Capítulo Quarenta e Oito

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Cara...

Acho que se ele tivesse cuspido na minha cara, não teria me doído tanto quanto ter ouvido aquilo.

E isso me fez pensar quando havia sido a última vez que uma relação tinha me causado essa sensação de dor? Quando um gesto de alguma mina tinha me causado tanto incômodo?

Suspirei e tentei reorganizar a minha cabeça.

Não foi fácil.

— Nunca, moleque... — foi a primeira coisa que me veio. — Nunca. Eu nunca vou fazer nada pra te machucar. Pra te fazer mal? O que é isso? Eu... eu gosto demais de você. Na boa, eu... eu acho que nunca senti por outra pessoa o que eu sinto por você. Porra, eu... tudo o que eu menos quero é te zoar. Se eu fiz alguma merda, me perdoa... me xinga, me bate, manda eu ir tomar no cu, ir pra casa do caralho, qualquer coisa, mas... mas, porra... não fala um negócio desses, pedindo pra eu não te fazer mal com essa cara de medo que... que você me mata.

Calado, ele ficou me olhando de forma estática.

— Eu sei que eu sou meio estressado, grosseiro pra caralho, mas... mas eu não quero que você pense que eu saio batendo em todo mundo por qualquer coisa. Em você? Porra, moleque... você pode sentar a mão na minha cara que eu não vou revidar — continuei. — Aquele filho-da-puta? Meu irmão se tornou um nóia do caralho que só presta pra atormentar meus pais. Eu não falo muito sobre a minha família, porque eu já fico entulhando nós dois com a empresa e daí encher sua cabeça que já é cheia pra caramba com o seu serviço, sua faculdade... não, moleque. Eu tô aqui é pra te dar tranquilidade, é pra cuidar de você, não somar mais problemas. Então, eu evito...

— Não pensa desse jeito. Eu também quero te ajudar... eu quero te ajudar no que eu puder. Você pode desabafar comigo sobre os problemas. Eu acho que... que quando as pessoas estão juntas, é o que elas fazem, né?

— Mas eu não quero te trazer problemas e também fico numa vergonha da porra com o tipo de merda que acontece com a minha família — falei. — O dia que a casa dos meus pais foi assaltada? Foi o nóia do meu irmão que resolveu levar a tv pra pagar dívida de droga. Agora me diz se um verme que nem ele, que pode ter tudo o que quiser, de forma correta, direita, precisa roubar os próprios pais?

— Nossa, eu não fazia ideia... — ele disse, em tom de desculpa.

— E você podia fazer o mesmo comigo — resolvi trazer a questão. — De tentar desabafar dos seus problemas. Porque até da sua família você me fala pouco.

— Eu não tenho muito a falar sobre eles. O que tinha pra dizer, você já sabe.

Me agachei na frente dele e ergui sua cabeça pra que pudesse me olhar cara a cara. Eu tinha que aprender a fazer aquele moleque se sentir tranquilo comigo.

— Eu nunca levantaria a mão pra você, moleque — dei a minha palavra. — E se eu falo alto, às vezes, não é brigando com você. Eu realmente fico meio chateado que você me esconde essas coisas, como os problemas no serviço.

Ele assentiu.

— Quando eu falei que queria cuidar de você, eu não tava brincando. Moleque, isso pra mim é coisa séria. Eu jamais vou ficar em paz sabendo que tem alguém ou alguma coisa te atormentando. Principalmente eu. Então, seja o que for, sinta-se à vontade pra falar comigo. Você tem que me falar. Eu tô aqui pra te dar apoio em tudo... te defender, te proteger, corrigir as merdas que eu faço, mas mesmo tendo idade pra ser teu pai, eu sou muito cabaço pra relacionamento. O único exemplo de relacionamento que eu tive na minha vida são os meus pais e — dei risada, me recordando da adolescência —, quando eu era criança, eles quase não estavam em casa e quando fui crescendo, eu passava o tempo todo na rua e não tive essa vivência comigo.

DeclínioOnde histórias criam vida. Descubra agora