Dia seguinte.
Meu corpo doía.
Foi a primeira coisa que pude verificar enquanto, sonolenta, tentava me adaptar com a recém retomada consciência. Sentia meu corpo mais pesado que o normal, o que talvez fosse o fruto de uma noite longa de sono, coisa com a qual eu já havia desacostumado. Ainda que pesasse alguns quilos a mais, eu conseguia sentir com facilidade o nível de relaxamento em que agora me encontrava, e se fosse me deixar levar apenas por esse fato, não teria movido um músculo sequer para mover as pálpebras.
Mas então lembrei do motivo pelo qual eu estava me sentindo daquela forma, e meus olhos abriram imediatamente. Pensei que a luz do dia machucaria meus olhos sensíveis ao sono, porque como bem me lembrava, as cortinas das janelas de vidro estavam recolhidas na noite anterior. Mas, para minha surpresa, isso não aconteceu.
A persiana negra agora estava fechada, fazendo com que o quarto ficasse iluminado apenas por uma luz fraca, vinda de uma grande luminária estilizada do outro lado do cômodo. Estranhei, porque por mais que a claridade exterior estivesse bloqueada, o quarto certamente não estaria com aquela aparência.
Me virei para o lado, ficando agora mais ciente das dores em meu corpo, e constatei que estava sozinha no quarto.
O lençol estava todo enrolado em mim, o que podia significar que o ocupante do lado esquerdo da grande cama de casal havia saído de lá há algum tempo. Foi então que reparei no relógio no criado mudo, que mostrava as horas atuais.
Meus olhos registraram o número 6:46, mas foram as duas letras posteriores que me fizeram arregalar os olhos.
6:46 p.m.*
– QUÊ?
Levantei rápido, ignorando as dores musculares, e olhei em volta, procurando por outro relógio para me certificar de que NÃO eram quase 19h.
Como não achei nenhum, corri para o banheiro e achei sobre a bancada em frente ao espelho um relógio de pulso que agora marcava 18:47h.
– Ah, merda!
Mas onde ele estava, afinal de contas? Por que não me acordou para pedir que eu fosse embora? Por que me deixou dormir quase até as 19h?
– Merda! Merda!
Levei alguns segundos rodopiando feito barata tonta no mesmo lugar, tentando lembrar onde havia deixado minhas roupas da noite anterior.
Finalmente olhei para cima e vi minha calcinha e meu vestido azul pendurados no gancho atrás da porta, a trinta centímetros de mim. Peguei as peças de roupa e me vesti rapidamente, pensando agora em muitas coisas ao mesmo tempo.
Por que ele não havia me chamado assim que acordou e me viu ao lado dele?
Eu podia lembrar das poucas vezes em que havia sido permitida dormir na cama de um cliente, e em todas elas eu era acordada às pressas por homens que só queriam que eu fosse embora o mais rápido possível.
Aparentemente, essa havia sido a primeira vez em todo esse tempo que isso não havia acontecido.
Onde ele estava? Estávamos em um sábado, e até onde eu sabia, ele só trabalhava de segunda a sexta.
Talvez aquele fosse um dia a parte, onde estivesse excepcionalmente ocupado e atarefado. Mas isso não seria coincidência demais? Além do mais, eu tinha minhas convicções que ele não sairia e deixaria uma prostituta sozinha dentro da sua casa.
Ele não era imbecil.
Onde quer que ele estivesse, eu tinha uma certeza: Quando o encontrasse, sabia que aquela postura fria e austera estaria lá.
Por isso, era bom que eu não começasse a esperar cumprimentos cordiais e palavras doces além de um "Boa tarde, saia da minha casa".
Esse pensamento só aumentou meu nervosismo em encontrá-lo.
Eu queria olhar para ele depois daquela noite, queria vê-lo antes de ter que me despedir outra vez. Poderia ficar fantasiando com aquele beijo, mas eu bem sabia que aquilo não tinha significado nada para ele. Talvez tudo aquilo tivesse sido apenas o resultado de uma possível culpa depois das minhas palavras, ou então algum tipo de alívio pelo seu instinto protetor um tanto quanto estranho comigo, mas não seria nada muito além disso. Nada que me fizesse ter qualquer tipo de esperança.
Eu precisava de um banho. Podia dizer isso só de lembrar da noite anterior, mas aquilo ficaria para outra hora.
Calcei meus sapatos e lavei o rosto apressadamente, bochechando com um enxaguante bucal de menta que estava em cima do balcão e penteando com os dedos meus cabelos, tentando desfazer os nós nas mechas mais próximas à cabeça.
Finalmente me olhei no espelho e me assustei um pouco com meu reflexo.
Meus lábios estavam inchados e vermelhos da noite anterior. Meus olhos também estavam inchados e ainda avermelhados, provavelmente pelo choro, e meu pescoço apresentava manchas um pouco escuras. Reparei então que os hematomas se espalhavam pelo resto do corpo, e embora aquilo fosse algo conhecido para mim, não pude deixar de ficar surpresa, já que havia algum tempo desde que a última marca havia aparecido.
Quando me dei conta de que não ia ficar muito melhor que aquilo, saí já à procura da minha bolsa, que deveria estar em algum lugar do quarto. Encontrei-a pendurada na maçaneta da porta, então me virei novamente e vi uma cama extremamente desarrumada, com lençóis e edredom enrolados e vários travesseiros quadrados e pequenos espalhados pelo chão.
Dobrei e arrumei tudo com pressa, colocando cada coisa em seu lugar, e só então pude sair.
Naquele momento, eu não sabia se tentava ser discreta e não fazer barulho até chegar à porta, com um certo receio de ter que encará-lo de novo, ou se ia à sua procura pela casa, podendo usar como desculpa a exigência do pagamento pelo programa da noite anterior.
Optei por caminhar cuidadosamente, tomando cuidado para que os saltos de meus sapatos não fizessem um barulho muito alto e o alertasse de que eu estava prestes a ir embora, onde quer que ele estivesse.
Cheguei até a cozinha olhando apenas para o chão, tendo a porta como meu único objetivo, e foi antes de dar o último passo para girar a maçaneta que ouvi um pigarro atrás de mim.
Virei-me sem muita pressa, finalmente fitando-o nos olhos, enquanto ele se debruçava no balcão com um laptop aberto à sua frente.
Eu sabia que não estaria errada em minhas conjecturas, e então vi ali exatamente o que esperava ver: Uma postura fria e dura, embora não fosse completamente indiferente.
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De repente, amor
Romance♦ De repente, amor. Bruno é um jovem homem de negócios, embora não saiba nem do que se tratam os contratos que assina. Anne é uma prostituta de luxo, que apesar de se sentir extremamente mal por isso, não encontra uma saída para mudar de vida. Como...