No dia seguinte, no sábado, dia 14 de dezembro de 2013, Saleh pegou um ônibus e foi para Oxford bem cedo. Ao chegar na cidade, ele fez as mesmas ações que estava habituado. Passou em uma floricultura e comprou belas rosas. Ele sabia que Aisha adorava flores.
Ao chegar em frente ao prédio, ele pediu para que o porteiro avisasse no apartamento de sua amada que ele havia chegado. Logo o porteiro fez uma cara de assustado, algo que não era comum. Então ele chamou no apartamento de Aisha e ela ainda estava a acordar naquele sábado pela manhã. Ela atendeu o interfone e disse:
- Bom dia!
- Bom dia senhora Aisha. O senhor Saleh, está aqui na recepção pedindo para subir.
- Por favor não permita que ele suba! Afirma Aisha assustada.
- Tudo bem senhora. Eu vou passar a informação para ele.
Então o porteiro desligou o interfone, se virou para Saleh e disse:
- A senhora Aisha não deu permissão para que o senhor subisse.
- Como assim não deu permissão? Questionou Saleh demonstrando nervosismo.
- Não deu senhor. Ela não autorizou a sua entrada.
- Aisha não pode ter feito isso. Eu vim de longe para vê-la. Por favor, tente novamente senhor. Eu não saio daqui enquanto não falar com ela.
- Senhor. Ela não quis te atender. Eu não tenho autorização para insistir. As ordens dos moradores, não devem ser desrespeitadas. Infelizmente eu não posso fazer mais nada.
- Tudo bem. Eu vou ficar aqui esperando Aisha o tempo que for necessário. Eu não tenho mais nada pra fazer hoje mesmo. Posso ficar aqui na recepção?
- Sim senhor. Não tem problema o senhor ficar aí. Mas, se Aisha descer, eu peço para que o senhor não a infortune, caso ela não queira falar com o senhor.
- Tudo bem. Ficarei aqui! Diz Saleh ao se sentar em uma das poltronas que ficava na entrada daquele prédio.
Aisha estava inquieta em seu apartamento. Ela não sabia se Saleh havia ido embora ou não. Por volta das 10 horas, duas horas depois de negar a entrada dele, ela ligou então para o porteiro, e questionou, enquanto ele respondia discretamente:
- Ele ainda está aí embaixo.
- Sim senhora. Ele ainda está aqui. Disse que só vai sair quando a senhora o atender.
- Eu não quero atendê-lo. Ficarei aqui no meu apartamento.
- Sim senhora. Será como a senhora deseja.
- Muito obrigada!
Então ela desliga aquela chamada, ficando com o coração partido em seu apartamento, mas, ela sabia que aquilo era o certo a se fazer diante daquela situação de risco eminente para todas as pessoas que foram ameaçadas durante aquele sequestro.
De fora do prédio, um homem observava tudo que acontecia no saguão, discretamente, para depois avisar ao detetive se Saleh teve contato com Aisha ou não naquele dia.
As horas foram passando vagarosamente e Saleh não saia daquele espaço. Assim como havia prometido, parecia estar decidido a ficar o tempo que fosse necessário até poder conversar com ela. Mas, Aisha se mostrava irredutível. Durante a tarde, ela chegou a ligar para o porteiro por mais duas vezes, quando ele afirmou que Saleh não havia saído do saguão. Ela chegou a questionar se ele havia almoçado e o porteiro discretamente a disse que não, que ele não havia comido nada desde que chegou. Essa fala a deixou ainda mais triste, entretanto, ela sabia que estava fazendo o que era necessário para manter todos em segurança.
Saleh ficou sentado naquela poltrona até as 20 horas. Quando, depois de muito insistir para o porteiro que trocou de turno, ele entrou em contato novamente com Aisha e ela aceitou falar com ele pelo interfone, imaginando que seria impossível que aquela conversa fosse grampeada:
- Saleh, por favor, vá embora. Eu não quero mais me relacionar com você.
- Aisha, eu não vou embora daqui antes de falar com você. Eu quero que você diga isso na minha frente.
- Eu não vou fazer isso Saleh. Eu não vou descer do meu apartamento e você não terá autorização para entrar.
- Porque está fazendo isso comigo Aisha? O que eu te fiz para me tratar dessa forma?
- Você não fez nada Saleh. Apenas resolvi mudar os caminhos de minha vida e trabalhar para ter uma vida mais tranquila, de acordo com os nossos preceitos religiosos e culturais. E esses preceitos, impedem que possamos ficar juntos sem a benção de seus pais.
- Aisha, não faça isso comigo. Eu larguei tudo por você. Larguei a minha família. Os meus bens. O meu país. Não me deixe aqui sozinho. Afirmou Saleh chorando ao interfone na frente daquele porteiro, na língua do Afeganistão para que aquele profissional não entendesse o contexto daquela ligação.
- Essa foi a minha decisão Saleh. Será o melhor para nós todos. Conforme-se com isso!
- Eu não vou me conformar Aisha. Não faça isso comigo!
- Por favor Saleh, vá embora. Você está atrapalhando os trabalhos dos porteiros. As pessoas estão achando estranha a sua presença no meu prédio por tanto tempo. Eu estou ficando envergonhada. Por favor siga a sua vida!
- Tem certeza que é isso que quer Aisha? Questionou Saleh chorando ainda mais intensamente.
- Tenho! Respondeu Aisha com o seu coração partido, enquanto lágrimas escorriam dos seus olhos.
- Então tudo bem. Se é isso que você deseja eu não vou insistir mais. Seja feliz!
Então ele passou o interfone para o porteiro e caminhou em direção a saída do prédio. O porteiro então questionou a Aisha:
- Está tudo bem senhora Aisha?
- Sim senhor. Muito obrigada.
- Qualquer coisa ficamos à disposição.
- Agradeço.
Disse Aisha, antes de deligar o interfone e ir para a sua cama, cair nela e começar a chorar compulsivamente, desesperada por ter falado com Saleh daquela forma. Aisha sentia uma dor impressionante por ter sido, quase, que obrigada a ter agido daquela forma. O seu peito parecia que estava a doer de forma incontrolável depois daquele ato. Ela chorou muito durante aquela noite. Mas, no fundo, sabia que estava fazendo o certo, para livrar toda a sua família e o próprio Saleh dos riscos.
Saleh saiu chorando daquele prédio e foi imediatamente para a rodoviária. Ficou naquele terminal aguardando por um tempo a esperar o primeiro ônibus para Londres. Ele estava desolado por saber que havia largado tudo pelo seu amor a Aisha e ela estava a desprezá-lo daquela forma. Diante de toda a revolta que estava a sentir, ele estava decidido, esqueceria Aisha de uma vez por todas e procuraria uma outra mulher para ser sua esposa.
Ainda na rodoviária, depois de muito tempo a refletir, ele fez um lanche reforçado, pois ficou o dia inteiro sem comer e logo em seguida pegou o ônibus para a capital. Durante a viagem ele parou de chorar e ficou a refletir no seu futuro sem Aisha.
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Casamento forçado e abusivo II
General FictionApós passar por muitos percalços em sua história, Aisha consegue finalmente se livrar do seu casamento e tenta construir uma nova vida. Entretanto, os fantasmas do passado a assombram constantemente e ela tem dificuldades de superar os seus diversos...