Capítulo Oitenta e Seis

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Ele...

Ele deu um jeito de me segurar com uma só mão por alguns segundos e baixou a cueca com a outra... ele tava com o pau duro mesmo e aquilo me quebrou... mano, ele ia... por que tudo aquilo tava acontecendo? Eu sei que tinha feito merda, que desgracei a vida do meu amigo, mas eu juro... eu juro por tudo o que é mais sagrado que eu não queria ter matado o David. Eu gostava demais dele, gostava mais do que dos meus irmãos. Nunca que eu teria feito aquela maldade com ele por querer. Nunca.

— Osvaldo? — uma voz veio do lado de fora da sala e o monitor parou.

Eu ia gritar, pedindo ajuda, mas ele foi mais rápido e desceu mais um soco no meu saco, ainda que mais leve do que o anterior, não foi nem de perto fraco o bastante pra não doer. E apontando o dedo na minha cara, com a mão tapando a minha boca, me alertou:

— É pra ficar calado, seu moleque do caralho. Se gritar, abrir a boca... de hoje você não passa, tá me entendendo?

Confirmei com a cabeça, desesperado por qualquer chance de escapar daquilo.

— O que foi, porra? — perguntou pro cara que tinha chamado lá fora.

— Ah, você tá aí. O José tá te procurando, parece que teve uma confusão lá no corredor, num dos dormitórios.

— Beleza, já tô indo.

Ele esperou o cara se afastar pra poder subir a cueca e a calça e sem falar mais nada, deu um jeito de me arrastar de volta pro dormitório e me largou lá. Eu me senti esquisito pra caralho quando me vi de pé, no meio do quarto, perto das beliches, enquanto a luz fraca que vinha lá daqueles postes enormes no pátio clareava parte do meu rosto. Dava pra ouvir os monitores falando pelos corredores e passando de lá pra cá. O monitor que tinha me salvado sem saber disso, falou sobre uma confusão, num tom que me deu a entender que eles tinham que fazer alguma coisa a respeito, mas não passou um só monitor por ali, perto do nosso dormitório. Nenhum filho-da-puta.

E eu continuei de pé, me sentindo perdido... desorientado.

Eu ainda sentia a dor das porradas que aquele maldito tinha me dado. Por que tudo aquilo, mano? O cara dava dois de mim, já era homem mesmo e queria me... minha cabeça nem conseguia pensar naquilo. Não dava.

E mais do que perdido e desorientado, eu me senti sozinho.

Sozinho, porque, ainda que os meus "colegas" de quarto estivessem deitados ali e eu tinha reparado que um e outro tinha me lançado um olhar por debaixo das cobertas, era como se não estivessem ali. Me viram levando um cacete da porra, me viram sendo arrastado pra fora e pra dentro por aquele monitor do caralho, mas eu já sabia que se alguém viesse perguntar pra eles qualquer coisa sobre isso, iam falar que não tinham visto nada.

Eu não tinha ninguém por mim ali dentro.

Tinha o Torquato, mas... até uns dias atrás, eu tinha aquela esperança de que ele fosse correr por mim, mas ele era só um, mano. Ainda que os moleques não mexessem com ele por causa daquele papo sobre Comando que ele tinha falado comigo, eu acho que mesmo isso não seria o bastante pra ele conseguir garantir que não mexessem comigo também. Mas, sei lá, mano...

Eu já não sabia mais de porra nenhuma...

Eu pensei que, depois dessa merda toda, não conseguiria dormir, mas consegui e, me dando um alívio, Deus foi bom o bastante pra não me deixar sonhar.

No dia seguinte, foi como se nada tivesse acontecido.

Eu ainda não trocava muita ideia com os outros moleques que não fosse com o Torquato, mas a gente vivia num ócio desgraçado lá dentro, então, qualquer besteirinha que acontecesse, virava sempre assunto que a molecada só faltava gritar uns pros outros e eu acabava me inteirando de tabela. Dessa vez, nenhum comentário.

DeclínioOnde histórias criam vida. Descubra agora