A impotência não é uma escolha também
De assumir a própria responsabilidade, hein?
Marcelo D2 - Desabafo
— Sessenta conto — declarei, observando atentamente sua reação.
Bastante surpreso, Robson repetiu:
— Sessenta conto... caraca. Vou ter que matar quem?
Ele disse aquilo rindo, mas eu mantive minha expressão séria.
— Um velho aí — explanei.
Logo o sorriso dele morreu. A gente tava encostado a uma mureta já fazia alguns minutos, quando finalmente decidi tocar no assunto. Robson praticamente nem se mexeu aquele tempo todo, a não ser pra tirar e colocar a lata de Skol de cima da mureta. Mas agora parecia que a superfície de concreto se tornou imediatamente desconfortável, pois ele ficou se remexendo, como se buscasse uma posição boa pra encostar.
O pancadão rolava solto um pouco mais abaixo da rua, mas eu resolvi não falar alto. Era uma muvuca do caralho, com as novinhas descendo pra cima e pra baixo e a molecada enchendo o saco dos vizinhos com um sem fim de motos sem escapamento. Robson preferiu prestar atenção em tudo aquilo e não mais a mim.
Eu não esperava uma reação do tipo.
Mas também não me prestei ao trabalho de insistir no assunto. Se fosse desse modo que ele queria, eu deixaria o assunto morrer numa boa.
— Tipo... mas matar, matar mesmo? — ele retornou, me olhando brevemente.
— Então... eu fiquei remoendo essa fita um bom tempo, tá ligado. Pensando aí em outras ideias, outras alternativas, outras maneiras de conseguir resolver esse assunto de um jeito que ficasse bom pra mim sem que eu tivesse de chegar nesse extremo de dar fim no velho. Mas não bateu, cara. Não consegui encontrar um denominador comum que me permitisse ficar numa boa e ainda assim manter o velho vivo.
Robson bebeu o que tinha na lata de uma só vez. Não podia garantir, mas que tinha mais da metade da lata, tinha.
Ele a deixou no chão, a achatando com um pisão e só então dando uma bicuda que mandou a lata pro meio da rua.
— Isso tem a ver com esse negócio que você fechou com aquele boyzinho lá? — ele perguntou, sem me olhar.
— Tem.
— Então, esse velho tem dinheiro....
— É esse o ponto chave dessa história, meu bom. O dinheiro que ele tem. Que na verdade, ele nem deveria ter...
— É isso, então? Só vingança?
— Antes fosse — eu ri, me virando pra observar o fluxo de pessoas lá embaixo ao entorno dos carros de som. — Que daí eu só daria um sacode nesse velho do caralho, que tava bom. O que talvez eu vá fazer de qualquer maneira.
— Sessenta conto... — ele repetiu, acho que não para mim. — Então é isso, grandão. Vamo' resolver essa merda logo.
— Não quer nem saber os detalhes?
— Pra mim já tá claro que nem a luz. Um seis, quatro zeros e toda a nossa amizade de anos... pra quê mais detalhes, hein?
Num primeiro momento, Ademir até sorria, mas bastou correr um olhar de Robson pra mim que o gesto deu lugar a vergonha de quem sabia que devia ter batido antes de entrar.
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Declínio
Mystery / Thriller"Eu queria devorar esse moleque. Me sentia plenamente capaz de passar a noite inteira traçando ele, até meu pau esfolar. Meu peito tava agoniado. Em parte, eu queria respeitar ele, cuidar do moleque porque ele merecia demais essa atenção. E, em par...