Último ensaio antes da apresentação. Pelas regras do programa, tem de ser feito na emissora. Fiquei nervoso para caramba só de saber que estariam nos filmando. Fico imaginando no domingo. Não sei se vou conseguir.
Já a Bruna está no seu habitat natural. Fala com todo mundo. Do porteiro ao elenco de estrelas. É de uma simpatia contagiante. Não posso reclamar. Ela também me tratou superbem. Segurou minha mão até entrarmos na sala e ficarmos sozinhos. Sabia que eu estaria nervoso.
Já não sei se teria coragem para enfrentar tudo isso se não fosse com ela. Tenho descoberto nos ensaios que eu e ela somos parecidos no quesito determinação. Acho mesmo que estou compreendendo um novo sentido da palavra parceria, pois sempre que eu fraquejo, ela está lá por mim. Assim como faço questão de estender a mão quando ela cai.
Soraya tem sido minha parceira por tantos anos que a gente se entende pelo olhar. Ela é ótima, é claro. Mas a verdade é que nós não contribuímos para o crescimento um do outro. Ou, pelo menos, não fazemos mais isso como fazíamos antigamente.
Quando nós ensaiamos, eu digo o que devemos fazer, ela executa com uma perfeição de movimentos impressionante. Outras vezes, é ela quem comanda a coreografia, mas nós sempre concordamos como um relógio que não fica desregulado nunca.
Com Bruna, boa parte do ensaio é um caos e, no entanto, é tão mais proveitoso. Primeiro, executar os movimentos é um suplício. Fora o escândalo do dói aqui, dói ali, não faz assim e não consigo. Ladainha constante dos exercícios de alongamento. Depois que superamos a questão da técnica, ela faz uma análise dura das nossas expressões faciais. Não sei nem porque ainda estranho as câmeras já que ela deixa uma das dela nos filmando a aula inteira.
Bruna sempre faz cara feia para minha expressão corporal assistindo ao filme. Corrige a posição das minhas mãos. O tipo de sorriso que devo dar. O jeito de olhar para a câmera. Até no figurino ela dá pitaco.
Minha roupa, decidida pela emissora, seria um terno branco tradicional com uma camiseta listrada. Enfim, a roupa de malandro. Bruna entrou numa discussão com a figurinista. Ela me fez tirar a blusa e os óculos. Insistiu em mostrar minha tatuagem. Eu queria morrer de vergonha, os olhos da figurinista grudaram em mim como um espanhol que descobre ouro nos adereços de índios.
─ Nossa! Que moleque lindo! – A moça disse virada para Bruna como se eu nem estivesse lá. Fiquei menos lisonjeado do que nervoso.
─ E não é não? – Bruna assentia com a cabeça, enquanto a moça mexia nos meus cabelos tentando dar um jeito neles. – Eu estava pensando em algo mais moderno, Solange. Jeans, por exemplo. O que você acha?
─ Acho que você está certíssima, Brunérrima! – Notei que figurinistas adoram aumentativos escandalosos. – Esse moleque vai arrasar na telinha. Mas você tem que dar um jeito no cabelo.
─ Eu sei. – Piscou para a amiga cúmplice. – Vou dar um jeito nos óculos também.
Pensei que as duas fossem olhar meus dentes e me vender no mercado negro. Nessa hora, sem participar de nada do processo, eu me sentia um peixe fora d'água. Agradeci quando acabou o tormento e saímos do local do ensaio com todas as obrigações contratuais cumpridas.
Entretanto, percebi tarde demais que estava longe de acabar o martírio, os olhinhos escuros de Bruna piscaram para mim, ela não desistiria antes de conseguir o que queria. Simplesmente entrou no meu carro e deu um endereço.
─ Agora eu vou te transformar em um gato! – Disse divertida jogando um beijo para mim. Não posso negar, eu gosto do jeito dela.
─ Sou tão feio assim? – Perguntei me fingindo de contrariado, mas ela já sabia que eu iria para onde ela mandasse.
─ Até que não. – Levantou meu cabelo e me analisou. – Só não está ainda no nível de pegar Bruna "Delícia" Drummond. – Caímos na gargalhada com a cara sexy que ela fez para mim.
─ E quem disse que eu te quero? – Ironizei.
─ Meu filho, - ela tirou meus óculos – precisamos dar um jeito nisso aqui também. Porque se você é incapaz de perceber meus atributos, deve estar cego. Todos querem Bruna Drummond. Todos.
─ Já me disseram que quando a pessoa fala de si mesma na terceira pessoa é sinal de esquizofrenia. – Peguei meus óculos de volta e dei a partida no carro. - Você tem tido visões? Ouvido vozes? – Impliquei com o jeito estrela dela.
─ Kadu, faz um favor para nós dois: dirige.
─ Pois não. – Sorri de canto de olho para ela que retribuiu. – Bruna Drummond quer, Bruna Drummond consegue. Sou um simples servo dos seus caprichos.
─ Melhor que seja mesmo. Sempre.
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Por Onde Andei
Fiksi RemajaNo quarto volume da série Nando, pela primeira vez, temos a visão simultânea dos dois protagonistas: Bruna e Carlos Eduardo. Ela, atriz desde menina, não está acostumada a confiar nas pessoas. Resolve os seus problemas a sua maneira, nem sempre acer...