Anne 6

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Bruno continuava me fitando, correndo os olhos do meu rosto passando por meus braços e seguindo para minhas pernas.

Fui até um dos criados mudos, peguei a bolsa de maquiagem que Júlia havia me emprestado e adotei um tom educado na voz:

– Com licença. Estarei normal em quinze minutos.

E dizendo isso, fechei a porta do banheiro atrás de mim.
Quando saí fiquei surpresa ao constatar que ele ainda estava no quarto, sentado na ponta da cama enquanto lia algum capítulo de Orgulho e Preconceito. Ao me notar ali, Bruno tirou os olhos das páginas e me encarou. Lançou-me uma olhada pouco discreta de cima a baixo e sorriu.

– Você parece melhor. - Ele falou.
– Eu me sinto melhor. E maquiagem realmente é a melhor amiga das mulheres.

Ele continuou me encarando por mais algum tempo ainda sorrindo, e então voltou-se ao livro:
– Jane Austen é muito romântica.
– Sim. - Falei sem emoção, enquanto procurava uma calça ou alguma peça de roupa qualquer para cobrir minha calcinha. Como só encontrei um short jeans, o vesti rapidamente.
– Você é romântica?

Olhei-o imediatamente e vi que ele já me encarava.
Não tinha entendido o porquê da pergunta. Mesmo que eu fosse, o que isso importava para ele? Bom, talvez fosse só uma curiosidade, mas de qualquer forma, nenhum homem era curioso em relação aos meus gostos ou à minha personalidade... Ou aos meus sentimentos. Ou a qualquer coisa relacionada a mim.

– Não. - Respondi - Não posso me dar a esse luxo.
– Todo mundo pode ser romântico.
– Eu não ganho nada sonhando com um príncipe encantado. Pelo contrário, só tenho a perder.
– Ninguém tem nada a perder com um sonho.

Suspirei.

– Quando você percebe que um sonho é inalcançável, então você tem muito a perder.

Ele continuou me olhando calado, mas enfim falou:
– Não subestime o poder dos contos de fadas.
– Prometo não subestimar assim que minha vida se transformar em um. Mas até lá me permito ser amargurada com a vida e não acreditar no amor.
– Você não acredita? - Ele arregalou os olhos - Nunca se apaixonou?

Eu queria responder imediatamente, mas alguma coisa na minha cabeça martelava uma dúvida ridícula, algo que eu não queria sequer tentar entender. Respondi depois de algum tempo:

– Não. Nunca.
– Uau. - Ele voltou seu olhar para o livro agora fechado, apreciando a capa.
– Você já? - Soltei.
Ele continuou fitando o desenho do livro em suas mãos.
– Já.
– Bom, dada a atual situação, acredito que não tenha sido um conto de fadas também.
De repente senti receio de ter sido rude em excesso, mas ele soltou um riso amargurado e debochado, ainda não olhando para mim ao responder:

– Não, não foi.
E então seu rosto ficou triste como eu jamais havia visto, e isso fez com que eu sentisse uma súbita tristeza por ele. Eu sequer sabia do que ele estava falando, mas gostaria que o que quer que fosse não tivesse acontecido.
– Um dia você me conta essa história. - Falei antes que pudesse me segurar, e as palavras já tinham saído.

Eu sabia que não tinha o direito de me intrometer em um assunto que parecia tão íntimo e doloroso para ele, mas só queria ouvi-lo e tentar consolá-lo de alguma maneira. O problema era que eu não planejava mostrar isso a ele, e aquela frase deveria ter sido mantida dentro da minha boca.
Ele me olhou com curiosidade.

– Se você quiser, é claro. - Corrigi, tropeçando nas palavras e sentindo corar da cabeça aos pés.
Ele sorriu um sorriso gentil enquanto falava outra vez:
– Vai ser bom conversar.
Sorri de volta, agradecendo em silêncio por Bruno querer compartilhar algo comigo além de sexo sem compromisso.
Ele se soltou primeiro da prisão que nossos olhares formavam um com o outro, sacudindo um pouco a cabeça e se levantando.

De repente, amorOnde histórias criam vida. Descubra agora