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Ela pulou no lugar e eu a puxei pela rua abaixo, onde tava minha moto. Ali, naquele lugar, a gente se entreolhou por alguns segundos. Bom... pro bem ou pro mal, foi ali, numa situação bem parecida, que a gente tinha se encontrado pela primeira vez. Nina riu, passando um dedo na moto, que já não era mais a mesma Kawasaki onde ela tinha deixado a sua marca. Dei um sorriso de canto pra ela e subi na moto, chamando ela com a mão.

— Não ri não, tu ia apanhar pra caralho se não fosse pelo teu irmão estar segurando tua onda sempre. — Disse, quando ela subiu na garupa.

— E agora o quê? Eu me mudei pra sua casa faz duas semanas e a gente casou. — Ela falou, passando os braços pela minha cintura. — Bizarro, né?!

— Se tu me perguntasse há um ano se eu achava que a gente ia terminar juntos... — E ri, negando com a cabeça. A vida é foda, toma caminhos tão estranhos que fica fácil se perder neles depois de um tempo.

Estacionei a moto no garagem e subi pra trocar de roupa. Coloquei uma blusa social, uma calça e troquei meu relógio por um menor. Passar despercebido era uma arte que qualquer um que fosse errado na vida tinha que aprender. Sem cordão chamativo, sem anel, sem porra nenhuma. O ouro era pra ficar em casa. Escolhi um boné pra tampar um pouco do meu rosto e saí. Do meu lado, Nina mexia todas as portas do meu guarda-roupas. Era esquisito pra mim dividir o espaço das minhas roupas com ela... Acho que eu já tinha perdido o jeito de casado nessas andanças da vida. Mais que isso, eu ficava até assustado em como ela tinha me convencido a casar com ela e mais ainda quando eu lembrava que foi de mim que partiu a decisão de morar com a Nina. Eu devia estar muito apaixonado por essa mulher mesmo...

— Bora. — Chamei, pegando a chave do carro. Ela foi prendendo o cabelo em um rabo de cavalo, enquanto descíamos as escadas e entrávamos no automóvel.

Saímos da favela de boa e eu desliguei o rádio pra não dar muita bandeira, deixando só o celular ligado. O Hospital era até bem perto dali, 15 minutos de carro e a gente tava lá. Só que eu fora da favela era um escaldo só. O tempo todo o olho ia no retrovisor, vendo quem tava atrás de mim. Sabia que aquela área ali era jurisdição de gente que nós tavamos pagando, mas mesmo assim... A Rocinha era a minha proteção e ficar sem ela me deixava nervoso. Nina reparou e ficou me olhando de canto a viagem toda.

Num sinal ali na Mário Ribeiro, quando a gente parou, um grupo de playbozinho filho da puta resolveu tirar uma com a minha cara. Eles botaram a cara na janela e começaram a mandar beijo pra Nina, que tava com a janela aberta. Ela um um tchauzinho pra eles e eu olhei feio pra ela, que deu de ombros. Que porra, irmão... No terceiro 'moreninha' que eles falaram, querendo chamar a atenção dela, eu soquei o buzina do volante e virei pra ela.

— Vem cá, tu vai fechar essa porra de janela ai ou vai ficar dando moral pra esses moleques ai? — Perguntei, puto.

— É só um monte de adolescente, Barbás. Que estresse. — Ele reclamou, subindo um pouco a janela.

— Valeu, então. Dá mais tchauzinho ai. — Eu tava estressado. Nem era culpa dela, mas eu tava. Era uma porrada de coisa em cima da minha cabeça agora, tinha conta pra mais de 10 bocas pra eu fazer aquela semana, Russo tava cuidando da parte da reorganização das bocas, então eu ficava com a matemática de tudo. Além disso, só o fato de eu estar fora da Rocinha, aumentava a possibilidade de eu ser preso em uma caralhada de vezes. Óbvio que eu ia estar estressado, porra... qualquer coisa ia me tirar do sério, até uma porra de moleque que tinha acabado de sair do útero da mãe.

— Você deixou a arma em casa? — Ela quis saber, quando eu forcei o motor. Essa porra de sinal não ia abrir não? No rosto dela, um sorrisinho debochado.

— Quer saber pra que?

— Curiosidade, ué. — Ela riu, terminando de fechar o vidro. Olhei com raiva pro outro lado, queria nem ver mais aqueles otários rendendo pra ela. Eu não podia fazer merda e chamar a atenção ali não, nem era do meu feitio me foder por pouca bosta. Quando a porra do sinal finalmente abriu, eu enfiei o pé no acelerador e fui. Na esquina seguinte já era o estacionamento do hospital, onde eu parei o carro e desci, meio bolado. Eu tinha trago a arma, ela tava embaixo do banco e ia continuar lá. A Glock era grande e chamava muito a atenção.

Entramos no hospital e ela foi direto entrando por uns corredores até a recepção das internações, onde deu as nossas identidades. Sem muito problema, a enfermeira analisou e fez umas etiquetas com nossos nomes, que a gente colou na roupa.

Subimos pela escada mesmo, até o terceiro andar. Ela foi andando direto até virar à esquerda e entrar no quarto com o número 308.

— Xica? — Perguntou e eu vi a Shirley despontar por trás da cortina. Larissa tava ali também e veio falar com a gente. Dei um 'oi' normal pra elas e fui seco até a cama que tava meu filho. Eu tava há muito tempo sem ver ele... também, o Pedro tava ali há uns 2 meses já.

— Pai! — Ele falou, levantando na cama. Abraçei ele, apertando o moleque nos meus braços, sentindo o cheiro dele de novo. Só assim pra eu acreditar que meu filho tava vivo e bem... Vivi uma porrada de tempo só de notícia e vontade. Caralho, eu tava surtando sem ver ele, sem olhar e ter certeza de que ele ainda tava ali.

— E ai, moleque? — Disse, passando a mão na cabeça dele em um carinho. — Achei que eu fosse morrer de saudade de você, Pedro.

— Eu achei que tu não ia vim me visitar, pai. — Ele ficou bico e eu sorri, sentando ele na cama de novo, já que a Larissa tava reclamando já.

— Não deu pro pai vim antes. — Dei de ombros. — Mas eu tô aqui agora e vou vir de novo, valeu? Promessa de homem. — Dei a mão pra ele bater. — E quando tu for sair daqui, quem vai te buscar sou eu.

— Valeu. — Ele sorriu, batendo na minha mão de novo. Dei um abraço meio de canto nele, envolvendo uma mão na cabeça dele. Eu e ele ficamos trocando uma ideia ali, ele falou de como tava cansado do hospital e das brincadeiras que a Shirley fazia pra passar o tempo com ele. Das coisas que a Nina e a Larissa compravam pra distrair ele, até de como a comida era uma merda...

Amor na GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora