E isso também estava me matando.
Primeiro, porque eu não devia querê-la.
Segundo, porque eu não podia tê-la por perto quando quisesse.
Ela não era minha. Ela não era de ninguém.
Ela era uma garota de programa, e isso era tudo o que realmente importava.
E era o que doía.
Doía, porque ela era especial.
Ela era importante. Eu a tornei importante sem nem me dar conta, e agora pagava pelo preço.
O preço de ser ingênuo, de ser dependente.
O preço de ser covarde demais para assumir tudo isso.
Assumir o que eu me negava a acreditar, mas já sabia.
O que eu negaria até estar perto da morte.
Até não aguentar mais.
– Desculpe!
Levantei a cabeça lentamente, tentando lidar com a dor ainda presente que fazia minha testa pesar algumas toneladas.
– Desculpe, senhor! Eu pensei que não havia mais ninguém no prédio.
Uma mulher de meia idade carregando um aspirador de pó um pouco maior do que ela tentava desenrolar seus pés dos fios do aparelho e sair da sala, me deixando sozinho outra vez.
– Que horas são?
– Passam das 23h, senhor. Me desculpe, eu não sabia...
– Tudo bem. - Comecei, um pouco tonto. - Eu já tinha que ter ido há muito tempo.
A mulher não pareceu se tranquilizar, ainda me encarando com culpa.
– Vou deixá-la trabalhar. Só pelo amor de Deus não ligue essa coisa enquanto eu estiver aqui.
Dizendo isso, juntei sem cuidado todos os papéis jogados em cima de minha mesa e os guardei em uma das gavetas, trancando-a em seguida.
Levantei-me, testando meu equilíbrio devagar, então me apressei a deixar a sala livre para a mulher e seu aspirador barulhento.
Fui irresponsável o suficiente para dirigir até em casa nas condições em que me encontrava, e agradeci ao meu anjo da guarda por me proteger durante o percurso.
Ao chegar, tomei um banho quente e demorado, traçando o plano que eu vinha arquitetando havia algum tempo.
O plano era simples, mas exigiria de mim uma força que eu não tinha.
Ainda assim, levaria minhas decisões até o limite. O limite de mim mesmo.
Eu manteria distância dela. Não a veria por algum tempo, até que minha cabeça voltasse um pouco ao normal.
Até que eu voltasse a me sentir seguro para estar com ela outra vez, até que eu parecesse de novo comigo mesmo.
Até que eu voltasse a me conhecer e me entender, eu manteria distância dela.
Porque sempre que ela estava perto demais, eu tendia a esquecer coisas importantes sobre minha própria personalidade, e sobre o certo e o errado.
Então eu não a veria hoje. Não a veria essa semana.
Eu sabia que isso talvez me fizesse um mal maior do que toda a confusão da qual eu fugia, mas eu tinha que tentar voltar a ser o que eu era. Porque perto dela eu era outra pessoa.
Eu me afastaria.
Uma distância que poderia ser considerada como segura.
Eu estaria seguro. Eu estaria bem.
Mas, primeiro, eu precisava me convencer disso.
Minhas últimas noites não poderiam ser classificadas como boas. Eu consegui dormir algo como duas, no máximo três horas por noite. Mesmo que o cansaço estivesse sempre presente, minha cabeça simplesmente não conseguia relaxar, e então eu passava o resto das horas pensando.
Pensando em tudo o que não deveria pensar.
Por isso, não era de se espantar que hoje, segunda-feira, quase todos os funcionários me olhassem como se eu fosse um zumbi ambulante enquanto passava pelas baias, até chegar à minha sala.
Entrei e encontrei Duda com uma cara que devia ser usada quando um de seus filhos fazia algo de ruim.
Ignorando seu olhar fuzilante, fui me sentar à mesa, já arrumando alguns papéis.
– Quantas reuniões tenho hoje?
– Nenhuma.
Olhei-a interrogativo.
– Como nenhuma?
– Você não vai trabalhar nesse estado.
Eu estava muito cansado para discutir, principalmente àquela hora da manhã. Por isso, tentei manter minha voz tranquila e cordial.
– Você não manda em mim.
– Pois é. Não mando. Talvez seja disso que você precise, alguém que mande em você.
– Certo. Já acabou? Pode me dar os horários das reuniões agora?
– Não vou te dar horário nenhum. Eu já cancelei todas as reuniões. Imaginei que você estaria desse jeito hoje quando o vi na sexta.
– E com ordem de quem você cancelou as reuniões?
– Com ordem de ninguém, senhor. E se fiz mal, me demita.
Encarei-a com raiva, algo que eu pensei não poder sentir nas condições em que me encontrava.
Ela estava sendo extremamente arrogante para uma secretária, mas o problema era que Duda sabia que podia fazer aquilo, porque no final das contas eu não a demitiria.
Além disso, minha raiva crescente me dominava porque ela havia tirado de mim a única coisa que conseguia me manter ocupado e, portanto, livre de pensamentos indesejáveis.
– E você pode me dizer o que espera que eu faça a porra do dia todo sem ter algo para me ocupar?
– Vá pra casa e durma. Você está horrível.
Ótimo. Era mesmo tudo o que eu precisava.
Podia explicar a ela que minha aparência horrível se dava justamente pelo fato de eu não conseguir dormir, e que se eu conseguisse, ela não precisava ter desmarcado as benditas reuniões.
– Por que vocês mulheres adoram se meter nas nossas vidas?
– Não seja estúpido. Só nos metemos nas vidas de quem gostamos.
– Eu não pedi conselho nenhum! Por que não me deixa em paz?
– Porque se eu te deixar em paz, Bruno, você se perde de vez.
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De repente, amor
Storie d'amore♦ De repente, amor. Bruno é um jovem homem de negócios, embora não saiba nem do que se tratam os contratos que assina. Anne é uma prostituta de luxo, que apesar de se sentir extremamente mal por isso, não encontra uma saída para mudar de vida. Como...