– É.
– Há quanto tempo você está... interessado nela?
– Eu não sei... - Comecei, escondendo o rosto nas mãos - Não sei por quanto tempo escondi de mim mesmo toda essa merda... Não sei se foi no primeiro dia ou no último...
Eu estava a ponto de começar a chorar. De novo. E ter Duda ao meu lado, servindo de colo, era quase irresistível. Ainda assim, tentei manter o pouco de força que ainda tinha em mim e mantive minha postura, não parecendo nada mais além de um homem preocupado.
Por dentro, eu estava desesperado, quase enlouquecendo. Mesmo longe, mesmo depois de três semanas, ela ainda conseguia ter aquele tipo de poder sobre mim. Um poder que eu não conseguia negar, e bastava lembrar dela que de repente nada mais parecia ser tão importante.
Isso estava me matando, talvez no sentido literal da palavra.
Eu já não sabia há quanto tempo não fazia uma refeição decente. Minha aparência deveria estar lembrando algum tipo de homem das cavernas, e minhas noites andavam extremamente mal dormidas. Quando conseguia dormir, todos os sonhos que me atormentavam contavam com a presença dela, e era frustrante saber que mesmo que aquilo me fizesse mal, ainda assim eu deitaria noite após noite esperando sonhar com ela outra vez.
Tê-la comigo, mesmo que somente dentro dos meus pensamentos, era consolador. As manhãs tornavam-se tristes quando eu notava que tudo não passava de um sonho, mas ainda assim, os poucos minutos em que podia desfrutar de sua companhia irreal valiam a pena. O problema era que eu estava começando a me acostumar com sua lembrança, o que ia diretamente contra meu objetivo principal: Sobreviver sem ela.
E conforme o tempo passava, essa tarefa parecia se tornar mais difícil.
Duda havia me convencido a tentar voltar para o escritório. Não porque eu fazia alguma falta, já que ela era muito mais competente do que eu para administrar os negócios, mas para o meu próprio bem. Depois de uma conversa que poderia ser considerada apenas como um desabafo e lamentações, finalmente concordei com ela no ponto de que talvez eu tivesse mesmo que me ocupar com mais coisas - o máximo possível - para que minha cabeça não achasse tempo livre que pudesse preencher com lembranças dela e preocupações sobre o fato de ela estar bem e feliz.
Agora, já fazia mais de um mês que eu estava longe de Anne. Eu sentia a sensação de dor, de perda e de vazio tentar me dominar lentamente, e eu estava quase cedendo. Não havia forças para afastar toda aquela ausência de vida, porque ela não estava comigo. Mesmo assim, lá estava eu, comparecendo a reuniões com Duda ao meu lado, enquanto fingia prestar atenção nos gráficos e nos números de alguma coisa.
Normalmente, eu não sabia que terno estava usando. Já havia esquecido minha mania de mexer nos cabelos para penteá-los. Saía de casa sem passar perfume, e só fazia a barba diante de ameaças de morte de Duda. Eu não me importava com muitas coisas, porque praticamente nada fazia sentido. Praticamente nada era importante.
Eu não conseguia esquecê-la. Era desesperante, era enlouquecedor, mas eu não conseguia esquecê-la. Nenhum dia. Um minuto sequer. Ela sempre, sempre estava comigo. Fosse em reuniões, na hora do almoço, quando ia me deitar, dirigindo ou tomando banho. Estivesse eu sozinho ou acompanhado, bêbado ou não. Não era como uma lembrança qualquer, a qual eu poderia escolher se pensava ou não. A presença dela dentro da minha cabeça já havia se tornado uma pequena parte de mim. Era como respirar. Uma pequena parte que me mantinha vivo, que me mantinha de pé.
Dois meses sem vê-la.
Eu estava ruindo. Aquilo já estava insuportável, intolerável. Era impossível viver daquele jeito, e de alguma forma, chegar até ali parecia ter sido sorte. Conseguir viver sem ela era um milagre.
Duda fingia que tudo estava saindo conforme o planejado, mas eu a conhecia o suficiente para saber que ela estava preocupada comigo. Talvez meu estado estivesse mostrando uma depressão tão profunda que ela temia me ver enlouquecendo ou cometendo suicídio no final das contas. Por isso, não estranhei quando fui presenteado por ela com uma semana de folga, para "me distrair e esquecer dos problemas".
Tendo mais tempo livre, era claro que as coisas piorariam consideravelmente.
Por isso, aquela semana foi o início da pior fase daquele rompimento. Aproveitando minha fraqueza, me permiti baixar a guarda e simplesmente pensar nela sem culpa quando sua lembrança vinha até mim. Os primeiros dias foram mais fáceis, porque eu não tinha que ficar lutando contra mim mesmo para tentar arrancar a imagem dela da minha cabeça. Mas ao final da semana, meus pensamentos já estavam tão tomados pela lembrança dela que eu me sentia exausto, e agora que havia permitido que ela invadisse minha mente com tanta frequência e com tanta facilidade, não havia mais como tentar afastá-la outra vez.
Ao final de uma semana, eu não consegui voltar para o trabalho.
Duda voltou a me ligar, e não insistiu quando confessei que não poderia sair de casa e fazer qualquer coisa que fosse. Talvez porque eu tenha implorado para que ela me deixasse em paz, mas ainda assim, eu continuava recebendo ligações diárias dela. Quando comecei a não atendê-las, ela se contentou em falar comigo três ou quatro vezes por semana.
Os dias passavam devagar. Eu não tinha nada para fazer, e se tivesse, não faria. Minha falta de vontade em qualquer coisa agora estaria tomando proporções preocupantes, se eu estivesse me importando. Meu estoque de miojo e sopas prontas estava acabando, já que eram as poucas coisas práticas e rápidas de preparar, quando eu me dispunha a comer algo. Mais cinco garrafas de whisky da minha coleção haviam sido consumidas em pouco tempo. Minha tv não era ligada há décadas, e o único motivo que fazia com que eu carregasse a bateria do meu celular, ao ver que ela havia acabado, era saber que se Duda não tivesse mais como se comunicar comigo, ela provavelmente arrombaria a porta do meu apartamento me xingando de nomes inadequados.
Três meses.
Fazia três meses desde que havia visto Anne pela última vez. Três meses desde que havia sentido aquele perfume, que havia falado aquelas coisas, que a havia humilhado na frente de todos os clientes daquela casa. Aquela era a última imagem que ela pôde guardar de mim, um idiota insensível e estúpido, egoísta e covarde.
Eu era um covarde.
Eu estava me matando, e tudo porque não tinha coragem de assumir que precisava tanto dela. Não tinha coragem de assumir que ela simplesmente me tinha nas mãos, tinha medo do fato de que ela poderia fazer qualquer coisa comigo.
Qualquer coisa.
Meus pensamentos eram dela. Minha alegria pertencia a ela. Minha vontade de fazer qualquer coisa tinha ido embora com ela. Ela comandava a minha vida inteira, e sequer sabia disso.
Ela não fazia ideia.
– Bruno?
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De repente, amor
Romance♦ De repente, amor. Bruno é um jovem homem de negócios, embora não saiba nem do que se tratam os contratos que assina. Anne é uma prostituta de luxo, que apesar de se sentir extremamente mal por isso, não encontra uma saída para mudar de vida. Como...