Viva.

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••• Suz's POV •••

Ouço alguém bater na minha porta e desperto o sono, dando autorização para a abrirem e, pela voz da pessoa que naquele momento fecha a porta, reconheço imediatamente que é o meu irmão.

⁃ Bom dia - fala daquele jeito animado que só ele tem.
⁃ Bom dia - respondo ainda de olhos fechados e sinto uma parte do meu colchão baixar quando ali ele pousa o joelho.
⁃ Vamos acordar, o sol já nasceu - continua a falar de um jeito animado e eu aceno positivamente - Bora - abana os meus ombros e eu levo a mão atrás para bater na sua perna e isso não o faz parar.

Suspiro e abro finalmente os olhos, me virando de costas para baixo.

⁃ Você é uma praga, Mozart, credo!
⁃ Eu só não queria estar sozinho. Quer vir tomar o café da manhã? - aceno positivamente enquanto bocejo - Então bora.
⁃ Espera só um pouco, quero ficar mais uns minutos na cama - respondo e ele levanta os lençóis, indicando que ia se deitar do meu lado.

Dei mais espaço para se deitar do meu lado e ele assim o faz.

⁃ Não dormi porra nenhuma essa noite - fala e eu o encaro - Adormeci umas onze horas e acordei à uma da manhã para não dormir mais.
⁃ Mas tinha alguma coisa te incomodando?
⁃ Não necessariamente, só perdi o sono - boceja e eu acabo fazendo o mesmo, rindo com ele de seguida - Aproveitei e já fiz o check-in da viagem.
⁃ Que viagem?
⁃ Para SP.
⁃ Vai viajar pra SP? - pergunto confusa.
⁃ Nossa mano, você anda muito desligada ultimamente - me encara surpreso e começa a rir - Eu tenho entrevista na Rap Box de amanhã a uma semana - ouço aquilo e sinto o meu estômago embrulhando.
⁃ Sério? Dia 28?
⁃ Não, dia 29, mas preciso ir para lá já no dia 28 porque a entrevista é de manhã.
⁃ Justo no meu aniversário... - falo de coração partido e ele inspira rapidamente.
⁃ Nossa! Eu estava esquecendo esse detalhe mano! - me puxa pro peito dele e beija o meu cabelo - Desculpa, amor! Festejamos ao almoço e depois quando eu voltar você festeja comigo... Nossa, desculpa mesmo pequena - me abraça.
⁃ É o seu trabalho, Mozart...
⁃ Mas você sabe que eu gosto de estar presente nesse dia... Volto ainda no dia 29, então a gente vai festejar na quinta, boa? Eu e você.
⁃ Se você não está na Terça, eu não vou festejar... Festejamos todos na quinta.
⁃ Nada a ver, Suzy! Festeje na Terça e n...
⁃ Eu só vou festejar na quinta, Mozart, de verdade - interrompo - Também não estou nada empolgada...
⁃ Porque isso, pequena? São os seus 20 anos!
⁃ Nada de importante... Mas prosseguindo, já sabe a matriz da entrevista? - procuro dispersar a conversa.
⁃ Não realmente, sabe? - volta a bocejar - Mas já me falaram que vamos abordar o início da minha carreira, porque eu escolhi o rap, as batalhas... O que o público quer saber, na verdade - se inclina pro lado e pega a minha água, começando a beber.
⁃ Vai falar sobre quando se mudou pro Brasil?

Ele acena positivamente, parando de beber e me encara.

⁃ Aliás, eu acho que eu só quis me tornar rapper de verdade quando eu vim pra cá, então é algo que eles querem abordar.

Volta a beber e eu o encaro confusa antes de rir.

⁃ Caralho Mozart, parece que você está de ressaca, olha o tanto de água que está bebendo!
⁃ Por acaso durante a noite tive sede e fiquei com preguiça de ir na cozinha porque a minha água tinha terminado - responde rindo e pousa a garrafa de novo no criado - Graças a Deus a água não tem gosto do Chris, se tivesse eu ia continuar com sede - continua e eu não consigo conter uma gargalhada.
⁃ Eu não sei o que você entende como "gosto do Chris", mas fique sabendo que essa água só foi posta aí ontem, então seria impossível...
⁃ Vai dizer na minha cara que ele ontem não esteve nesse quarto? - me encara enquanto ergue as sobrancelhas e fala do jeito mais confiante possível.
⁃ Na verdade ficou na porta enquan...
⁃ Para, Suzy, para - me interrompe - Você sai da sala e do nada ele sai também, ficam sumidos e de repente voltam juntos pra sala. Quer que eu acredite que ele não esteve aqui?
⁃ Só veio pegar a sweat dele, nada demais.
A sweat dele, a irmã do Mozart... - tenta ficar sério e acaba rindo na última parte.
⁃ Olha, sai do meu quarto!

Ele ri e me aperta no seu abraço, beijando o meu cabelo antes de ficarmos uns minutos em silêncio.

⁃ Você ligou para ele ontem? - encaro-o e aceno positivamente - E ele realmente vinha de algum lugar? - nego sem falar uma única palavra - Então foi rápido a chegar lá... - suspiro e ele acaricia as minhas costas - Vai, começa a falar.
⁃ Não há nada pra falar - tento responder como se me fosse indiferente, porém a minha voz fica fina e me denuncio. Ele bate nas minha costas para me fazer prosseguir e de novo eu suspiro - Sei lá, o contato dele foi o primeiro que veio na minha mente... Não deveria ter sido assim, mas parece que eu precisava dele e... - suspiro de novo - Eu sei lá, isso é tão errado.
⁃ É errado porquê?
⁃ Porque eu não quero! Eu não posso gostar mais dele, eu preciso matar isso, Mozart... Ele me quebrou, e depois vem juntar os pedaços de novo e isso e tão errado...
⁃ Visto que você já passou por isso uma vez, é melhor tomar cuidado.
⁃ Mas ele não foi como o Arthur. Ele foi uma merda ao ter uma ação agressiva, eu fui uma merda ao discutir com ele, mas o Arthur fazia jogo psicológico e me mostrava que sem ele eu não era nada porque só ele me queria... E é isso que me deixa confusa, porque ontem o Chris me mostrou que sem mim ele não é nada e eu não quero essa dependência porque eu sei o quão corrosiva ela é...
⁃ A dependência é corrosiva quando não existe amor, porque de uma forma saudável ela sustenta uma relação. Na minha, por exemplo, há muita dependência mútua, mas atenção, Suzy, só é algo bom quando o amor recíproco suporta a relação, caso contrário vamos ter uma relação onde um é subjugado e aí sim, levará a algo tóxico e perigoso.
Ele falou que me amava - falo baixo e o Mozart levanta o meu rosto, me fazendo encará-lo. A sua expressão era de pura confusão.
⁃ Mas amar amar, ou "amar"?
⁃ Amar... Tipo, amar, sei lá - acabo dando uma risada leve - Eu também falo que amo o Baviera, o Santi, o Knust... Amar de amizade eu acho, não sei... Deve ter sido no calor do momento - respondo por fim quando entendo que me perdi na minha confusão.

O Mozart coça levemente a barba antes de suspirar e prosseguir.

⁃ Eu não boto fé que seja tão simples assim. Ele amava você, todo mundo sabia, então eu creio que com tudo, só tenha intensificado. Pensa comigo, ele certamente ficou relembrando o que fez contigo, creio que pensando em inúmeras formas de chegar até você, então só intensificou. Quanto mais a gente ficar pensando em alguém, mais o sentimento se intensifica, seja ele qual for... - acaricia de novo as minhas costas quando vê que eu não falo - Você respondeu? Ou fingiu que nem escutou?
⁃ Eu respondi que eu também o amava, mas ele também deve ter pensado que é só por amizade... E talvez seja mesmo, sei lá...
⁃ Lá vem você complicando tudo. Cara, se você o ama, não tem porque esconder, principalmente para mim ou pra você mesma.
⁃ Mozart, eu vou embora - finjo uma risada - Não me adianta me entregar a isso se eu sei que não vai dar em nada.
⁃ Não tiro a sua razão, de todo, pequena, mas se eu te posso aconselhar, viva o hoje. De verdade, viva.
⁃ O que quer isso dizer?
⁃ Que você não tem que se privar do que quer que seja porque em três meses não estará aqui. Vá com as melhores memórias desses últimos meses, sem arrependimento. Vá com força para aguentar ficar longe de nós, vá com as memórias mais loucas - me puxa para me beijar o meu cabelo - Foi isso que eu fiz antes de vir para aqui, eu vivi pra caralho e, quando eu sentia saudade, eu lembrava de como eu fui feliz nessas semanas e acabava aliviando. No que depender de mim, esses serão os seus melhores meses.
⁃ Amo-te muito - respondo baixo tentando não começar a chorar - Você sabe sempre o que dizer, como me deixar bem.
⁃ São vinte anos estudando os seus comportamentos. Já sou doutorado até - começo a rir - Nessa faculdade, eu já sou diretor.
⁃ Efetivamente - respondo enquanto ele boceja de novo - Não quer ir tomar o café da manhã?
⁃ Eu quero, porque depois preciso treinar... Mas acho que vou dormir um pouquinho.

Enquanto eu me aconchegava no peito dele, acabamos concordando que iríamos dormir um pouco e depois treinaríamos juntos. Não muito depois senti a sua respiração mais pesada e notei que ele já dormia, antes de me pegar pensando em como foram as vezes em que eu adormeci no peito do Chris, daquele mesmo jeito, com a sua mão nas minhas costas, do jeito que o Mozart sempre fez. Provavelmente, deixar que ele fosse o meu último pensamento antes de voltar a dormir não fosse a coisa mais inteligente a fazer, mas é inegável o conforto que eu sinto nestas memórias, então eu prefiro manter-me nesta ignorância inocente.

𝚟𝚘𝚊𝚗𝚍𝚘┊ 𝐜𝐡𝐫𝐢𝐬 𝐦𝐜Onde histórias criam vida. Descubra agora