Capítulo Cento e Quarenta e Três

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Nos encaramos por poucos segundos.

Eu nem tinha como afirmar se o moleque tava irritado, surpreso ou sei lá o que com a cena. Ele ficou me olhando apenas, uma expressão que me fazia pensar em mil coisas.

Por que eu tinha feito aquilo, mano?

Por que eu me deixei levar só porque esse sobrinho do Baja era parecido com o meu moleque? Que porra que eu esperava conseguir? Aliviar um pouco a agonia que eu sentia dentro de mim me pegando com um moleque que eu nem conhecia direito, só pra alimentar a fantasia de estar perto do Gabriel de novo? Eu teria a coragem de tentar comer aquele moleque, fingindo que ele era o Gabriel? Porra, que merda que eu tava fazendo, mano...?

E eu tinha visto a prima dele. Eu tinha pensado que o moleque podia tá por ali. Isso tinha passado pela minha cabeça... e mesmo que não fosse isso, mano, eu não devia me envolver com ninguém. Eu não tinha nada que ter feito aquilo, porra!

Só sei que o Gabriel continuou a me olhar, inexpressivo, por mais alguns momentos e se virou, indo embora.

Minha primeira reação foi me levantar e correr atrás dele.

— Gabriel, espera! — pedi, já atravessando a entrada do bar e correndo pra rua.

O moleque apertou o passo, mas sem chegar a correr, o que me permitiu alcançá-lo.

— Peraí, Gabriel! — pedi mais uma vez, segurando o ombro dele. — Me escuta...

Quando pude encará-lo, vi que ele tava chorando.

Que merda.

— Me perdoa, meu moleque, eu... aquilo ali, eu... — que desespero da porra que me laçou naquele momento, irmão. Sabia nem como explicar. — Eu não devia ter feito aquilo, eu fiz merda, eu sei... eu prometi pra você que eu jamais iria te trair, e aí eu fui... me perdoa, meu moleque. Por favor, me perdoa e...

— Você não tem que me pedir perdão de nada, Alexandre — ele falou, secando o rosto com as mãos. — A gente tá separado...

— Mas eu te amo ainda.

— Então, por que...? Ah, olha, isso aqui... afe, que vergonha. Eu devia tomar jeito e criar vergonha na cara, porque... eu que fui embora e aí vou chorar porque te vi beijando outra pessoa e...?

— Não, não, não — fui falando, balançando a cabeça. — Eu fiz merda, moleque! Eu admito isso. Eu não devia ter me envolvido com ninguém, eu fui um filho-da-puta. Eu só me deixei levar porque... porra, ele me lembra você e aí...

— Isso fica cada vez pior — ele murmurou, revirando os olhos. Até tentou ir embora, mas o segurei pelo braço.

— Por favor, fala comigo — implorei, ainda segurando o braço dele. — Nem que seja pra me mandar pra puta que pariu ou descontar sua raiva em mim, mas fala comigo.

— Falar o que, Alexandre? Que eu tô fazendo papel de otário aqui chorando porque te vi com outro cara? Eu que fui embora da sua casa, falei que não queria saber mais de você; eu ia esperar o que? Que você morresse sozinho sem nunca mais se envolver com ninguém? No fundo, eu... é bom, né? É o natural, é o certo... eu fico feliz de, apesar de tudo, ver que você tá conseguindo seguir em frente com a sua vida e...

— Mas eu não tô — o interrompi. — Eu não tô conseguindo seguir em frente. Eu não devia ter beijado esse moleque e só fiz essa merda porque ele me lembrou você e eu não tava aguentando mais só bater punheta lembrando de você comigo e...

Ele me olhou horrorizado, com a boca aberta.

— Meu Deus, mas... gente, você não muda — e por um instante, pareceu que ele ia rir.

DeclínioOnde histórias criam vida. Descubra agora