Era só uma caixa.
Não.
Era mais do que apenas uma caixa.
E com ela nas mãos do entregador, eu vi nos olhos dele e, pela primeira vez, mano... pela primeira vez, eu pude assimilar de verdade o peso daquela realidade. Porque, até então, eu meramente entendia tudo aquilo de uma forma técnica, cara, sabe? Técnica, teórica. E só essa primeira concepção teórica tinha sido capaz de passar por cima de mim feito um trator, me destroçando.
Tá ligado naqueles momentos em que sua cabeça parece se esvaziar por completo?
Eu mesmo senti como se tivesse parado de respirar por alguns instantes.
Antes que pudesse ter a devida noção das coisas, eu já tava avançando na direção do maluco a passos largos.
— Qual foi a fita, irmão?! — por muito pouco eu não dei um empurrão nele, mas não me impedi de tomar a caixa das mãos dele com tudo.
Assustado, ele recuou e eu avancei na direção dele.
O maluco era um pouco mais alto que o moleque, o que o tornava muito mais baixo que eu. Bastou eu inclinar minha cabeça pra intimidá-lo que ele foi retrocedendo, olhando de mim pro Gabriel.
— Tá olhando de um pra outro por que, caralho?! — continuei avançando. — Perdeu a língua, porra?! Responde o que eu tô perguntando.
— Ei, ei, Alexandre! — puxando minha camiseta com tudo, o moleque me forçou a parar. — Que loucura é essa? O quê que você tá fazendo?!
— Eu... eu não fiz nada, cara — o maluco explicou, a voz trêmula. — Eu sou só o entregador.
— E quem te mandou trazer essa porra?!
— Para, Alexandre! — gritou Gabriel, quase ao ponto de me bater. — Olha a caixa! — com tudo, ele tomou das minhas mãos e a ergueu pra que eu pudesse ver. — É só uma caixa da Amazon! São os livros que eu comprei esses dias, lembra?
Feito uma porrada, as imagens minhas atravessando o deck ao redor da piscina até o outro lado da área, aonde ele tava mexendo no celular e vendo os livros; lembro que eu tinha ido até ele com o cu na mão, atingiram minha cabeça e eu parei. Eu parei.
A gente trampava com a Amazon ocasionalmente, me lembrei. Aquele mano podia muito bem ser um dos meus funcionários, fiquei pensando conforme olhava a logo da empresa na caixa, aquela seta curvada que simulava um sorriso.
Que vexame, maluco.
Cocei a testa e não soube nem como me expressar, muito menos para qual dos dois olhar.
— Desculpa, irmão — pedi pro entregador. — Desculpa mesmo, cara. Eu me confundi e...
Engolindo em seco e falhando ao tentar sorrir, ele me disse:
— Sem problemas, chefe. Acontece.
Uma porra que acontece, me limitei a pensar.
— Um bom dia pra vocês — rapidamente, ele se virou e voltou pra van.
Eu sentia que o moleque tava me encarando, ali do meu lado, à espera de uma resposta, mas me vi como um cuzão de merda sem a devida coragem pra me virar e ter certeza; então, continuei olhando o entregador ir embora.
— O que foi tudo isso? — ele finalmente decidiu me perguntar.
— Nada, eu só... eu só fiquei meio estressado, tem algumas coisas na empresa e... — porra, mano, eu tava parecendo tão otário falando tudo aquilo; tão cuzão.
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Declínio
Детектив / Триллер"Eu queria devorar esse moleque. Me sentia plenamente capaz de passar a noite inteira traçando ele, até meu pau esfolar. Meu peito tava agoniado. Em parte, eu queria respeitar ele, cuidar do moleque porque ele merecia demais essa atenção. E, em par...