Dalila levantou e saiu, trazendo um caderno e caneta, toda no pique advogado. Passamos o tempo pensando em quantas pessoas tinham acompanhado os últimos meses da minha trajetória ali e que fossem confiáveis. Muita gente tinha passado pela minha vida naquela época, mas como a situação da Rocinha mudou pra cacete nesse meio tempo, a maioria tava "indisponível". A favela tinha mudado de mão muitas vezes, entrado em guerra tantas outras... essas pessoas ou estavam mortas, ou estariam se botassem o pé na favela pra falar sobre mim. No final, a gente chegou ao consenso de que quem eu devia me basear eram as mesmas pessoas de sempre. Russo e Dalila estavam certos, eu ia precisar da Larissa e, principalmente, do Túlio. Se o TK me desse o benefício da dúvida na frente dos colegas dele, ele tornaria tudo muito mais fácil pra mim. No final, eu até cogitei mesmo pedir pro Rogier fizesse nem que fosse um vídeo, só pra ser mais uma voz dando volume à minha narrativa.
E é claro que eu ia ter que explicar porque eu fui embora, mas isso era a parte simples da história. Eu tinha exames de sangue e ultrassons da gravidez da Maria pra provar tudo isso, estavam no Foz, mas eu podia dar um jeito de fazer alguém trazer. Depois, eu ainda podia mostrar os exames da minha filha pra provar o real motivo por eu não ter tido a menor condição de me despencar de onde eu vivia pra me arriscar no Rio de Janeiro antes. Bom... agora as coisas tinham mudado.
Eu podia fazer as coisas darem certo, eu tinha o queijo na minha frente, faltava só a faca mesmo.
Toda a visão que nós três tivemos do caso, me ajudou a ficar mais esperançosa sobre o assunto. Dava sim pra fazer o negócio fluir de um jeito muito bom pro meu lado. Eu só precisava das pessoas certas... Bom, eu não ia ficar parada. Por enquanto, eu ainda tinha tempo.
— Russo, lembrei de um negócio. Tu ainda tem aquele treco meu aqui? — Chamei meu irmão com a mão, entrando pra dentro de um dos cômodos na qual a minha sombra não podia me ver. Ele foi atrás.
— Me empresta o celular ai, vou falar com o Rogier pra ele me adiantar esse negócio ai. — Pedi. Wallace colocou o telefone na minha mão, dando uma olhadela discreta pro lado de fora. Disquei o número do meu tio.
— Alô? E ai? — Começei assim que ele atendeu. — Como estão ai as coisas ai em Foz? Todo mundo bem?
— Aqui de boa, Nina. E ai? Tudo certo? — Perguntou.
— É, mais ou menos. Eu tô me virando aqui.
— Entendi, po. É que eu não tava conseguindo falar contigo e nem com o Barnabé, comecei a ficar preocupado. — Respondeu e eu fiquei meio encucada. Comigo tranquilo, eu tava incomunicável mesmo, mas o Barnabé...?
— É, eu tô sem celular mesmo, mas como assim o Barnabé também? A quanto tempo tu não consegue falar com ele? — Tinha caroço nesse angu.— Faz duas semana que eu tenho tentado ligar pra ele, mas tá difícil, po. Tipo, eu ligo pra ele num dia e, ele só me retorna uns 2, 3 dias depois. Eu ligava pra tu, 0 resposta. Liguei pra tua mãe e ela disse que tu tava na Rocinha... Eu já tava começando a achar que tinha morrido todo mundo e ia dar um jeito de ir ai pra ver qual era da parada. — Falou. Fechei os olhos já vendo a confusão.
— A droga continua indo pra lá direitinho? Tão vendendo como sempre? — Perguntei.
— Sim, até ai não tem nada de anormal. É só a falta de comunicação que tá foda. — Falou. Era esquisito... — A parte estranha é o Barnabé também, passei anos com o cara e ele não é de fazer essas coisas. Ele nunca ficava sem responder. Tu tá na Rocinha, né? Ele que tá no controle das favelas lá.
— É, isso aí... — Bufei, já pensando no que podia estar acontecendo. Na minha mente veio o homem todo arregaçado que o Barbás ajoelhou na minha frente só pra perguntar se me conhecia... Claro que podia ser só paranoia dele, como eu imaginava que era, mas por quê sujar a casa toda só pra me confrontar com ele? Motivo tinha. Ele sabia das favelas que tinham sido do meu falecido... provavelmente imaginava que eu tinha alguma ligação com elas. Será por isso? — Pera ai. Wallace, que que aconteceu essa semana aqui na favela? Aquele tiroteio que teve...
— Ah, po, o comandante da polícia que deu a planta pro Barbás que tinha gente do Rio Comprido rondando aqui. Ai ele foi e ficou de tocaia pra pegar. — Contou em um sussurro. Puta que pariu, mano. Levei uma mão à testa. Barnabé tava sabendo que eu ia estar na Rocinha mesmo, mas eu tinha dito que era problema meu e que não era pra ninguém se meter até segunda ordem. Pra que ele tinha mandado pra gente pra cá?
— Queriam o que aqui? — Perguntei, levantando da cama onde eu tava sentada.
— Informação, mas a gente não ficou sabendo o quê. Barbás tá puto com isso desde que rolou. — Explicou. — Por quê, Nina? Qual o caô? — O Wallace não sabia que a favela era minha até então...
— Depois eu explico. O que tu sabe sobre isso? Me fala tudo o que tu sabe, rápido. — Ele me olhou esquisito.
— Como que eu vou passar informação de dentro aqui pra gente de fora, Nina? — Negou com a cabeça.
— Não é pra gente de fora, é pra mim. Confia que eu sei o que tô fazendo. Me fala o que você sabe, vai... — Pressionei.
Ele deu mais uma olhadela lá pra fora. Espiei junto com ele e notei a Dalila oferecendo comida pro Piloto e tentando puxar assunto com ele.

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Coração em Guerra
Romanceㅤㅤ"Sou a morte, o diabo, o capeta, a careta que te assombra quando fecha o olho. Sou seu colete à prova de balas, seu ouvido à prova de falas... Eu vou tomar nosso mundo de volta." Djonga ㅤㅤㅤHá 5 anos ela foi acusada de trair o homem a quem ela amav...