Carlos Eduardo - Depois dessa, eu precisava respirar

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Depois dessa, eu precisava respirar. A Bruna me tira do sério muito facilmente. Eu nem ao menos sei o porquê. Ela só faz o que quer, na hora que quer, do jeito que acha que tem que ser. Nem deveria me incomodar, mas me incomoda.

Pedi uma garrafa de água no bar. Ouvi os gracejos dos funcionários por causa da dança. Sabia que isso ia acontecer. Sabia que eu ia ficar vermelho de vergonha. Com a desculpa de verificar se tudo estava funcionando bem, eu me retirei e fui sentar no saguão por dez minutos.

─ Não sabia que você dançava tão bem... – Milena veio sentar ao meu lado no sofá. – Quer dizer, não sabia que você dançava tão bem esse estilo. Claro que já tinha te visto no programa.

Fiquei morrendo de vergonha. Nem falei nada. Ela reparou na minha timidez, provavelmente, porque eu deveria estar vermelho de novo.

─ Como é que um cara tímido desse jeito é capaz de enfrentar milhares de pessoas na televisão? – Demorei a responder. Mas eu tinha de falar alguma coisa ou ela iria embora.

─ Você já se sentiu diante de um desafio imenso? Algo realmente incapacitante? E, de repente, você tem a mais absoluta certeza de que se não vencer esse medo...

─ Não vai conseguir ser você mesmo nunca. – Ela completou meu pensamento. – Sei exatamente do que você está falando. – Ela colocou a cabeça no meu ombro muito confidente e eu estremeci.

Eu gosto dessa menina faz tanto tempo que nem sei dizer ao certo. Algo nela me atrai. Talvez seja a delicadeza de sempre, talvez fosse uma tristeza que ela carregava nos olhos. A primeira vez que eu a vi, num jantar com amigos dos meus pais, eu sabia que ela era igual a mim. Essa conversa só reforçava a certeza.

Nesses meses em que estamos estudando na mesma escola, fiquei cada vez mais interessado na personalidade dela. De perto, Milena é muito mais do que eu imaginava ser. Ela é interessante. Ela é inteligente. Ela é uma princesa em cada movimento. Parece que nasceu carregando a coroa. Nada a abala. Parece que venceu batalhas inimagináveis e conquistou uma felicidade que só pode vir da paz de espírito. Ela é forte.

Hoje, porém, seu sorriso não me convence.

─ Milena, está tudo bem? – Olhei para ela. Seus olhos começaram a lacrimejar na mesma hora. – Você está se sentindo bem? Eu posso te ajudar? – Nem acredito que eu segurava seu rosto entre as minhas mãos.

─ Está sim. – Ela passou a mão delicadamente pelos olhos, com cuidado para não borrar a maquiagem. Sorriu. – Não é nada, Carlos Eduardo. Não é nada. Pode me soltar. – Eu a soltei imediatamente.

─ Aconteceu alguma coisa? Alguma coisa na Atmosfera? – Eu me preocupei. Nunca me perdoaria se alguém tivesse feito algo com Milena dentro da minha casa de show. Ela segurou meu braço e sorriu de novo tentando me tranquilizar.

─ Não aconteceu nada, Kadu. Apenas problemas de namorados. – Sustentava o sorriso, mas dava para ver o quanto estava triste.

─ Vocês brigaram? – Deus sabe o quanto eu gostaria que eles dois terminassem e que o caminho ficasse livre de uma vez. Porém, vendo o quanto ela estava triste, eu só desejei que a dor parasse. Se pudesse, eu mesmo ia buscar o brutamonte.

─ Não. Não brigamos. Felipe está nos Estados Unidos.

─ Você está com saudades, é isso? – Eu a abracei e Milena não resistiu, se aconchegou em meus braços como uma menininha.

─ Estou, Kadu. Mas, mais do que isso, estou preocupada.

Milena respirou fundo e começou a me contar uma história sobre a pressão dos patrocinadores para que o namorado fosse de uma vez morar no exterior. E como ela sabia que aquilo seria bom para ele. Deu mil justificativas e concluiu que o relacionamento deles tinha um prazo de validade que se aproximava com uma velocidade incrível.

─ Você está sofrendo por antecipação. – Eu disse enquanto alisava seus cabelos. E que cabelos. Eu poderia facilmente me perder naquela maciez para o resto da minha vida.

─ Você não entende. – Balançou a cabeça. – As meninas pensam dessa mesma forma. Elas me trouxeram aqui para ver se eu mudava de ares e esquecia um pouco disso. Mas eu não consigo. – Olhava bem no fundo dos meus olhos. Ela o amava tanto. Dava para ver ali dentro. Desejei imensamente que um dia alguém me amasse tanto assim. Melhor ainda se fosse Milena.

─ Talvez seja melhor mesmo você se distrair, Milena. Mesmo que ele vá, vocês ainda vão poder namorar à distância.

─ Não sei fazer isso. – As lágrimas finalmente caíam. – Eu preciso do corpo dele colado ao meu. Sinto falta da sua respiração no meu ouvido. E até daquela estúpida tatuagem.

─ Entendo... – Juro que eu não precisava ouvir nada daquilo. Baixei os olhos na intenção de que ela não continuasse a falar sobre isso.

─ Sei que a única pessoa que o prende aqui sou eu... – Ela começou a soluçar. Arranjei forças para abraçá-la novamente. – Sei que ele precisa ir. Que quanto mais cedo for, melhor para ele será. Você compreende?

─ Claro. – Por mim, ele já poderia ter ido há séculos. – Mas, então, o que você pretende fazer? Vai terminar com ele antes só porque tem que terminar com ele depois?

─ Vou. – As lágrimas dela molharam a minha camisa. Eu poderia dizer a Milena que aquilo não fazia o menor sentido. Mas, uma vez na vida, me dei o direito a ser um egoísta. Eu gostava da menina. O cara ia viajar de qualquer forma, ia ser melhor para ele também. Que mal faria se eles terminassem meses antes? Quem sabe, até o final do ano, eu não poderia tentar algo mais? Mantive aquele abraço gostoso e aproveitei ao máximo o contato com a maciez daqueles cabelos.

***

Por Onde AndeiOnde histórias criam vida. Descubra agora