"Eu estava chateado com o ato de Júlia"

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O vazio. Não era a primeira vez que eu me sentia assim, eu já senti tal coisa tantas vezes! Quando você tem pais que se destacam na sociedade pelos seus status, pela sua riqueza, acostuma se com a solidão.

Minha irmã e eu fomos criados por empregados. Termos um ao outro ajudou a conter um pouco a solidão. Então tudo foi tirado de mim. Meu pai se foi, ocupado demais com seu trabalho e mulheres promiscuas; minha mãe morreu de tristeza; Ana Júlia encontrou Pedro e agora tinha sua própria família.

Eu não tinha ninguém. Culpar os outros pela minha condição de solitário é fácil, muito facil. Admito que a culpa seja minha, eu procurei por isso.

“Teria sido muito melhor casar com a Kate. Foi um erro me casar com a Júlia, mas como eu poderia saber que ela seria um peso?”.

Eu me perguntei se aquilo iria durar. Se eu já estava uma pilha com a abrupta mudança de Júlia Franco, ocorrido há poucos dias, então como seria daqui a algum tempo? Eu ainda teria que esperar durante um ano e desse tempo só dois meses e alguns dias se passou.

"Ou talvez eu deva fazê-la pedir o divórcio, mas se até agora ela não pediu por que pediria se eu tomasse uma atitude?”.

Ela não havia chegado. A pouca tranquilidade
que consegui reunir durante o dia desapareceu
com essa descoberta. Felizmente Magdalena e sua filha não haviam ido trabalhar, domingo era o dia de folga, e isso ajudou.

Agora eu poderia mostrar minha irritação sem me preocupar com os olhares. O que estava acontecendo com a Júlia? Mas que Porra! Por que essa mudança? Se ela tivesse descoberto algo do contrato, ela jogaria na minha cara. O que eu poderia fazer para ter a Júlia apagada, aquela que não me causava preocupações?

Tomei um longo banho, vesti roupas confortáveis, tentei trabalhar em casa. Consegui fazer algumas bobagens do trabalho, mas à medida que os minutos se passavam minha impaciência impedia me de pensar ou fazer qualquer coisa. Acabei indo para a sala, sentar no sofá na penumbra da sala, enquanto esperava por ela. Como eu a encontraria? Bêbada? Drogada? Com marcas de chupões no pescoço?

Não demorou mais de vinte minutos. Ela entrou timidamente, esforçando-se para não fazer barulho. Nao se incomodou em acender as luzes na certa não querendo chamar a atenção para si. Eu acendi a luz do abajur para que ela me visse.

A mesma pareceu se assustar quando me viu. Então sua expressão facial foi mudando até ser uma expressão nula. Aquilo me enervou. Até quando ela continuaria a agir daquela forma desmedida? Senti seus olhos castanhos analisando-me e então se manifestou.

- Está aqui em pleno domingo? Testemunhei um milagre! - falou num tom debochado.

De fato antes dela mudar eu costumava passar o domingo inteiro fora. Júlia me ignorou e passou a caminhar em direção ao corredor.

- Espero que essa prática de noitadas suas não comprometa seu desempenho na empresa. Eu não gostaria de tomar alguma atitude caso isso ocorra. - disse. Incapaz de conter a irritação que grasnava em mim.

- Atitude? Ora não seria difícil para você me demitir, não é? Demita me se eu faltar com a empresa. Eu não me importo. Mas devo alertá lo que isso não vai acontecer. - deu mais um passo para se refugiar em seu quarto. Eu não iria deixá la escapar não depois de me fazer de palhaço! Eu a segurei pelo braço. Ela não esperava pelo meu ato, deu para perceber. - Solte-me. - pediu calma, mas sua respiração e pulsação aceleradas a denunciavam.

- Se você me trair, e isto cair na boca da imprensa, você terá de sofrer as consequências. falei. - Era a única desculpa que havia pensado para explicar minha atitude, mas eu sabia que era outra coisa que me motivava, algo indefinido para mim. O que ganhei com minha atitude? Júlia gargalhou com vontade.

- Sofrer as consequências? E quais seriam essas consequências, João Pedro Mota? Vai me demitir? Ótimo, faça isso. Eu tenho competência suficiente para encontrar outro emprego. Vai aparecer por aí com suas vadias para me atingir? Faça isso, eu tô pouco me lixando! - aproximou se de mim de um jeito provocativo. aleo que iamais havia feito até então. - Vai me pedir divórcio? Faça isso. Se você está tão louco para se livrar de mim já deveria tê-lo feito. - ela se afastou e em momento algum olhou para trás.

Ela me deu a única alternativa que eu não poderia ter: divórcio. Se eu pedisse algo assim antes de um ano eu perderia tudo o que consegui. Estava fora de cogitação pedir o divórcio.

"Seria tão mais fácil se eu não me importasse com o que ela anda fazendo, mas...”.

Novamente fiquei a especular o motivo desta mudança. Nada me ocorria, muito embora os motivos estivessem diante de mim.

“Talvez esteja usando drogas...”.

Era estúpido, eu sabia, mas após esperar alguns minutos caminhando para lá e para cá eu fui para o quarto de Júlia. Ela nao estava à vista, tomando banho, então aproveitei para vasculhar as suas coisas enquanto estava ocupada. Eu procurei nos mais variados compartimentos do quarto tentando ser rápido e silencioso. Não encontrei maconha, cocaína, anfetamina, crack nem nada similar.

"Talvez eu esteja exagerando..." pensei.

Mais uma rápida olhada e notei um brilho dourado no chao. Curioso, eu me aproximei e catei o objeto do chão.

Era a aliança de casamento que eu havia dado
para ela. Não acreditava que ela tivesse perdido, provavelmente jogou fora. Fiquei olhando aquele aro dourado por alguns minutos tentando entender por que eu estava chateado com o ato de Júlia e foi nesse momento que notei que a porta do banheiro dela estava escancarada.

Olhei rapidamente, quase que por reflexo, para lá e eu a vi. Estava de costas para mim, ocupada com o seu banho, imersa em qualquer outra coisa. Pude ver através do Box de vidro seu corpo com uma nitidez impressionante.

Eu não sabia o que dizer ou o que pensar; eu estava abismado, confuso. Eu nunca imaginei que, por detrás daqueles moletons grandes e calças largas, existia um corpo tão bonito, tão convidativo ao toque. Claro que eu já havia visto ela com roupas diminutas, inclusive a vi de lingerie, mas nunca nua.

Eu queria tanto...

Refreei o pensamento antes que ele viesse. Saí rapidamente do quarto e me refugiei em meu próprio aposento. Estava bestificado com a imagem de Júlia Franco e com o pensamento que quase exteriorizei. Eu devia estar louco!

Manhã de segunda feira. Eu estava... Um caco. Não havia dormido bem. Ainda sim levantei cedo, tratei de me arrumar. Magdalena e sua filha já estavam em casa. Tomei meu café alheio a tudo tentando controlar a confusão que sentia.

Eu nao estava sendo mais racional com Júlia e isso me assustava. Talvez eu devesse ficar fora de casa, pensei. Alugar um espaço e dormir lá algumas noites. Mas eu não queria isso, apenas admitia que fosse o melhor pra mim. O que eu faria? Após o café segui para o estacionamento pegando meu carro.

Eu queria entendê-la, mas para isso eu precisava de um pouco mais de proximidade. Talvez fosse um erro, mas era o que eu faria.

Estacionei em frente ao meu condomínio. A aliança que Júlia jogou fora estava guardada no bolso interno do meu paletó. Ela não demorou a sair, estava diferente. As roupas que vestia, com um toque de ousadia, lembraram um pouco as vestes de Kate. Aquilo me enervou. Por que estava usando estas roupas provocativas? Queria me enfurecer? Ela me notou e olhou me espantada.

- Entra. Vou lhe dar uma carona. - disse. Nem eu sabia o que eu estava fazendo. Ela bufou.

- Quem disse que vou com você? Prefiro ir na roda do ônibus lotado! - falou seguindo para a parada.

Admito, se tinha uma coisa que eu odiava era perder. Eu não iria perder, não sem antes lutar.

- O que? Agora vou ter que pagá la para que aceite uma simples carona? - perguntei. Júlia parou. Isso era bom.

- É. Pague-me bem e posso reconsiderar. - cruzou os braços em frente ao corpo esperando. Sorri. Retirei meu talão de cheques que sempre estava no bolso intemo do meu paletó e encostei me ao carro para assiná - lo.

"The contract" Adaptação MojuOnde histórias criam vida. Descubra agora