— É. Depois disso, ele nunca mais conseguiu ver a princesa dele de novo.
— Por quê? Se ele passou 6 anos preso, porque nunca voltou pra ver a filha?
— Você sabe como funciona esse teu mundo, Marina. Ele fez muitos inimigos nessa caminhada, eu te falei, ele quem ajudou a unificar as bocas da Rocinha. Pra que a favela tivesse um dono do morro, um monte teve que perder a independência da sua boca e virar subordinado. — Explicou. — E esses inimigos tentaram matar a mãe da filha dele algumas vezes. Eu quase perdi você várias vezes e você não tem noção disso. — Contou, finalmente abandonando a 3° pessoa. — Ai ele entendeu que ele tinha se tornado um perigo pra família dele. Eu pedi pra ele sumir e me deixar criar você sozinha, pedi pra ele esquecer a gente. Era melhor ser pobre e viver, do que ter dinheiro e viver na corda bamba. E ele fez isso. As pessoas esqueceram quem ele era, quem a gente era e eu vivi quietinha com você durante todos esses anos.
— Você sabe alguma coisa dele, mãe? — Quis saber. — Eu tenho a impressão de que ele tem alguma coisa a ver com o que aconteceu, por isso você tá me contando essas coisas.
— Sei. — Ela suspirou de novo. — Ele saiu da Rocinha e eu fiquei alguns anos sem ver ele, mas a gente nunca perdeu realmente o contato. Eu e ele. — Confessou. — A gente não se via mais, mas nos falávamos às vezes. Ele sempre vai ser importante pra mim, eu acho... mas nossas vidas seguiram caminhos diferente. Eu decidi criar minha filha, ele decidiu ser bandido. Foi criar as raízes dele do outro lado da cidade, na Zona Norte, com a ajuda dos amigos dele. Ficou grande, como ele era aqui... Chegou onde ele queria, virou dono de algumas favelas da ZN. Fiquei sabendo que nos últimos anos a tropa dele tomou algumas aqui da Zona Sul. A principal delas foi o Pavão-Pavãozinho e o Cantagalo. Você sabe bem do que eu tô falando, né?!
O PPG! CARALHO! Tentei não me mostrar abalada pra minha mãe, mas não deu. Aquela noção caiu como uma bomba no seu colo. O comando do PPG era da porra do meu pai... Meu pai. A porra do meu pai. Meu Deus! Como aquilo tinha acontecido? Arregalei os olhos, negando com a cabeça como se não acreditasse nas coisas que ela tava falando. Não, mano... que porras... O comando do PPG, aquele que tinha dado força pro Misael se voltar contra o Caburé, era relacionado comigo. Se alguém descobrisse aquilo...
Sabe quando uma bomba estoura do seu lado e o barulho de deixa surda por uns segundos, ficando só aquele 'piiiiiii' e a poeira te cercando? Eu me sentia exatamente daquela maneira.— Tá me zoando. — Acusei.
— Porque eu estaria zoando contigo sobre isso? Eu não brinco, Nina. Não faço piada com assunto sério. — Falou, olhando pra mim com muita determinação. Funguei, passando a mão no rosto vermelho. Eu sentia minha cara quente e as minhas mãos tremendo. Caralho! Ca. ra. Lho!
— Não tem como isso não, mãe. — Neguei com a cabeça de novo. Eu estava totalmente chocada. Eu esperava qualquer outra coisa, menos isso. Pra mim, o meu pai estava morto.
— Tem sim, Nina. As coisas são assim. — Ela falou alto, por cima de mim, com uma expressão severa no rosto. — Eu não querer você envolvida no tráfico é muito além dos meus sentimentos sobre o corre da favela. Eu não gosto dessa merda, o movimento já tirou muita coisa de mim, mas você, Nina, você tá marcada por ele desde que nasceu. — Ela pegou minha mão. — Poucas pessoas sabem quem você é, mas as que sabem tem noção do quão valiosa é essa informação. Os moradores da Rocinha podem ter se esquecido dele, mas o tráfico não esqueceu. É perigoso pra caralho pra você. Ninguém merece morrer por um pecado que não é seu, ninguém merece morrer sem saber porquê. É a isso que tu tá se sujeitando no meio daquele monte de bandido... bandidos que são rivais do teu pai. Tu tem noção disso, Nina?
— Como assim? Ninguém sabe quem é meu pai, se soubessem, já teriam me contado.
— Como assim ninguém sabe? — Ela riu. — Se não soubessem, a gente não ia estar aqui.
— Quem sabia?
— Algumas pessoas, eu não sei ao certo quem, mas uma eu tinha certeza. O Salvador sabia e essa informação era a galinha dos ovos de ouro dele.
— O Caburé? — Botei a mão na boca. Meu Deus... — Foi por isso que ele...
— Exatamente por isso que ele te tirou da cadeia. Advogado bom não é barato, Nina. — Contou, me olhando como se eu fosse uma criança. — O Caburé iniciou no tráfico na boca do teu pai. Ele foi tipo o mentor dele nos primeiros anos do tráfico, então, ele conhecia você. Eu sempre tentava sondar o comando da Rocinha pra saber se eles sabiam que eu e você éramos, mas realmente, poucos sabem disso. A gente não precisa se preocupar quando o dono é inocente nessa história, mas quando ele sabe... todo cuidado é pouco, Nina. A gente por fora sempre pode fingir que não é ninguém, que nada aconteceu, mas quando você me desobedeceu e entrou pro corre, você caiu na mão de alguém que sabia bem que você era.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Amor na Guerra
Romanceㅤㅤ ㅤ"Geral quer ser rei, conspiram pro tempo que não espera. Impérios caem com novos reis, os tempos passam a ser de guerra." MC Marechal ㅤㅤ ㅤO sonho do moleque é ser chefe, o do vapor, do gerente e do segurança também é. O sonho do chefe é sobreviv...