Desliguei, com um aperto no peito. Passava um pouco das 19h, e Bruno ainda não havia chegado. Tentei retomar a calma, exercitando minha respiração de olhos fechados. Tentei me recusar a acreditar naquilo. Ele não podia simplesmente ter deixado de me desejar. Não podia me ver com outros olhos. Aquilo era absurdo, e me magoava. Eu era a mãe da filha dele, e só Deus poderia dizer o quão feliz eu me sentia com esse fato. Mas isso não fazia com que eu deixasse de lado o meu papel de mulher. E, como toda mulher, precisava explorar minha sexualidade. Se aquilo fosse verdade, eu passaria a me sentir apenas uma barriga ambulante, carregando a única coisa valiosa que Bruno possuía. E isso me magoava.
Ele não me tocaria pelo resto da gravidez? Se ele me negava com a barriga ainda ligeiramente maior, como seria nos últimos meses da gestação? Ele me evitaria ainda mais? Por que a falta de intimidade incomodava apenas a mim, e não a ele? Seria possível que Bruno estivesse se aliviando de outras maneiras? Seria possível que, me vendo exclusivamente como a mãe da sua filha, ele tivesse procurado outra qualquer que desempenhasse o meu antigo papel? O papel de amante, que satisfaria aos seus desejos limitados por essa gravidez? Será que ele havia ido atrás de outra mulher? Ou o que seria pior: Será que havia ido atrás de uma prostituta, pagando para que ela fizesse o que EU deveria fazer? Deus, por que eu estava pensando naquilo? Talvez estivesse exagerando, ou fazendo suposições absurdas, mas o desespero começou a me tomar de uma tal forma que, agora, eu fazia força para não rir da própria situação. Eu já havia estado no lugar da prostituta, e agora estava no lugar da mulher traída. Até onde essa ironia poderia ir? O quão cruel ela poderia ser? A quantas mulheres eu havia feito mal no passado por ser o que era? Talvez fosse a hora de pagar por esse mal. Pagar pelos meus pecados do passado. Ainda assim, eu não conseguia lidar com isso, e isso era desesperador.
– Não seja idiota! Ele não está te traindo! - Falei em voz alta, controlando a vontade de me estapear.
Me forcei a repetir, incessantemente, que aquilo era simplesmente ridículo, e que não havia motivos para tal suspeita. Mas eu precisava que ele confirmasse isso, para poder respirar direito.
Então, por um motivo ou por outro, eu o colocaria contra a parede aquela noite.
Não passaria daquela noite.
– Oi, amor! - Bruno falou de forma alegre enquanto irrompia pela sala e se jogava no sofá ao meu lado. Como sempre fazia, me deu um beijo carinhoso e, seguindo sua mais recente mania, levantou meu casaco e beijou minha barriga, falando com ela como um louco fala com qualquer objeto inanimado - Oi, lindinha.
– Você demorou hoje. - Falei, esquecendo do filme que passava na tv, torcendo para que minha voz não tivesse mostrado toda a hostilidade e a ansiedade dentro de mim.
– Tive várias reuniões de emergência - Ele falou, desanimado - Ela te deu muito trabalho hoje?
Toda vez que Bruno falava sobre "ela" comigo, estava se referindo à nossa filha. Eu havia aprendido isso nas últimas semanas.
– Não. Hoje foi um dia tranquilo. Não vomitei nenhuma vez. - Respondi, observando-o se agarrar a mim e esfregar o rosto mais uma vez no meu umbigo. Sua barba um pouco rala fez cócegas nada inocentes em mim, por isso tremi involuntariamente. Meu arrepio, no entanto, não passou desapercebido por ele.
– Que bom. - Ouvi-o dizer, enquanto se afastava repentinamente. Senti a rejeição outra vez, e outra vez segurei a vontade de chorar e agredi-lo. - Vou tomar um banho. O dia hoje foi cansativo...
– Como todos os outros. - Falei de forma amargurada. Ele notou meu mau humor, mas não falou nada, se virando e indo para o banheiro do seu quarto.
Foi o banho mais demorado que Bruno já tomou na vida. Ou talvez tivesse durado o que seus banhos costumavam durar, mas dado meu estado de ansiedade, ele parecia estar trancado no banheiro havia algumas semanas. Estava a ponto de socar a porta, fingindo estar passando mal, mas me contive. Esperei pacientemente - ou quase -, apenas querendo que ele saísse logo e diminuísse minha ansiedade. Eu precisava conversar com ele.

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De repente, amor
Romance♦ De repente, amor. Bruno é um jovem homem de negócios, embora não saiba nem do que se tratam os contratos que assina. Anne é uma prostituta de luxo, que apesar de se sentir extremamente mal por isso, não encontra uma saída para mudar de vida. Como...