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— Eles tão bem, vem cá. — Will me segurou pelos braços, me olhando nos olhos. — Amanhã tu vai lá, hoje tu vai descansar. O amigo que acompanhou eles veio aqui avisar que voltou, eles tão Vidigal.

— Minha mãe e meus irmãos tão no Vidigal? — Perguntei debilmente e o Barbás confirmou. Eu pisquei, confusa. Eu entendi o que ele tinha me dito, mas não estava acreditando. — Mas o meu irmão... O meu irmãozinho... — As imagens de mais cedo foram voltando gradualmente para a minha mente. A Lila machucada, minha mãe chorando, o sangue... O Jean. Meu Deus, o Jean...

Abri a boca, levando às duas mãos até ela em choque. As lágrimas começaram a descer na hora e todo mundo me olhou. Olhei pras minhas mãos, não achando nenhum vestígio restante do vermelho. Olhei pras minhas roupas... manchas marrons em vários pontos. Muitos pontos. Manchas escuras. Pisquei, lembrando do Jeanzinho com um buraco no peito e o outro na barriga, vazando todo aquele sangue por todos os lados. Lembrei como ele tinha ficado pálido e frio nos meus braços, enquanto eu falava coisas aleatórias que eu achei que ele gostaria de saber... Ele não tinha escutado nada. Nada do que eu tinha contado, ele tinha sido capaz de ouvir, porque ele tinha me deixado. Ali, ele já não estava mais comigo e eu não tinha notado até então. Meu Deus, o meu irmão tinha morrido. Eu tinha perdido o Jean... pra sempre.

— Ba-Barbás... — Gaguejei, sentindo o frio voltar e balançar o meu corpo todo. — O meu irmão. O que aconteceu com meu irmão? — Perguntei e ele não me respondeu, só respirou fundo e ficou me olhando. — Me fala. — Gritei, levando as mãos ao peito.

— Você já sabe, Nina. — Ele me disse. — Ele tá num lugar melhor agora. Bem melhor do que isso aqui, com certeza. — Murmurou com um profundo desgosto marcando sua voz.

Chorei. Eu só chorei, me desmanchei em um milhão de pedaços, soluçando e engasgando no meu próprio lamento. Era muito forte, era muito doloroso. Apertei a roupa do meu corpo com força, grunhindo de raiva. Russo tentou chegar perto de mim, mas eu o empurrei com força, ameaçando arranhar ele todo se chegasse muito perto. Parma fechou a sala pra me dar alguma privacidade, não que eu tivesse realmente interessada naquilo. Eu tava destruída pela dor. Eu tava desesperada, não sabia o que fazer...

— Barbás, leva ela pra casa. Deixa que a gente faz o trabalho aqui. — Parma sugeriu.

— É, parceiro, cuida dela. Só consola ela, já que tu é o único que ela vai deixar fazer isso. — Russo murmurou, a preocupação marcando cada sílaba que ele pronunciou.

Barbás concordou com a cabeça, me pegando pela cintura e quase me arrastando pra fora. Minhas pernas estavam pesadas, meu corpo estava pesado também. Eu me sentia completamente carregada, verdade. Eu só permiti que ele me levasse, meio sem forças pra lutar contra aquilo... No caminho até a casa dele, eu fui alheia ao que acontecia redor, mas parei de fazer escândalo. Meu rosto vermelho e queimando de tristeza, minha cabeça começou a latejar... talvez fosse cansaço mental. Eu tava cansada, muito cansada. Ao meu lado, me amparando, estava aquele que estivera sendo a minha rocha. De algum modo, eu tava muito grata por ter ele ali do meu lado.

[...]


[WILLIAM]

A noite passada tinha sido foda. O dia todo tinha sido uma merda, na real. Eu tava puto, óbvio. O principal tinha dado certo, a Rocinha era nossa de novo, mas não estava tudo nos conformes. Muita coisa tinha saído errada... Muita coisa. A guerra tinha acabado, mas a paz ainda demoraria à vir. A vitória não devia ter um gosto tão amargo... Eu só ia descansar em paz quando tivesse pegado o Misael, agora não era só por mim e pelo que ele tinha feito pra minha família e pra família dos irmãos, agora era pela Nina também.

O dia estava amanhecendo de novo, o sol despontava no horizonte, deixando o céu alaranjado. Ali, da varanda da minha casa, eu estava fumando um cigarro atrás do outro, tentando enfiar tudo o que tinha rolado dentro da minha cabeça. Fiquei tão concentrado nos meus próprios pensamentos que nem vi quando a Marina levantou. Tinha sido pica pra ela, eu sabia. Eu larguei os lances lá pro Russo e o Parma, vim pra casa pra segurar ela de pé. Porra, eu sabia muito bem como ela tava se sentindo, era foda, não dava nem pra colocar em palavras. Ela ia passar por isso, eu conhecia bem a força dela... Quando chegamos, eu tomei um banho com ela no meu banheiro e botei ela pra dormir uns calmantes que eu tinha ai. Ela precisava dormir e precisava de tempo pra digerir.


— Will. — Chamou baixinho e eu me virei pra olhar ela. Nina tinha olheiras debaixo dos olhos e o rosto tava pálido.

— Tá melhor? — Perguntei.

— Não muito. — Piscou, parando do meu lado na varando e se debruçando sobre o parapeito. — Mas eu entendi o que aconteceu.

— A vida é assim, Nina. A gente não controla essas coisas. — Traguei o cigarro. — Não é culpa de ninguém, além de quem mandou apertar o gatilho. Não é o que tu me disse quando balearam meu filho?

Ela concordou com a cabeça, encostando a testa no antebraço por alguns segundos.

— O que que aconteceu? Como chegaram na minha família? Foi Misael? — Perguntou e eu fiquei meio em dúvida se devia falar daquilo agora. Ela insistiu, quando eu fiquei quieto, então, eu resolvi dar as respostas que ela queria.

— Eu perguntei pro irmão que sobreviveu lá e ele tinha que tinha um cara infiltrado no grupo que a gente mandou pra lá. — Contei. — M7 sabia que a gente só ia parar se ele botasse uma carta muito boa na mesa. Nesse caso, sua mãe, seus irmãos e a Dalila. Desse jeito ele parava você, a mim, ao Russo e ao Mandarim de uma vez, então eles eram a galinha dos ovos de ouro. Ele deu a planta, então, uma tropa dele deu a volta na Rocinha e saiu rasgando por dentro, enquanto a gente tava preocupado em tomar a parte de cima. — Expliquei, olhando pra ela pra tentar ler o que ela tava pensando. — Foi um plano ok, eu já imaginava que ele ia tentar fazer isso. Só não previ que iam trair a gente... Ele me deu uma pernada dessa vez.

Amor na GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora