Capítulo 11

128 12 3
                                    


Era tarde quando cheguei em casa. Apenas a luz da cozinha estava acesa e quando passei pela porta, me assustei ao ver Lidiane roubando um pedaço de bolo na geladeira, comendo compulsivamente, como sempre fazia.

— Te peguei no pulo. — Tranquei a porta, já que fui o último a chegar.

— Que susto, garoto! — Tinha resto de bolo em sua boca. — Onde você estava?

— Na casa do Arthur. — Menti. — Cadê a mamãe? — Vasculhei a geladeira. Estava varado de fome.

— A mamãe tá relaxando lá em cima. Se é que você me entende bem. — Meu estômago embrulhou. Eu quero sofrer um Alzheimer agora!

— Que nojo! — Fiz uma careta. — Não existe motel no vocabulário deles, né?

— A casa é deles! Não tem o que a gente fazer. — Lidiane se jogou no sofá. — Que porra de unha é essa? — Fitou minhas mãos enquanto eu estava comendo um pedaço de bolo, jogado no outro sofá.

— A Sophia pintou. — Suspirei. — Eu menti. Não estava na casa do Arthur.

— Eu sei! A mamãe ligou pra lá, queria saber onde você estava, já que, não atendeu nenhuma ligação dela. — Balançou os pés. — Você está gostando dessa menina? — Quis saber.

— Não. Claro que não! — Fiquei sério. — Eu só quero entrar bastante no personagem, pra conseguir o que eu quero. — Querer ela é muito?

— Então tá bom. Mas a sua cara não engana ninguém! — Lidiane deu impulso, saindo do sofá. Eu ainda permaneci nele, escutando minha mãe transar lá em cima e fazendo os meus pensamentos darem um nó de vez.


— Não, não, não, não. Tá tudo errado! Onde estão vocês? Hello? — Escutei Sophia dar uma bronca no clã, que ainda estava cansado da noite anterior.

Fiquei na arquibancada assistindo elas ensaiarem, e realmente, estava péssimo!

— A gente está tentando, Sophia. — Uma soltou, sem paciência.

— Tentando? — Colocou as mãos na cintura. — Faz mais de duas horas que estamos ensaiando e vocês erraram todos os passos! — Bateu um pé, irritada. — Vocês beberam ontem? O que aconteceu? — Quis saber, como uma boa cabeça de clã.

— Eu estava em um date. — Mel contou. — E não sabia que iríamos ter ensaio.

— Como não, Mel? Eu te avisei dez mil vezes por mensagens. — Exaltou.

— Tá bom. Tá bom. — A morena rendeu as mãos. — Vamos fazer o que interessa.

— Não, nós não vamos! — Sophia decretou, irritada. — Já treinamos várias vezes e ninguém colaborou. — Pausou. — Ensaio amanhã às quatro. — Avisou ao clã enquanto vestia sua jaqueta bomber do time de futebol.

Sophia caminhou até onde eu estava, subindo alguns degraus da arquibancada.

— Vamos embora, Borboleto. — Suspirou cansada. Tinha suor em sua franja. 

— Você tem certeza? — Lhe joguei um enigma cruel de pensar. Ela tinha sido terrível com as meninas outra vez, e eu não estava gostando.

Sempre fui justo, não gostava de maltratar os meus amigos perto de outros amigos. E Sophia adorava fazer isso com o clã, percebi depois que entrei acidentalmente ao seu clubinho de fofoca.

— Como assim? — Abriu as mãos e franziu o cenho.

— Dê um crédito à elas, estão cansadas. — Me levantei.

— Acontece que não podemos ficar cansadas. — Colocou uma mão na cintura. — Precisamos treinar! A semifinal está aí na porta praticamente.

Semifinal!
Eu precisava conversar com o meu treinador.

— Borboleta. — Me apressei, arregalando os olhos. — Eu preciso fazer uma coisa, não podemos ficar juntos hoje!

— Mas...

— Eu juro que podemos comer uma pizza à noite. Que tal? — O que eu estava fazendo? — Eu, você e...

— Jack e meus pais. — É O QUE?

— Per-perfeito. — Concordei, mesmo não querendo concordar. Dei um beijo rápido em sua bochecha e corri até a sala do treinador Henry, que estaria furioso com as minhas ausências.

Cheguei no campo e todos já estavam saindo de cena, suados e cansados. Corri o mais rápido que pude.

— Treinador Henry? — Lhe chamei, respirando fundo. Tinha sido uma corrida boa!

— Borges. — Me encarou. — Onde você estava?

— Eu preciso falar com o senhor. — Acalmei minha respiração enquanto o treinador me observava.

Era óbvio que ele estranhou o novo comportamento, até as minhas unhas pintadas. Tinha o semblante derrotado e furioso. Acho que lilás não caiu bem!

— Que cacete é esse na sua mão, Borges? Ficou maluco? — Eu o irritei...

— É sobre isso que precisamos conversar. — Tentei lhe acalmar.

— Piercing na orelha, unhas pintadas, bermuda com corrente... O que caralhos deu em você, moleque? — Estava transtornado. — Seja homem e pare de graça!

— Treinador Henry, esse é o meu novo eu. Por algum tempo. — Rolei meus olhos. — Eu sei que com isso eu...

— Está expulso do time. — Disse, sem dó. — Pode pegar as suas coisas no armário e dar um fora daqui.

— Não podemos entrar em um consenso? — Fiquei triste e decepcionado.

O treinador chegou mais perto, silabando forte e grosseiramente.

— Eu não aceito bichas no meu gramado. — Voltou a postura e saiu do campo. Coloquei as mãos na cabeça, um pouco perdido.

Eu estava triste por um lado e feliz pelo outro. Tinha descoberto um pouco de segredo de Jack, e por outro lado, eu praticamente dei o gramado pra ele colocar a sua estupidez em dia. Por que eu tinha aceitado essa aposta idiota? E eu não podia voltar atrás, um Borges nunca é fracassado à ponto de desistir.

E eu estava sentindo falta de conversar no colégio com os meus amigos, Sophia os afastou um pouco e também não podíamos ser vistos assim, dando na cara. O único jeito era aceitar o clã, que fazia parte de mim agora.

Quatro horas depois.

— Borboleto? — Escutei a voz de Sophia e revirei meus olhos automaticamente. Eu gostava dela mas queria um pouco de paz, talvez?

— Oi borboleta. — Me virei e sorri, destrancando meu carro.

— Você está pronto pro jantar de hoje? — Levantou um pouco os pés, ansiosa.

— Sim. É... Eu adoro pizza! — Sophia deu um risinho.

— Eu falei com o Jack e ele não gostou muito. — Torceu o nariz. Pelo menos Sophia era sincera em relação à isso.

— O que acha de remarcarmos? — Optei. Eu já não queria ir mesmo.

— Não, claro que não. — Ela se apressou novamente, já ficando triste, não queria que eu desistisse da pizza. — Ele vai manter a onda, fique tranquilo!

— Não quero incomodar, borboleta. — E também não queria ir. Se fosse nós dois, eu iria sem problemas.

— Jamais! Eu quero muito que você vá. — Sophia segurou em minhas mãos, pude sentir sua pele delicada e macia, alisando meus dedos por cima. Aquela garota existia mesmo? O jeito que ela me deixava pensante era inacreditável.

— Eu vou. Por você. — Soltei, deixando Sophia surpresa. Meu personagem havia morrido, quem estava falando era o Micael, o Micael hétero, no caso.

Sophia me olhou, brotou um sorriso e deu meia volta, entrando em seu carro, estacionado poucas vagas mais longe que o meu. Eu estava perdido, confuso e agora realmente sentia borboletas no estômago.

Mãe, será que eu estou doente?

Aposta de Amor Onde histórias criam vida. Descubra agora