Capítulo 139: Salto no tempo

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SALTO NO TEMPO: 3 ANOS DEPOIS

POV Luna

Júlia ficou menos de uma semana em São Paulo e nos trouxe informações até que relevantes. Ela conseguiu as pesquisas do doutor Costas e, como esperado, estavam inacabadas. Ele estava tentando produzir um órgão automatizado que pudesse substituir os órgãos afetados pela degeneração. Para isso, era necessário um material totalmente compatível ao nosso sistema imunológico.

Haviam diversas análises e testes digitais de próteses já criadas. Entre elas haviam um pulmão. Infelizmente nenhum desses órgãos foram aprovados, todos apresentaram um índice de rejeição acima do esperado. Ela também trouxe um estoque de injeções e comprimidos. Segundo as anotações, eles eram mais eficazes que os vendidos atualmente pela sua durabilidade ser maior e o efeito mais rápido.

Invadimos mais de 15 bases deles, todas com os mesmos rastros: cigarros, latinhas, roupas e sangue. Sempre indicando as mesmas pessoas. Quaresma nos guiou até os lugares que já não estavam marcados no mapa. Os sonhos pioraram ao nível de me causarem insônia por vários dias. As meninas imploraram para que começasse a tomar remédios para dormir, se não fosse por isso, teria enlouquecido.

Os remédios inibem os pesadelos e hoje já não consigo mais vê-la, mesmo sem eles e com muito esforço, é em vão. O laço que me ligava a ela estava mais fino com o passar do tempo, podia sentir isso. Como se lentamente ela estivesse desaparecendo. Estávamos em uma rua sem saída. Sem provas, sonhos, nem nada que pudesse nos levar a ela novamente. O único que ainda conseguia um pouco de informação sobre o caso era Quaresma devido às buscas do FBI.

Clara e Mariana passaram meses longe da investigação a procura de seu amigo Victor. Fomos interrogadas umas duas vezes, mas não conseguiram nenhuma informação do que possa ter acontecido com o garoto. A polícia não nos vigia mais graças ao Quaresma e os meninos lucraram bastante com a chegada de algumas facções na cidade. Gente pequena que só gosta de provocar, fugir e se esconder, estão causando na cidade como se fossem donas de tudo. Não tenho paciência, nem tempo para lidar com isso.

As crianças já entraram nas escolas e como elas estão crescendo. Mel ama ler, desenhar e escrever. Todos os dias ela coloca um desenho ou texto diferente na geladeira, sempre com os mesmos temas: Cristal e Teddy. Sinto que ela tem medo de esquece-los e essa é a forma dela deixá-los vivos em sua memória. As gêmeas não mudaram tanto, continuam criando confusão aonde passam, toda semana tem pelo menos um bilhete na agenda de cada uma. Maju e Din decidiram que seria melhor para a Maya crescer longe dessa confusão e a colocaram em um colégio interno. Todo feriado os dois vão visita-la e passam dias com ela.

Thomas e sua família já estavam bem acomodados na cidade. Compraram uma casa simples e muito linda afastada do centro. Lia já estava pesquisando sobre as escolas e as creches da cidade quando conheceu Lilian e Theodore, pais da Layla. Eles se tornaram grandes amigos e Thom chamou os dois para trabalhar com ele na parte de organização de suas filiais. Harry já não é mais tão pequeno, já estava andando e balbuciando algumas palavras. Seus cabelos eram bem cacheados e escuros muito parecidos com o do pai e seu sorriso era tão encantador quanto o da mãe.

Lúcio, Chiara e Layla, o trio de arruaceiros. Sempre juntos, são as poucas vezes que vejo Chiara rir como antes. Layla se tornou uma garota incrível, bonita e muito inteligente. Antes de terminar seu último ano do colégio, no mínimo três universidades mostraram interesse na garota. Lúcio continua o mesmo, gênio na tecnologia e se aperfeiçoa a todo momento, sempre criando aplicativos e jogos para ganhar dinheiro. Já é pouco conhecido no ramo e requisitado.

Chiara, o que dizer dela? É tão forte quanto você, uma líder nata. Quando não está no colégio ou com seus amigos, ela fica no cativeiro fazendo suas próprias investigações e treinando. Ela não desistiu por nem um segundo de te encontrar. Em uma de suas crises ela pintou todo o cabelo de azul, não queria mais se lembrar do babaca que causou tudo isso. Dei a ela seu pingente de assa de anjo, Chiara não o tira por nada.

As meninas estão seguindo com a facção, as vendas vão bem e, no quesito ações, estão invictas. Cristal se tornou um nome proibido. Todos fingiam muito bem que estavam superados, mas sempre que se falava ou lembrava dela era possível sentir o clima ficar tenso como se colocassem toneladas em nossas costas. Toneladas de culpa por não termos te trazido de volta.

Hoje é o aniversário de 15 anos da Chiara e ela se recusou a sair do quarto. As meninas programaram uma festinha para ela na casa da Gabi e tiveram que cancelar. Não sei o que fazer, ela está sofrendo e não posso fazer nada porque não consegui cumprir minha promessa. Queria ter ido no seu lugar. Estou sentada do lado de fora do quarto da Chiara escutando seus soluços enquanto minhas lágrimas escorrem pelo meu rosto.

- Já tentou falar com ela? - Júlia pergunta se sentando a minha frente.

- O que eu poderia falar? - Pergunto sem conseguir conter minhas lágrimas.

- Não sei, mas ela precisa de você agora, ninguém mais consegue entrar, Chiara não deixa. - Júlia diz encarando a porta trancada.

- É tudo culpa minha, não consegui traze-la de volta. - Digo escondendo meu rosto em meus joelhos.

- Não é, sabe disso e ela também, vocês tentaram de tudo e ainda estão tentando. - Júlia colocando as mãos em meus ombros na tentativa de me acalmar.

- Estou perdida Júlia, não sei o que fazer sem elas e sinto que a qualquer momento irei perde-las. - Digo sentindo minha voz falhar pelo choro.

- Ela também está, Luna, uma vai precisa apoiar a outra, mas para isso tem que entrar ali. - Júlia diz se levantando e estica a mão para me levantar também.

Aceitei, respirei fundo e limpei meu rosto. Júlia se afasta e bato na porta.

- Quero ficar sozinha... por favor. - Chiara diz e sua voz de choro me machucava ainda mais.

- Filhota, me deixa entrar. - Peço tentando não chorar.

- Mãe... só quero ficar sozinha. - Ela insiste.

- Você não precisa. Quero ficar com você, te abraçar e te dar todo o carinho que merece. - Digo deixando algumas gotas escaparem.

A porta se abre e sinto os braços de Chiara me envolverem e seu rosto molhar minha blusa. Entro no quarto com ela em meu abraço e me sento na cama a deixando em meu colo. Não tínhamos muito o que falar, apenas o quanto nos amávamos e que um dia tudo isso iria melhorar. Passamos o dia juntas, conversando, rindo e chorando.

Ao anoitecer, passei a noite acariciando seus cabelos. Pela primeira vez em muito tempo não tomei meus remédios e em consequência não consegui nem piscar os olhos. Minha cabeça estava a milhão desejando que ela voltasse para nós e implorando aos céus que esse pesadelo finalmente terminasse. A noite parecia não ter fim até que consigo ouvir sua voz mais uma vez. Não sabia se era um sonho ou um delírio, mas era a sua voz e ela me acompanhou durante as horas até o brilho do sol me trazer de volta a realidade.

Nem a distância nos separaOnde histórias criam vida. Descubra agora