Joguei o celular no colchão e voltei ao meu estado catatônico. Anne me encarava de volta, com os olhos e nariz vermelhos do choro. Instintivamente, olhei para sua barriga, que estava escondida pelo casaco fofo do moletom, mas que eu sabia estar ainda perfeitamente lisa. Ela notou e, por algum motivo - ou talvez agindo por instinto também - colocou a mão na barriga.
– Você está... Grávida... - Estendi minha mão e toquei em um lugar muito próximo de onde a mão dela estava. Aquilo não foi uma pergunta, mas também não soou como uma afirmação.
Não era nada em particular: Apenas eu, tentando ficar totalmente consciente dos fatos. Como se falar aquilo em voz alta surtisse algum efeito.
– Estou... - Ela respondeu em uma voz muito baixa, quase envergonhada.
Sim, ela estava grávida. Do meu filho. Nosso filho. Afaguei gentilmente o tecido do casaco, com um medo irracional de empregar muita força ali.
– Há quanto tempo...
– Dois meses. - Ela respondeu, com uma voz um pouco mais segura.
Dois meses. Eu era pai havia dois meses.
Sentei mais perto dela. Tive a impressão de ver Anne recuar um pouco, mas devia ser apenas impressão. Encarei seus olhos outra vez, e instantaneamente veio à minha cabeça a imagem de um bebê perfeito com aqueles mesmíssimos olhos de chocolate. Acho que sorri.
– Eu não sei como isso aconteceu... - Anne começou, e imediatamente depois de ouvir aquilo, fui subitamente tomado pela lembrança de um detalhe esquecido havia algum tempo.
– Eu sei. - Falei calmamente, simplesmente por falar. Anne e Duda - cuja presença ali eu esquecia com frequência - me encararam como se eu fosse alguma aberração. Olhei de volta para elas, enquanto meus pensamentos voltavam um pouco no tempo, confirmando os exatos dois meses de gravidez de Anne.
– A primeira noite que ficamos juntos...
– Nós usamos camisinha. - Ela me interrompeu, parecendo querer que seu contra-argumento fosse o suficiente.
– Eu sei... - Continuei - Mas aquela noite... Foi você quem abriu a embalagem do preservativo.
Anne continuou me olhando como se implorasse para que eu desenvolvesse minha linha de raciocínio.
– E o que tem isso? - Ela perguntou.
– Você estava tremendo um pouco... Não conseguia rasgar o plástico...
– E? - Dessa vez foi Duda quem se pronunciou, usando o tom que ela costumava usar quando queria me agredir fisicamente.
– "E" que... - Recomecei, olhando para Anne outra vez - Você rasgou a embalagem com os dentes.
As duas ficaram em silêncio, processando a informação, ainda me encarando. Após algum tempo, Duda havia entendido, mas Anne continuava em silêncio, agora com o olhar desfocado. Como não tinha certeza se ela havia chegado à conclusão que eu queria que chegasse, resolvi terminar meu argumento, em um tom de voz tão homogêneo e calmo que me fazia parecer alguém à base de calmantes fortes.
– Você deve ter mordido a camisinha e furado a borracha. Quando fui jogar no lixo, notei que estava pingando, mas no calor do momento, não dei importância.
Ela continuou me encarando, sem nenhuma reação. Eu esperei, voltando a acariciar o moletom na altura da barriga, me permitindo agora fazer realmente alguma pressão e encostar no corpo dela. Meu filho estava ali. Nosso filho.
– Eu estou grávida desde o primeiro dia... Desde o primeiro dia que ficamos juntos?
Encarei seu rosto outra vez. Anne parecia em algum tipo de choque, o que poderia me deixar em pânico caso eu mesmo não estivesse em um também.
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De repente, amor
Romans♦ De repente, amor. Bruno é um jovem homem de negócios, embora não saiba nem do que se tratam os contratos que assina. Anne é uma prostituta de luxo, que apesar de se sentir extremamente mal por isso, não encontra uma saída para mudar de vida. Como...