— Tu não tá em condições. — Ele começou, mas o próprio Túlio interrompeu ele.
— Deixa, Barbás. Se ela ficar parada, vai começar a pensar e vai ser pior. Sei como que é... — TK respondeu. — É bom que tá ela se foca em outra coisa. Deixa ela vim.
Ele pareceu pensar a respeito por alguns segundos, enquanto os nossos homens se reuniam de novo.
— Tá, mas tu vai ficar atrás de mim. Se sair do meu lado, eu volto contigo na mesma hora. — Falou comigo.
— Eu entendi, não sou criança. — Rebati, sentindo uma apatia esquisita no peito. Eu me sentia vazia, seca, como se minha mente tivesse em branco.
— Ô Túlio, tu vai ter que liderar na frente, eu vou ficar mais atrás com ela. — Pediu, me pegando pela mão em um aperto firme e ajeitando minha bandoleira. Todos nós saímos dali caminhando até a rua de novo, onde estavam as motos.
Subi na garupa do Barbás me sentindo estranha, muito estranha. Como se faltasse alguma coisa em mim... Eu não conseguia entender mais nada nos meus pensamentos, estavam todos embaralhados, informações desencontradas... Tinha uma tristeza descomunal dentro de mim, eu sentia dor física, mas não tinha machucados em mim. Sentia cheiro de sangue nas minhas roupas, que eram escuras e não deixavam transparecer muita coisa. Algo tava errado, eu sabia, mas não conseguia entender o que. De repente, eu sentia tudo, mas era como se não tivesse sentindo nada. Apatia.
Eu não prestei a atenção no caminho, o vento no rosto me parecia mais melancólico, mais gelado. Frio, eu tava com frio. Nós subimos bastante, bem mais além do que antes, fomos até o final da Rua 3 e paramos. Era, literalmente de frente pra Rua 1, mas a gente não podia seguir até ter dominado completamente o Cesarão e a Paula, onde o pessoal parecia estar tendo problemas. Meu grupo foi pro lado do direito, forçar uma das extremidade. Ali, eu peguei minha arma e me desliguei, fazendo o que eu sabia fazer. Esconde, atira, corre e atira. Em um loop, sem pensar sobre aquilo, só ia e atirava. A gente passava por corpos o tempo todo, passávamos por sangue e o seu cheiro metálico, que eu já não sabia se vinha de mim ou dos outros. Tentei não olhar muito pra eles, por me trazerem um sensação horrível. Eu desviava os olhos e seguia em frente, fazendo o meu trabalho. O Túlio realmente tomou a frente e levou o pessoal, enquanto o Will ficou mais atrás comigo e com todo o resto.
Eu tava completamente alheia ao tempo, às horas. Roboticamente eu fui fazendo o que eu tinha que fazer, enquanto o Barbás me cercava de todos os jeitos que ele conseguia. Chegamos ao final da Cesário e voltamos comemorando a conquista. Eu não esbocei reação nenhuma, o mundo só tava passando rápido ao meu redor e eu não tava conseguindo acompanhar direito.— Tranquilidade. — O Parma foi até ele, apertar a mão do homem. Barbás e o Russo o seguiram, selando um pacto entre os quatro. Eu ainda estava ali, mas sem participar daquilo. Não tinha a ver comigo, não era comigo, eu era só o elo que uniu os quatro. Na verdade, eu nem queria estar ali. A cada hora que se passava, eu me sentia pior e pior. Estava com vontade de vomitar, enquanto uma ansiedade inexplicável me subia à menta.
— Vocês já decidiram quem vai entrar como o frente? — O meu pai perguntou e os outros três de entreolharam.
— Por enquanto vai ficar entre nós três. A gente se reúne e decide sobre o que fazer, quando precisar. — Parma falou e eu vi o Carlos torcer a boca. Ele não achava uma boa ideia. É porque, realmente, a ideia de mais uma pessoa dando ordens em um sistema como aquele não era lá o mais ideal. Uma discordância entre as partes, podia causar um racha na favela de novo e a gente corria o risco de viver sempre naquele inferno. De qualquer maneira, ele não falou nada e concordou. — Nós conversa da tua parte no final do mês, falou?
— Por mim tá tranquilo. — Carlos sorriu, voltando a apertar a mão dele. Nós cinco ficamos ali, procurando por alguma pista que o Misael pudesse ter deixado pra trás, enquanto os outros corriam atrás de vasculhar todos os becos e vielas daquela favela. Depois de reconquistar a Rocinha, a ordem era achar o filho da puta do ex-dono de qualquer jeito.
Mandarim reuniu os seguranças dele um tempo depois e se despediu dos outros, vindo até mim para me dar um beijo antes de ir.
— Amanhã eu volto pra ver como ficou as coisas aqui. — Ele disse, fazendo um carinho no meu cabelo. — Tudo bem com você? Não tá feliz?
— Eu tô, eu só... — Pisquei algumas vezes. — Sei lá, acho que perdi alguma coisa.
— Todo mundo perdeu. — Ele me consolou. — Fica bem. Qualquer coisa me liga. — E beijou minha testa, se levantando para ir.
Eu não reparei na saída dele, não reparei em mais nada. Em algum momento, eu tinha sentado num cantinho da sala, entre as vidraçarias e me isolado lá, olhando as luzes lá fora. Barbás, Russo e Parma estavam olhando os cadernos de contabilidade e os outros papéis que tinham ficado ali. Tava tudo bem revirado, por isso, o trabalho era bem difícil. Os tiros, que eu tinha escutado o dia inteiro, finalmente tinham cessado. O silêncio, por outro lado, não era confortável como eu achei que seria.
— Eu vou ligar lá no hospital. Tenho que ver como tá Dalila. — O Russo falou um tempo depois e foi como um estalo na minha cabeça. Eu pulei no lugar. — Porra, graças a Deus não foi nada grave. Eu fiquei desesperado, irmão. Porra, minha irmã...

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Amor na Guerra
Romansaㅤㅤ ㅤ"Geral quer ser rei, conspiram pro tempo que não espera. Impérios caem com novos reis, os tempos passam a ser de guerra." MC Marechal ㅤㅤ ㅤO sonho do moleque é ser chefe, o do vapor, do gerente e do segurança também é. O sonho do chefe é sobreviv...