Casamento forçado e abusivo II

Os preparativos para o casamento

No domingo pela manhã Saleh finalmente chegou a cidade de Cabul, onde foi recebido pelo seu pai, Sarwar, e dois dos seus irmãos, Andric, o mais velho e Pierre, ainda adolescente. Todos estavam muito felizes e o seu pai tirou uma preocupação enorme da sua cabeça quando o viu chegado em sua terra natal conforme havia o prometido.

Estava claro no semblante de Saleh que ele não estava feliz, mas isso para aquela família não importava. O importante para eles era que aquele casamento seria realizado e que a união entre aquelas tradicionais famílias continuaria por mais essa geração.

Naquele dia eles realizaram um almoço farto para toda a família. Além de Saleh, estavam presentes naquela mesa os seus pais, três irmãos, a esposa de Andric e suas três irmãs mais novas, duas delas adolescentes e uma ainda criança. A mãe de Saleh pediu naquele dia que as empregadas fizessem uma comida muito gostosa para recepcionar o seu filho que se casaria no próximo sábado.

Durante aquele almoço as suas irmãs, que eram crianças quando o seu irmão mais velho se casou e nunca presenciaram um casamento de pessoas da família depois que cresceram, estavam muito curiosas para saber como seriam os preparativos para aquele evento. Entre os filhos de Sarwar, apenas Andric era casado.

Após aquele almoço, quando foi para o seu quarto, Saleh mandou uma mensagem de texto para Aisha, através do MSN, informando que foi tudo bem de viagem e ela ficou muito aliviada ao receber essa notícia na Inglaterra. Durante o restante daquele domingo, Saleh ficou a descansar depois daquela longa e cansativa viagem.

Na segunda-feira o seu pai foi pegar parte dos mantimentos que haviam sido comprados para aquela festa de casamento, junto ao pai de Amira, Saleh e Andric. Aquela seria uma festa para um grande número de convidados. Praticamente toda a oligarquia da capital havia sido convidada para o evento.

As lojas mais chiques de roupas da cidade estavam bastante movimentadas por causa desse evento tão esperado. Amira estava irradiante. Ela se preparava em casa e sonhava o tempo todo com aquele ritual e a oportunidade de estar com o seu futuro esposo.

Nos dias seguintes daquela semana, tudo estava sendo organizado por aquelas duas famílias, com o olhar atento de seu pai e seu sogro. Saleh era pura tristeza em seu semblante. Por vários momentos ele chegou a pensar em largar tudo e sair do seu país, abandonando aquele compromisso. Mas, sabendo das consequências que aquele ato poderia trazer, ele, com medo dos seus próprios pensamentos, voltava atrás e preferia imaginar que já havia assumido aquele compromisso e era impossível que ele fosse desfeito.

Na quarta-feira, dia 12 de junho de 2013, quatro dias antes do seu casamento, a casa estava mais vazia, pois o seu pai estava realizando compromissos políticos. Saleh pensou por algum momento que em breve ele poderia assumir parte da jornada de seu pai naquele país, já que havia estudado e tinha melhores condições do que seu irmão mais velho de conseguir avançar na carreira política.

Em meio a esses pensamentos, ele entrou no escritório de seu pai e começou a olhar os quadros que haviam naquele espaço. Ele se aproximou da mesa em que ele trabalhava e começou a apreciar uma caneta tinteiro que ele tinha, extremamente bonita e luxuosa. Nesse instante ele viu uma pasta na mesa e tinha a palavra dossiê escrita na capa. Aquela palavra chamou a sua atenção. Logo ele abriu aquela capa e viu que se tratava de um relatório investigativo sobre uma pessoa.

Assim que leu as primeiras palavras ele se assustou profundamente. Aquele era um dossiê contendo informações sobre a vida de Aisha. Eufórico, ele começa a ler as primeiras informações: sua data de nascimento, quem eram os seus pais, onde nasceu. Era um relatório muito completo e de muitas páginas, contendo muitas informações sobre a mulher que ele havia se apaixonado.

Ele foliou mais um pouco aquelas folhas e o relatório estava dividido por títulos, com informações separadas sobre a vida daquela jovem, como se a sua história estivesse fragmentada por temas. Em meio ao relatório haviam as informações sobre os processos que Aisha havia sido acusada naquele conselho religioso da cidade em que morou com Osnin. Havia também informações sobre a acusação de que ela tivesse atentado contra a sua vida, bem como cópia dos documentos daquele processo. Ele chegou então em um capítulo que continham as informações a respeito de Osnin, quando o seu susto foi ainda maior.

Segundo aquele relatório, havia indícios muito fortes, sem confirmação, de que Osnin havia sido capturado durante aquela guerra por um grupo tribal do Noroeste daquele país, que era rival aos Talibãs e que depois disso, ele nunca mais foi visto. De acordo com informações recebidas por prisioneiros daquele local, Osnin foi morto em um dos vários interrogatórios que havia passado. Mas, essa informação não pôde ser confirmada. Era necessário, uma busca adicional de documentos naquela região, para confirmar se essas informações eram verídicas e isso seria feito por aquele grupo de investigadores nos próximos dias.

Ao ler essas informações, Saleh fica chocado. Muito impressionado com o que descobriu, ele começou a pensar de forma ainda mais intensa no que fazer. Agora que ele sabia que Osnin provavelmente estava morto, se casar com Aisha não era mais proibido, em certa perspectiva. A única coisa que o impedia era o compromisso que ele havia feito com Amira.

Imaginando que se tirasse aquele relatório daquela mesa o seu pai pudesse desconfiar, ele colocou o dossiê no mesmo lugar em que estava posicionado para não levantar suspeitas de que ele foi visto por alguém. Em seguida, foi para o seu quarto e começou a imaginar o que faria depois de descobrir aquelas informações a respeito de Aisha e Osnin.

No íntimo de seus pensamentos, a esperança de ter Aisha como esposa renasce, mesmo sem ter a certeza se Osnin morreu. Durante o restante daquele dia, ele fica boa parte dele no seu quarto a pensar no que faria depois de ter ciência daquelas importantes informações. Ele estava muito dividido em meio aos seus pensamentos. Se Osnin estiver mesmo morto, Aisha está desimpedida! Refletia ele.

Durante a madrugada, Saleh não consegue dormir. Fica a mexer de um lado para o outro em sua cama. Ele precisava decidir e rápido o que fazer diante daquelas novas informações que viu naquele relatório sobre a vida de Aisha.

Às 4 horas da madrugada, ele levanta e vai novamente ao escritório do seu pai. Pega aquele dossiê e o leva para o seu quarto. Ele releu aquela parte que falava de Osnin e viu que as fontes que levavam aqueles homens a crer que Osnin havia morrido, eram de pessoas que estavam presas junto a ele naquela cadeia, também pertencentes ao regime Talibã. Entendendo que aquelas fontes eram seguras, ele toma uma decisão. Eu vou voltar para a Inglaterra!