar o seu ombro hoje. Nem eu sabia que precisava tanto.

— Perdi muita coisa por não falar, Dul...ce. – corrigiu-se rapidamente.

— Dul. – ela sorriu. – Pode ser Dul.

— Dul. – ele assentiu. – Abri concessões sobre muitos assuntos para muitas pessoas, porque sentia que se eu aceitasse o que todos queriam, tudo ao redor fluiria melhor. Só que isso de agradar todo mundo é uma tremenda furada. Nem todos saem felizes, e a gente é quem mais perde.

— Nos perdemos de nós mesmos. – complementou, dando um gole no café. – Eu já fiz esse caminho, já vivi intensamente esse erro.

— Diz pelo Christopher?

— Pelo Dante. – deu de ombros. – E não valeu de nada. – fechou a expressão. – Continua não valendo de nada. – desviou os olhos. – Enfim...

— As loucuras que fazemos por amor! – Alfonso esforçou-se para descontrair o clima, e ela deu um murcho sorriso. – Em dado momento, achei que a Anahí fosse a mulher da minha vida, e cheguei a cogitar abrir mão de tudo por ela.

— Você me disse isso. – lembrou-se. – Da vez em que conversamos em Nuevo León. Te perguntei o que você faria por ela.

— Depois da nossa conversa, eu me dispus a fazer muito. Pensei que não queria ser o covarde de sempre, queria que ela pudesse dizer que eu lutei por ela da mesma forma que você dizia que o Christopher havia lutado por ti. – sorriu com ela. – Você tinha orgulho daquilo! Da atitude dele!

— E continuo sentindo muito orgulho dele! – frisou. – Não creio que eu possa frear isso jamais.

— Eu queria essa reação nela. – passou a mão pelo rosto e manteve-se em silêncio, sopesava as palavras em sua mente.

Dulce buscou respeitá-lo, apenas bebericou o café e voltou a comer, esperando até que ele tivesse coragem para desafogar o que afligia tanto seu coração.

— Você esteve na família tempo suficiente para perceber algumas coisas. Com o pai que tenho, na profissão que ele escolheu e no futuro que desejou tanto para mim quanto para o Christopher, pode imaginar que já vi e vivi muita coisa. E me descobri forte o suficiente para perdoar muitas delas, Dul. – a garganta arranhou. – Aprendi a perdoar traições, aprendi a perdoar discussões, atitudes precipitadas, erros, gestos excedentes. Relevo muita coisa, dificilmente perco a linha. – deslizou o dedo pelo garfo. – De tudo o que já vivi, o que mais me doeu, em todos os momentos, foi aprender a perdoar mentiras. Eu perdoo, eu tenho que perdoar, mas me dói.

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