O moleque era pardo que nem o meu moleque, mas chega ficou amarelo ao me ver, com uma cara de mongo da porra segurando a sacola aberta.
— Mas também não o que? — Kalil questionou, sem entender.
— Tá falando de cigarro, moleque? — decidi tomar a frente da situação.
Como é que uma porra dessas me acontece assim? Não quis aceitar, embora eu soubesse comigo que tinha sido descuido meu. O Café tinha me falado com todas as letras que o moleque trampava junto com o Kalil e até tinha ficado cheio de si, dizendo que tinha os seus por perto do Kalil, pra saber os passos dele e eu simplesmente não liguei pra aquela merda. Se eu tivesse explicado isso primeiro pro Kalil, já ia bolar da gente se encontrar num lugar mais neutro, sem o pessoal dele por perto, lamentei comigo.
Agora, só me restava ser mais ligeiro e contornar o bagulho.
O foda é que eu nem sabia direito como fazer aquilo.
Ele confirmou com a cabeça e até tentou se recompor, fingindo que não tinha acontecido nada demais, mas não deu muito certo.
Resmunguei.
— Estranho. Não ter logo o light por aqui — comentei.
— É o que eu ia falar — Kalil endossou.
— Pode deixar que eu te devolvo o dinheiro que eu, que eu comprei, Kalil, porque eu pensei que; eu fiquei em choque de, ah, mano, eu achei melhor trazer algum do que não trazer, mas eu te devolvo o dinheiro que eu...
— Tá moscando, moleque? — Kalil riu, o interrompendo. — Depois eu passo em outro lugar e vejo. É só um maço de cigarro. Achou o resto?
— Achei, achei — ele respondeu depressa.
— É isso, então — Kalil foi se aproximando com ele e fui junto, tentando bolar na minha cabeça um jeito de lidar com aquela porra, mas como?
— É, Kalil, eu... — ele coçou a bochecha, ficando vermelho. Parecia até que ia vomitar. — Eu vou deixar a sacola aqui e... eu tenho que ir agora, porque, minha mulher tava, ela tava me ligando e sabe como mulher é, que minha filha... vixi, sei lá, parece que tem que comprar leite e ela não tem com quem deixar a menina e...
— Não, beleza, pode ir lá, moleque — chegamos até ele e Kalil estendeu a mão pra pegar a sacola.
— Só deixa a minha chave aí antes de ir, pô — inventei na hora.
— Desculpa? A sua chave? — ele gaguejou, confuso.
— É, pô. Tá com você. Só deixa ela aí, que senão eu que não consigo ir embora depois — e dei risada, olhando pro Kalil que apertou os olhos pra mim, sem entender.
— Eu acho que eu... não, mano, não peguei a sua chave não.
— Como não, moleque? — falei num tom brincalhão. — O bagulho tava na sua mão antes de você sair pra comprar as coisas do Kalil aí.
Ele balançou a cabeça debilmente, mas nem conseguiu responder.
O próprio Kalil me olhou como se fosse retrucar: "mas você nem tava aqui quando o moleque saiu pra comprar minhas coisas", mas algo nos meus olhos o fez não falar. A parte boa da minha tentativa de meter o louco ali era o fato de que o Kalil era ligeiro que só a porra. Ele podia não saber o que tava acontecendo e ainda não ser capaz de ler pensamentos, mas ele seria esperto o suficiente pra entender que tinha coisa errada e iria na minha deixa.
Não me enganei, porque ele se virou pro moleque e falou:
— Entra aqui na minha sala pra você procurar a chave dele.
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Declínio
Mystère / Thriller"Eu queria devorar esse moleque. Me sentia plenamente capaz de passar a noite inteira traçando ele, até meu pau esfolar. Meu peito tava agoniado. Em parte, eu queria respeitar ele, cuidar do moleque porque ele merecia demais essa atenção. E, em par...