É engraçado como domingos costumam ser dias monótonos e deprimentes.
Na verdade, depois de algum tempo constatei que o domingo era o dia da semana necessário para os trabalhadores que precisavam repor suas energias de uma longa semana exaustiva. No meu caso não era assim.Eu simplesmente não fazia muita coisa. Não tinha um tipo de trabalho braçal, e tudo na minha vida profissional resumia-se a assinar toneladas de papéis. Por isso, domingos eram chatos. Ao final de uma semana eu me encontrava bastante disposto e sem um pingo de vontade de descansar. Então meus domingos sempre começavam às 6:00 da manhã, quando o sol ainda estava se decidindo se sairia para brincar ou não.
Depois de um café-da-manhã preguiçoso, o que normalmente se resumia a algum cereal ou um copo de suco de laranja, eu saía para correr. Corria pelas ruas ainda quase desertas, não fosse por alguns idosos que jogavam cartas em praças, jornaleiros e padeiros (que normalmente acordavam cedo para atenderem aos mesmos idosos).
Quando retornava para casa, já perto das 9h, não havia muito mais a fazer senão assistir à TV e ficar nisso até o resto do maldito domingo. Eu não tinha amigos. Me esquivei de quase todas as relações que pude depois de sofrer uma grande decepção.
Obviamente muitas pessoas me achavam antissocial e desconfiado, o que não deixava de ser verdade. Ainda assim não eram incomuns casos de festas luxuosas onde eu era algum tipo de convidado de honra, o que me colocava obrigatoriamente em uma posição na qual eu precisava comparecer. Digo "obrigatoriamente" porque quase sempre minha vontade de curtir festas de ricos esnobes era quase tão grande quanto de me matar, mas em muitas delas alguns assuntos importantes relacionados a negócios eram tratados, e eu precisava ir.
Claro que eu nunca, jamais ia sem a companhia de Duda. Normalmente era ela que tomava toda e qualquer decisão sobre a empresa, dentro ou fora dela. Obviamente ninguém sabia disso, mas esse era nosso segredinho. E eu sabia que se fosse aderir a alguma religião, formaria minha própria onde Duda seria endeusada, se tornando o objeto dos meus agradecimentos e da minha adoração. Era o mínimo que eu podia fazer pela mulher que havia salvado o meu pescoço tantas e tantas vezes, e me conhecia talvez melhor do que minha própria mãe.
– Alôôôô...
– Bom dia, Duda. Te acordei?
– Sr... Coolin? Não, bom dia senhor.
– Prometo que vou recompensar você por ficar alugando seu tempo quase todos os domingos. Sinta-se livre pra desligar na minha cara, eu sei que sou chato.
– O senhor pode me dizer primeiro por que ligou.
– Bom, primeiramente, estou entediado, o que explica o fato de ter ligado pra sua casa à essa hora com o objetivo de perguntá-la se é realmente necessário que eu vá trabalhar amanhã.
Silêncio do outro lado da linha. Aquele tipo de silêncio que se faz quando uma criança pergunta à mãe se pode viajar sozinha para a Disney e ficar morando lá por um mês comendo só chocolate.
– Obviamente, senhor.
Ela respondeu, com toda a paciência que minha imaturidade exigia dela.
– Hm. Certo. Também tenho que ir à festa de amanhã?
– Sim, creio que sim.
– Mas é só uma festa! Com as mesmas pessoas, as mesmas bebidas... - Comecei.
– Sim, e o senhor sabe que o evento será importante para que consigamos fechar o negócio com os Hilton.
– Você poderia...
– Creio que eu não tenha esse poder.
– Mas eu...
– Eles só fechariam o contrato com o senhor. E temo não ser nada parecida com a sua pessoa para poder enganá-los.
– Merda.
– Era só isso, senhor?
– Pare de me chamar de "senhor" em pleno domingo.
– Perfeitamente. Posso voltar a dormir ou você ainda tem mais alguma inutilidade a debater?
Ri de sua sinceridade. Eu gostava de Duda quando ela não estava desempenhando o papel de secretária e me tratava como o verdadeiro idiota que eu era.
– Tudo bem. Mas quero lembrá-la que se eu beber além da conta você será a responsável por mim. Mesmo se eu vomitar na piscina e socar algum garçom.
– Ok...
– E você terá que me trazer até em casa e me colocar na cama. Não precisa me dar banho, eu poupo você disso. - Brinquei.
– Ok. Meu marido ficará feliz em saber que eu não preciso vê-lo nu.
Ri novamente.
– Duda, socorro. Minha vida é um tédio.
– Mate-se. Um bom dia, Bruno.
E, enfim, desligou.
Vida de merda.
Deslizei as portas de vidro e caminhei para a varanda da sala que tomava toda a largura do cômodo. Debrucei-me sobre o parapeito e pude ver alguns carros passando pelas ruas muito abaixo de mim, agora bem mais movimentadas. Mirei o horizonte e vi o grande parque, distante dois quarteirões de mim.
Anne.
Lembrei dela imediatamente, fitando as copas das árvores que cobriam quase completamente o parque lá embaixo. Lembrei da chuva de ontem e de como meu sábado havia começado: Eu tinha acordado em uma casa de prostituição. Me permiti rir disso por algum tempo. Não só isso, como também tomei café da manhã na companhia de várias garotas de programa.
Presenciei um ataque de nervos particularmente interessante de Ninha enquanto uma de suas amigas parecia querer pular no meu colo no meio da cozinha. Achei graça no fato deque talvez aquilo fosse fruto de algum tipo de sentimento de posse dela por mim. Ela realmente ficava uma graça nervosa.
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De repente, amor
Romance♦ De repente, amor. Bruno é um jovem homem de negócios, embora não saiba nem do que se tratam os contratos que assina. Anne é uma prostituta de luxo, que apesar de se sentir extremamente mal por isso, não encontra uma saída para mudar de vida. Como...