Capítulo Cento e Trinta e Oito

988 92 51
                                    

Mas que porra...?

Eu tinha ficado tão perturbado com o que a Maira me falou do Gabriel que eu simplesmente não me dei conta que aquele moleque que tava agachado ao lado do pneu traseiro não tinha, absolutamente, nada a ver com o Rodrigo.

Era bem mais baixo, tinha pele morena.

Joguei o cigarro pro lado e apertei o passo, cruzando a rua.

— Que porra você tá fazendo aí, moleque? — questionei, parando atrás dele.

E rápido feito um raio.

O moleque nem falou nada, apenas se levantou e disparou num pinote pra frente.

Caralho...

Cada passo meu dava uns dois do dele, só que eu não era nenhum Usain Bolt pra pegar um moleque magrinho feito aquele numa corrida reta como a que nos encontramos, mas eu não desisti.

No primeiro cruzamento, o arrombado cortou pra direita e avançou na direção de um terreno baldio que se estendia em diagonal pelo resto do quarteirão, até parar numa quadra de futebol que era toda gradeada, só que próximo ao gol nos fundos, tinha uma muretinha que separava a quadra do terreno baldio seguinte que ia pra muito além da Vargo.

Filho-da-puta, eu não vou conseguir pegar ele, me dei conta, já sentindo meus pulmões queimarem.

Só que aí, do outro lado da quadra, me surge o Rodrigo, correndo na nossa direção.

Mais ligeiro do que eu podia esperar, meu irmão não resolveu nos seguir, mas sim ir pelo outro lado do Botega, pra nos encontrar na ponta do quarteirão.

Reparando que o Rodrigo também tava atrás dele, no desespero, ele se virou na minha direção e tentou me dar um olé, mas embora eu estivesse fora de forma, não era pra tanto, porque consegui derrubá-lo facinho no centro da quadra.

— Perdeu, ladrão — dei risada, ainda resfolegando, enquanto me ajoelhava pra mantê-lo no chão. Enfiei a mão no bolso, achei a chave e joguei pro Rodrigo. — Traz o carro lá.

— Eu?

— É, porra. Rápido, pra não chamar a atenção nessa merda.

Ele correu e só então pude reparar em como o moleque era novo; devia ter uns dezesseis anos, no máximo.

— Vai responder a pergunta agora, caralho? — falei pra ele. — Que porra que você tava fazendo no meu carro?

— Não tava fazendo nada, senhor, eu...

— Senhor é a minha pica, moleque — o interrompi. — Vai meter o louco na puta que te pariu que se você acha que eu vou aliviar pro teu lado, já começa a chorar, que eu não vou ter pena não.

— Mas eu tô falando sério, senhor, eu...

E o calei com um murrão nas costas que chega o fez tossir.

— Ah, tá falando sério, então — debochei, o virando com tudo pra que ele pudesse me encarar. Me abaixei e apontei o dedo na fuça dele, minha cara a centímetros da dele, e falei: — então fala aqui na minha cara, porra. Fala aqui que você não tava fazendo nada lá, que eu quero ver no teu olho se você tá mentindo ou não. Anda, porra! Fala!

Ele não falou.

Apenas me encarou, o queixo tremendo.

Olhando ele assim de perto, o moleque me parecia ainda mais novo. Se não fosse naquelas circunstâncias, eu diria que ele tinha uns quatorze, mas algo nos olhos dele me sugeriu que ele realmente tava beirando os dezessete. É difícil de explicar, mas a molecada da quebrada, mais inclinada ao trecho, tem um certo ar endurecido nos olhos.

DeclínioOnde histórias criam vida. Descubra agora