Anne's POV

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Àquela altura, eu estava completamente transformada, e me transformava continuamente, dia após dia. Não era apenas pela aparência que se podia dizer isso: Embora minha barriga simplesmente houvesse resolvido crescer de uma vez só, compensando os quase três meses de disfarce, era também no meu humor que a gravidez se manifestava. 

Se no início as mudanças bruscas de comportamento deixavam tanto Bruno quanto a mim mesma um pouco confusos, agora elas pareciam nos pegar completamente de surpresa. Cheguei a ter medo de estar desenvolvendo algum tipo de bipolaridade, já que, às vezes, era uma questão de segundos para que meu humor mudasse radicalmente, com direito à lágrimas e berros. Mas o dr. Carlos nos certificou de que aquilo era normal. 

Aparentemente, Bruno estava começando a ter um pouco de medo de mim. Claro que grande parte das vezes, quando brigávamos (sempre por motivos idiotas, porque meu humor resolvia entrar em crise) ele não respondia o que responderia normalmente só porque tinha medo que, insistindo na discussão, meu nervosismo atingisse níveis perigosos para a gravidez. Mas em alguns momentos eu realmente o notava um pouco tenso, sendo excessivamente gentil e manso. E mesmo que isso só me enervasse mais, ele parecia decidido a bancar o tipo de namorado "tudo-que-você-quiser,amor".

Ameacei-o de morte algumas vezes, e talvez porque eu parecesse sincera, em determinado momento ele passou a me sufocar menos. Me senti vitoriosa apenas até o momento em que seu pequeno afastamento trouxe uma sensação completamente absurda de abandono. Depois de muito drama, nós dois conseguimos balancear as oscilações que meu humor sofria, e então ele sabia quando era a hora de se afastar e quando era a hora de grudar em mim. 

– Amor? - Ele gritou assim que ouvi a porta da sala ser batida. 

– Quarto! - Gritei de volta, ainda me encarando no espelho enorme do closet apenas de calcinha e sutiã, exatamente o que estivera fazendo durante os últimos dez minutos.  

Bruno entrou já com o paletó na mão, desfazendo o nó firme da gravata em seu pescoço e parecendo cansado. Não me mexi, ainda encarando o espelho. Esperei que ele se pronunciasse parado ali atrás de mim, também encarando o nosso reflexo. 

– Tudo bem? - Ele perguntou, me olhando como quem olha uma granada prestes a explodir. Assenti com a cabeça, lutando contra o biquinho pré-choro que começava a se formar no meu rosto. 

Ele obviamente percebeu que não estava tudo bem, e por isso se aproximou, beijando meu pescoço de leve enquanto jogava despreocupadamente seu paletó e sua gravata em algum canto, envolvendo seus braços em mim logo em seguida. 

– Tem certeza? - Bruno insistiu, brincando com a ponta do seu nariz carinhosamente no meu ombro, mas ainda me olhando pelo reflexo com o máximo de cautela. 

O choro veio até minha garganta e voltou. Meu queixo tremeu e meu biquinho se transformou em uma careta. 

– Estou... horrível. - Consegui falar, tentando não tremer a voz. Ele suspirou contra meu pescoço. 

– Me diga exatamente qual parte em você está horrível. Porque eu não consigo ver... 

– Eu toda. 

A lágrima que brincava em um dos meus olhos caiu. 

– Amor... - Ele começou, com sua voz suave e calma, que demonstrava toda a paciência de um monge budista - Você não consegue ficar feia.

– Eu estou gorda... E deformada...

– Você não está deformada. Mas se a nossa filha está aí dentro, sua pele e seus músculos precisam se esticar. 

Como de costume, ele espalmou suas mãos na minha barriga, não enorme, mas evidentemente desenvolvida.

– Você não negou que eu estou gorda. - Comecei, sentindo uma tristeza idiota. 

De repente, amorOnde histórias criam vida. Descubra agora