"Coisas quebradas por todo o chão"

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Maratona = (12/15)

- Se eu estiver muito rápido basta beliscar a minha bunda. - ele gritou divertido.

- Há há! - ri num tom de zombaria. - Não espere nada da minha parte!

Num tom de diversão, algo que até então parecia não estar presente na minha vida, seguimos para o cinema mais próximo. Leo queria que víssemos um filme romântico, mas eu logo cortei essa alternativa.

-Eu quero um filme com sangue! - disse.

Tem certeza? - ele perguntou em dúvida.

- Absoluta! - falei entrando na fila para assistir a um filme de ação. Então ele não me contestou.

Poderia parecer estranho, mas estive com a sensação, o tempo todo em que estive na fila para a compra de ingressos, de que eu estava sendo observada. Procurei ignorar tal sensação e me concentrar apenas no que estava fazendo. Enquanto estávamos na fila dos ingressos, quando fomos comprar pipoca e refrigerante e quando entramos na sala, Leonardo e eu conversamos. Ele me falou sobre ele e sua função de design gráfico, dos prêmios que ganhou, sua família e amigos.

O fato de que chegamos mais cedo do que o horário de exibição do filme nos deu tempo para um bate-papo.

Descobri que Leo e eu tínhamos coisas em comum. Ele havia perdido a mãe e eu perdi meus pais. O garoto lutou para ser alguém, nunca dependeu de ninguém para tal, assim como eu. Morava sozinho como eu. E não parava por aí, alguns gostos com músicas, filmes, livros eram semelhantes, se não os mesmos.

O filme começa. Era um filme de ação que se resumia a tiros, explosões, xingamento e socos. Ótimo! Comemos e comentamos sobre o filme de forma bem humorada.

- Olha só esse sangue! Até o ketchup caseiro do meu tio Harry é melhor que isso! - Leo disse enquanto pegava uma porção de pipoca e enfiava na boca. Eu tomava refrigerante.

- Pior sao estes golpes de karate. Até parece que alguém criado no gueto iria saber essas técnicas vendo filmes japoneses! - falei aos risos.

Eu não me lembrava de me divertir tanto, ainda mais com alguém que eu não conhecia direito. Eu me perguntei enquanto conversava com Leonardo como era possível eu me dar tão bem com ele. Deduzi que deveria ser por que éramos parecidos, nossas histórias de vida eram parecidas.

...

- Sã e salva em casa. - disse quando estacionou a moto em frente ao meu condomínio. Rapidamente desci devolvendo o capacete.

- Obrigada pela noite. Foi ótima. Estava precisando me divertir um pouco. - confessei.

- Eu também adorei a noite. Poderíamos repeti la. - disse sorridente.

- Basta marcar o dia e pensamos no que poderemos fazer como entretenimento.

- Então eu ligarei para você quando voltar de viagem. Tenho que ir a uma convenção. Eu não gostaria de ir, mas vai ajudar a ganhar uns contatos importantes, sabe como é que é.

- Eu sei e recomendo que vá.

- E mais uma vez peço perdao por aquela noite. Disse o que não devia. - murmurou.

- Imagine! Você disse somente a verdade. Vamos deixar aquele acontecimento infeliz de lado. Boa viagem. Até o próximo encontro.

Leonardo logo partiu. Fiquei em frente ao prédio até ele sumir de vista. Eu estava
sorrindo, um sorriso espontâneo. Mas foi só
me virar para meu sorriso esmaecer. Olhei sombriamente o "meu lar" (sim, eu estava
ironizando) e entrei.

Cumprimentei os funcionários que encontrei no Hall, algo corriqueiro. Olhei meu relógio e deduzi que eu havia chegado mais cedo do que previa.

"Deveria ter ido para algum outro lugar com Léo ao invés de voltar para cá. Talvez eu tenha sorte, talvez João Pedro tenha saído para algum divertimento com mulheres e bebida. É bem a cara dele!" rangi os dentes com tal pensamento.

O pior de enegrecer meu humor era sentir que por detrás de muitos dos meus pensamentos ainda regia o ciúme.

Eu não deveria sentir ciúmes de Mota, deveria sentir apenas ódio por tudo o que ele me fez. Não era assim. Eu o amei por tanto tempo, mesmo quando fui maltratada, que não conseguia simplesmente extrair o sentimento. Era esse o maior motivo de minha raiva, não dele, mas de mim.

Entrei silenciosa no apartamento, ninguém a
vista. Ainda que eu encontrasse alguém não teria problema algum, eu era dona de mim. Fui para meu quarto, mas não cheguei a entrar. Notei que a porta do quarto de João Pedro estava entreaberta. Tentei passar e não olhar, mas não consegui evitar.

O local estava precariamente iluminado, mas pude ver a destruição; coisas quebradas por todo o chão. Assustei me. Será que o apartamento tinha sido arrombado? Abri a porta sem pensar e olhei por todo o quarto. Eu o vi sentado em um canto escuro, levantou a cabeça quando ouviu o barulho na porta.

- O que diabos você fez? - murmurei olhando para todos os lados, nada em seu quarto estava intacto. Não havia dúvidas de que o próprio destruiu tudo.

Ele não respondeu. Fechou os olhos e abaixou a cabeça. Notei que segurava uma mão, o sangue era visível de onde eu estava. Eu sabia o que deveria fazer, eu deveria deixá lo sozinho, mas...

Meus pés moveram se sem meu consentimento
em direção a ele pisando em cacos de vidro e outras coisas mais. Ele estava tão absorvo que nem percebeu que eu estava em frente a ele. Agachei me em frente a ele. Quando eu peguei a sua mão o mesmo reagiu. Voltou se para mim, seus olhos mostrando surpresa.

- Não me diga que agora o seu hobby é curtir drogas? - comentei enquanto virava sua mão avaliando o ferimento. Tentei imprimir um tom debochado, mas não consegui. Estava claro que eu estava preocupada. - Sinceramente você só faz besteira! - eu me levantei e virei me para a saída. - Vamos cuidar desse ferimento. - continuei.

Eu não acreditei que João Pedro me seguiria, mas ele o fez. Fui para o seu luxuoso banheiro e bem como eu previa encontrei uma caixa de primeiros socorros.

- Senta no vaso. - ordenei. Não ousei olhá lo. Pelo canto do olho vi que ele acatou a minha ordem. Peguei uma cadeira e sentei de frente para ele.

Em silêncio cuidei do seu ferimento, felizmente não era profundo. Eu não ousava encará-lo, João Pedro veria que eu não sou essa fortaleza toda, ele veria que ainda conservo a Júlia fraca de antigamente.

- Não precisa fazer isso por mim, mesmo. - ele murmurou.

- Não é nada. Isso eu faria por qualquer um, até por alguém que eu odeio. - falei amarga. Ouvi a respiração de Josh parar num arquejo.

Procurei ser rápida em preparar o curativo e quando o terminei sai sem dizer nada. Procurei
me refugiar em meu quarto e me joguei em minha cama. A sensaçao de tocá - lo, após tanto tempo, despertou um choque em meu corpo. Isso deveria ter desaparecido enquanto meu amor por ele era substituído pelo rancor.

Mas aqui estava eu sentindo em meu íntimo aquele calor por ter tocado nele.

"Não posso sentir isso! Não posso!" ordenei ao meu coração enquanto jogava me na cama. Eu iria lutar contra ele e contra o sentimento que ainda resistia.

"The contract" Adaptação MojuOnde histórias criam vida. Descubra agora