"Minha mente estava longe"

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- Não precisa se prestar a isso. Eu posso muito bem...

- Eu vou com você, querendo ou não. - disse ríspido.

Eu seria uma praga na vida dela, incapaz de ela se livrar de mim. Eu não iria perder, eu não poderia perder!

Malas prontas e provavelmente postas no meu carro por Pedro. Júlia impaciente esperando por mim dentro do carro. Ainda sim, eu não me movi. Continuei parado olhando o lago artificial pela sacada da sala de visitas. Claro que alguém viria me chamar. Ana Júlia se incumbiu da tarefa.

- O que você está fazendo? Júlia está esperando por você! - disse irritada. Eu não a olhei.

- Não posso ir. - murmurei. Ana colocou a mão no meu ombro.

- Como assim não pode? Disse que a levaria e... - a mesma se calou ao ver o meu rosto quando virei para ela.

- Ana, eu preciso de sua ajuda. - pedi com a voz TRÊMULA. - Preciso manter Júlia aqui e...

- Não posso te ajudar. - ela disse indiferente. Eu fiquei desesperado.

- É CLARO QUE VOCÊ PODE ME AJUDAR! MALDIÇÃO ANA JULIA! EU...  - ela pôs um dedo nos meus lábios.

- João Pedro, eu já fiz a maior das concessões não contando nada a Júlia. E eu sabia que você teria uma conduta ruim com ela. Eu não vou mais ajudá lo, por que você não merece minha ajuda. - retirei o dedo dela da minha boca.

- Você não entende. - disse em uma voz desesperada. - Eu vou perdê-la. - e a constatação doía, como ácido nas veias. Júlia, Júlia, minha Júlia. Perdida...

- Se Júlia não o amasse, ela não teria dormido com você. Fique tranquilo. - Ana disse. Eu a olhei, ela sorria. Suas palavras amainaram um pouco a minha dor, mas não o bastante para que eu me movesse.

- E se ela escolher o outro? O que eu faço?
- a voz saia arrastada e meus olhos ardiam. Um prelúdio para o choro. Eu só chorei no enterro de minha mãe. Fazia tanto tempo! Não, eu não poderia chorar. Chorar seria muito humilhante e não adiantaria de nada.

- Você a ama? - ela perguntou.

- Muito. - disse com um fervor poderoso.

- Então se a Júlia quiser deixá-lo, você deve deixá-la ir.

Claro que Ana Júlia tinha razão. Eu deveria deixá-la ir. Mas eu era tão egoísta agora, deixaria o altruísmo para Gandhi, Buda e Jesus Cristo.

- Não sou nobre. Eu ainda tenho tempo para lutar. - falei cheio de uma falsa confiança.

Eu não confiava mais em minhas habilidades, eu já havia feito tudo o que eu podia. Como lutar sem armas? Eu não consegui mostrar ânimo. Meus passos pareceram pesados enquanto eu seguia com meu carro levando Júlia diretamente para longe de mim.

Assim que estacionei, ela saiu pegando sua
mala e seguindo para o apartamento. Procurei acompanhá-la não querendo perder nenhum minuto sequer de sua companhia. Poderiam ser os últimos minutos. Não, eu não quero pensar assim!

Impossível

E o que Júlia fez quando passou pela porta? Trancou se no seu quarto.

Minha tensão foi atingindo níveis alarmantes. Caminhei de um lado para o outro e, para me acalmar, tomei um banho. Vesti a primeira roupa que encontrei em meu closet.

Apressado, segui para o corredor e lá fiquei sem ter certeza o que eu faria. Será que mantê-la presa, como antes, funcionaria? Eu duvidava, mas estava disposto a fazê-lo. Fazer qualquer coisa.

Ela surgiu. Linda, mas não olhei para as roupas. Meus olhos nos dela, só nela. Meu bem mais precioso. Quando ela passou por mim, eu a detive. Segurei seu braço.

- Aonde vai? - meu aperto firme.

Eu não a deixaria ir como minha irmã sugeriu, eu era muito egoísta.

- Sair com Leonardo, não sei a que horas voltarei. - mais um motivo para prendê-la. - Deixe-me ir João. Se você me ama como diz então me deixe ir.

"Então se a Júlia quiser deixá-lo, você deve deixá-la ir" Não.

"Entao se a Júlia quiser deixá-lo, você deve deixá-la ir." Eu não posso! Não posso ser nobre!

"Então se a Júlia quiser deixá-lo, você deve deixá-la ir."

Um a um, meus dedos foram se afrouxando do seu braço. Ela partiu rapidamente assim que eu a libertei sem olhar para trás nenhuma vez.

Minha mente gritava para que eu corresse e a trouxesse para casa, eu queria isso, mas eu não consegui me mover.

Quando eu o fiz, sabia que não adiantaria. Eu
corri como um louco, usando o elevador e parte da escadaria, mas não a encontrei. Eu havia demorado tempo demais para me mover. Júlia havia ido embora com Leonardo. Eu não fui suficientemente rápido.

Sentindo-me derrotado, eu caminhei até a escadaria em frente ao prédio. Sentei nos degraus e fiquei ali, esperando por Ela. Fixei meus olhos no chão, fiquei encolhido lá.

Ela voltaria pra mim, ainda que pertencesse a outro, ela voltaria. Vê-la uma última vez seria um consolo, ainda que vazio, para a dor monstruosa que eu estava sentindo agora.

Com uma mão no peito, tentando aquietar a dor, deixei de olhar o chão e passei a olhar para o caminho que Júlia provavelmente viria.

Pov's Júlia

Não era para ser assim

- Está gostando? - perguntou em meu ouvido. Assenti com os olhos no palco.

Após nos encontrarmos, Leonardo anunciou que veríamos a peça que tinhamos planejado ver no sábado. Eu assenti desejando qualquer coisa que pudesse me distrair. Eu não estava agindo da forma convencional. Ele percebeu minha estranheza, mas até agora não se manifestou. Nem mesmo quando eu apenas dei um selinho nele.

- Após a peça, eu estava pensando em um jantar.
- disse com seus olhos em mim, sorria. Sua mão segurava a minha num aperto gentil. Eu sorri esperando que ele se contentasse com o sorriso de meus lábios, mas meus olhos não sorriam.

Eu sabia que, após o que aconteceu entre mim e João Pedro, eu iria ficar um pouco diferente com Leonardo... Não imaginei que ficaria totalmente diferente.

O toque dele, ao contrário das outras vezes, não trazia felicidade. Talvez fosse porquê eu estava com a consciência pesada, eu tinha nojo de mim mesma pelo que fiz com Leonardo.

Eu tinha que contar a ele, mesmo que isso significasse ele me odiar. O problema era que eu não me encontrava com forças. Não dei atenção à peça de teatro. Se ele me perguntasse algo sobre a peça, eu não saberia dizer. Minha mente estava longe, no lugar onde eu deixei João Pedro.

"The contract" Adaptação MojuOnde histórias criam vida. Descubra agora