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Neguei com a cabeça. Não por não achar que conseguiria levar uma luta armada contra ele a frente, eu conseguiria por alguns meses, ou até a polícia se envolver, mas que se o nosso conflito chegasse naquele nível, as coisas iam passar do ponto de retorno. Se eu comprasse uma briga naquela magnitude com ele, nós íamos virar inimigos declarados, pra sempre... Eu só ia me fuder nessa história. Primeiro que se ele resolvesse me foder, era provável que eu não conseguisse manter o controle de todas as minhas favelas agora. Ainda era muito cedo, não tinha nem um mês que eu tinha assumido elas e ainda tava correndo pra conseguir unir todo mundo em uma só unidade... Não ia dar pra aguentar um ataque do nível que eu sabia que o Barbás era capaz. Além disso, ele era um estrategista de primeira linha. Era difícil prever de onde o golpe vinha quando se tratava dele. Isso tudo ia tornar minha vida muito mais complicada. No meio dessa merda toda ia estar a minha filha, no meio de um tratamento importantíssimo pra vida dela, tendo que descer a favela todo dia. Como ia ser se fosse debaixo de tiroteio?

E falar em tratamento, tava ai o 2° problema. Eu precisava de uma doação de medula óssea dele. E a filha não era só minha, ele era pai também...

Que inferno. Que. Inferno! Puta que pariu.

— Eu vou falar com ele. Se não dá pra adiar mais... eu vou lá. Eu só tô prolongando o nosso sofrimento, po. O meu, o seu e o da Maria.

— Tá doida, Nina?

— Isso ia acabar rolando mais cedo ou mais tarde mesmo, não tem porque tu se sentir culpado. Eu já tava me preparando pra isso, quando voltei pro Rio. — Dei de ombros. — E devo umas explicações pra ele também... é...

— Não, mano. Por minha causa, não, Nina. Se alguma coisa acontecer contigo, eu não vou aguentar essa porra não. — Ele chegou perto de mim e segurou minha mão. — Vamo fazer assim, tá? Eu vou falar que não me deixaram subir, mas que não dava pra saber se você tava ou não. Aproveita e...

— Um, o Barbás é inteligente. Ele vai sacar e você tá fodido, não vai ter adiantado nada. Dois, eu já tenho ir até ele, eu não tenho como fugir. A Maria precisa dele pro tratamento, entendeu? — Expliquei. — Só vai lá e fala que me viu aqui. Pronto. Não vai ser difícil pra tu.

— Ô Nina, eu só falava pra ele as vezes que você ligava pra mãe pra falar qualquer coisa, tipo da quantidade de sapato que tu comprou no Natal, cacete. Eu nunca falei da Maria, nem do que você fazia, onde você tava, até porque eu nem sabia ao certo, eu não queria te comprometer, só viver na porra da minha favela. — Rebateu nervoso. — É difícil pra mim sim. Eu não vou lá e te cagoetar, porque se alguma coisa acontecer depois, eu não vou conseguir viver comigo mesmo.

— Para de história, eu tô te mandando ir lá e falar a verdade pra ele. Tu que não tem que se comprometer nessa história, isso é problema meu. — Repeti com mais firmeza. — E eu sou mulher pra arcar.

— Não vou fazer, Nina. — Ela negou com a cabeça, levantando do sofá. — Já disse o que eu vou falar, agora colabora pra ele não descobrir que é mentira.

Andrei deu as costas pra mim e saiu pela sala. Eu até corri atrás, segurei ele, que me empurrou de volta pra trás e continuou seu caminho. Parei, olhando ele ir embora de longe, escoltado pelos seguranças quando chegou na esquina. Passei a mão no rosto, dessa vez era eu que tava sentindo um desespero bizarro. Eu sabia que tinha o Barnabé na minha frente, mas uma informação assim podia valer ouro... Alguém podia ter dado pra ele. Alguém podia ter me visto e reconhecido na Rocinha. Alguma coisa tinha acontecido pra ele estar desconfiado. Se tinha mandado o Andrei aqui, alguma coisa ele sabia... pra desconfiar assim, ele sabia. Agora o corno do meu irmão tava indo lá fazer uma merda colossal com a vida dele, enquanto eu me escondia ali no morro que nem um covarde. Depois que o Barbás tivesse certeza que eu tava ali, o que não ia demorar a acontecer, eu não ia ter como comprar uma briga com ele por uma porrada de fatores. Era até egoísta da minha parte botar um monte de inocente de peão no jogo que era meu e do William. A hora de enfrentar as coisas de frente tinha chegado.

Voltei pra dentro de cara, me jogando no sofá e não segurando as lágrimas de nervoso que brotaram nos meus olhos. Eu tava com medo, muito medo... Pela Maria, se o Barbás se negasse a doar a medula; pelo meu irmão, que tava mexendo com uma coisa muito perigosa pra vida dele; pro mim, que não sabia o que eu ia encontrar quando eu olhasse pro homem que eu tinha amado. Acho que o meu pavor era encarar o Will e não ver mais nele a pessoa que tinha sido o meu marido... Se ele fosse outra pessoa, eu não ia saber como fazer. Mais difícil ainda ia ser reconhecer que o que quer que tivesse acontecido ao coração dele, parte era culpa minha.

Fiquei ali, enrolada numa bolinha de melancolia e tristeza. Eu tinha que me preparar... Eu tinha que ter coragem...

Contei 1h certinho no celular e me levantei do meu buraco. Fui buscar o Luan na escola e pedi o novo número de Andrei pra ele. Liguei pra ele. Recusou minha ligação. Liguei de novo, recusou também. Fui até o whatsapp dele e mandei uma mensagem "se você não me atender, eu vou até ai falar contigo. Você quem sabe".

5 minutos depois, ele me retornou.

— Eu tô ocupado agora. Não dá pra falar. — Falou.

— Me bota na linha com o Barbás agora. Tô pedindo namoral, eu não quero ter que meter minha cara limpa na Rocinha agora, mas vou fazer se tu não colaborar.

Coração em GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora