Assim que Wilian foi para a sua casa, as aulas de Aisha e de Loren retornaram, ainda na primeira quinzena do mês de janeiro. Ao ver que a mãe estava muito furiosa, Loren percebeu que não era bom continuar tendo aquela conduta, pois ela sabia que Evelyn quando queria ser punitiva conseguia isso com maestria.
Então, em um dos dias de conversa com Aisha em seu quarto durante a noite, enquanto estava a ver clipes da banda de Tommy, Loren questionou a irmã de forma curiosa:
- Você era mesmo muito apaixonada por Caivan?
- Sim, eu fiquei muito apaixonada por ele. Eu confesso que era muito nova e que nem sabia o que era isso na época. Nós não conversávamos sobre isso no meu país. O meu pai era fechado e se eu falasse com ele que estava a conversar com Caivan eu nem imagino o que poderia acontecer. Portanto, era um sentimento novo pra mim. Mas, eu fiquei muito apaixonada por ele. Eu queria estar ao lado dele a todo o momento. Ficava pensando nele o tempo todo enquanto estava em casa. Era como se eu torcesse o tempo inteiro para que o dia terminasse logo, com o intuito de que pudesse encontrá-lo na escola no outro dia. Afirma Aisha demonstrando uma certa saudade daquele período.
- É muito do que eu sinto por Tommy. Mas, até hoje não consegui nem chegar perto dele. Eu odeio ser tímida. Como você conseguiu conversar com Caivan pela primeira vez?
- Estávamos na escola e ficávamos em alas separadas. Os homens não podem encontrar com nós mulheres naquele colégio. Se fossemos vistos juntos seríamos duramente castigados pelos professores. Ele não gostava de ficar muito perto dos amigos e ia para uma parte da escola em que o muro estava danificado e que dava espaço para a ala das meninas. Todos os dias eu olhava para aquele belo menino, que sempre me chamava a atenção e um dia criei coragem, sentei ao lado dele e perguntei o seu nome. Afirma Aisha surpresa, ao refletir sobre a coragem que teve naquela ocasião.
- Jura que você teve mesmo coragem de fazer isso? Não ficou com medo na hora?
- Sinceramente, hoje nem eu consigo acreditar muito que tive aquela coragem. Se alguma professora me visse a conversar com ele, eu nem sei o que seria de mim. Mas, naquele momento eu tive uma coragem inacreditável. No primeiro dia que conversamos já surgiu algo tão forte entre nós dois que não tinha mais como ser controlado. Nos dias seguintes, encontramos um lugar ainda mais escondido, em uma espécie de porão da escola, onde podíamos nos encontrar sem sermos vistos por ninguém. E assim o tempo foi passando, todos os dias no intervalo nos encontrávamos.
- Meu Deus! Que coragem! Afirma Loren surpresa.
- Ficamos a nos encontrar por três anos no mesmo lugar. Naqueles instantes que estava ao lado dele parecia que nada mais importava. Eu queria que o tempo congelasse naquele momento e ficássemos ali pelo resto de nossas vidas. Era uma sensação muito boa! Mas, quando concluí o terceiro ano o meu pai me disse que não era mais para ir para a escola e eu senti o maior desespero da minha vida. Era como se ele estivesse literalmente a arrancar o meu coração com as mãos. Afirma Aisha com um semblante triste naquele momento.
- Porque ele fez isso Aisha? Questiona Loren assustada.
- No meu país, especialmente na região que morava, uma mulher quando está próxima de casar não é bem vista a estudar. Na maior parte do Afeganistão durante o regime Talibã, era proibido uma mulher estudar. Como na minha região tinham grupos mais moderados, eles permitiam isso, mas com autorização expressa dos pais, que se tornavam responsáveis pelas ações das filhas.
- E o que você fez quando ele disse que você não iria mais estudar?
- Eu insisti muito para que ele deixasse que eu estudasse pelo menos até a quarta série, mas ele foi irredutível. Aquele dia eu chorei o dia inteiro. Era uma das piores sensações do mundo. Eu comecei a sentir até uma dor no peito intensa, por saber que iria perder o contato com Caivan. No começo da noite o meu pai ordenou que eu parasse de chorar, mas eu não estava conseguindo. Então ele ficou furioso e me deu uma severa surra. Eu prometi a ele que pararia de chorar daquele momento em diante e tive que parar, pois estava com muito medo de ele voltar a me bater. Diz Aisha com um olhar triste.
- Minha nossa! Eu sinto muito! Afirma Loren também com um olhar triste. Quando ela questiona: - E como você conseguiu esquecer Caivan?
- Eu me afastei dele quando ele foi embora, minha irmã. Como eu não o via, aos poucos esse sentimento foi diminuindo. Essa parte eu já te contei. O meu pai me castigou severamente depois que descobriu aquele livro sagrado, durante dois dias. Eu fui a casa de Caivan e disse a ele que ele precisava ir, que o meu pai havia descoberto aquele livro sagrado e ele foi embora. Com o tempo passando, eu fui aos poucos esquecendo dele. Também eu me casei e qualquer pensamento em outro homem seria um pecado, portanto, parei de pensar nele. Afirma Aisha demonstrando tristeza.
- E hoje você pensa nele?
- Eu não posso pensar em Caivan. Eu sou casada! Se fizer isso estou cometendo um pecado terrível! Afirma Aisha assustada.
- Aisha, é impossível controlar sentimentos e pensamentos!
- É possível e necessário. A minha religião não permite que eu pense em outro homem que não seja o meu esposo. Afirma Aisha de forma incisiva.
- Tudo bem. Eu entendo. Talvez você me contou a estratégia para que eu possa voltar a minha vida normal. Eu tenho que parar de ver Tommy, pelo menos até ser aprovada nesse ano. Se eu não parar de pensar nele, eu não vou conseguir ser aprovada com boas notas. A mamãe está na minha cola. Ela está furiosa comigo. Está me deixando de castigo e não posso fazer mais nada. Estou sem mesada por quatro meses e ela disse que só vai voltar com a mesada se eu apresentar boas notas para ela no próximo trimestre. Eu preciso dar um jeito nisso senão minha mãe vai acabar com a minha vida. Afirma Loren de forma reflexiva.
- Precisa mesmo viu. A sua mãe está brava e quando ela fica assim você sabe que não é nada bom pra você. E olha que no seu caso nem dá pra falsificar a assinatura como fazia Toddy. Diz Aisha com um semblante descontraído.
- Que pena que não estamos mais naquela época né. Afirma Loren a sorrir de forma também descontraída, quando complementa a sua fala dizendo: - Ainda bem que, pelo menos aqui não é igual no seu país!
- Ainda bem mesmo viu mocinha. Se fosse com o meu pai você iria ver o resultado de se tirar notas ruins na escola! Diz Aisha com um semblante descontraído ao relembrar do seu passado, que já não a afetava tanto e parecia haver se tornado apenas lembranças distantes o qual ela já conseguia dizer de forma descontraída sobre aquelas ocorrências tristes.
- Deus me livre! Diz Loren a sorrir, quando fica a pensar na sua situação, se preparando para dormir.
Ao saber um pouco mais da história da irmã e ver como ela conseguiu esquecer um pouco do seu amor, Loren começou a ficar mais distante de Tommy. Evitava vê-lo pelo computador e na escola. Preferia não sair mais para os intervalos, ficando a estudar em sua sala e aos poucos ela foi retornando a uma rotina de estudos com Aisha em casa, algo que as ajudava muito.
No primeiro trimestre daquele ano as suas notas melhoraram significativamente e Evelyn concedeu para ela novamente as suas mesadas e uma maior liberdade para visitar as amigas quando desejasse, bem como retirou as outras restrições que havia colocado devido as suas notas baixas do trimestre anterior.
Em julho termina então aquele ano letivo para Loren e ela é aprovada com boas notas. Aisha também consegue o seu grande objetivo e é aprovada na terceira série do Ensino Médio naquele estudo supletivo, com ótimas notas. No mês de setembro ela finalmente poderia iniciar os estudos regulares do último ano do Ensino Médio na mesma escola que a irmã. Aquele certamente seria um ano muito legal para as duas e a expectativa de ambas era enorme para a chegada do mês de setembro.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Casamento forçado e abusivo II
General FictionApós passar por muitos percalços em sua história, Aisha consegue finalmente se livrar do seu casamento e tenta construir uma nova vida. Entretanto, os fantasmas do passado a assombram constantemente e ela tem dificuldades de superar os seus diversos...