— Vocês, da parte baixa, querem tirar o M7 do poder. É isso? — Prosseguiu, tentando entender sobre o que eu pretendia. Eu ainda tava meio acanhada de falar diretamente.
— É. — Falei em um tom cansado.
— E vocês querem minha colaboração. Como? — Voltou a perguntar.
— Acho que só de você não se envolver a ajudar o Misael já é o suficiente pra gente. O que desequilibra a nossa balança é você, é os homens que o M7 vai te cobrar. Ele vai pressionar a nossa frente de um lado, você chega pela parte baixa e nós não vamos durar nem um dia. Eu sei que a gente pode procurar outros aliados, mas de qualquer maneira, a nossa posição é totalmente aberta pra uma invasão sua. Além disso, o pessoal tem medo de envolver mais gente nessa história e eles se aproveitarem no final.
Ele riu por um momento e aquilo me preocupou profundamente.
— O mundo é assim, Nina. Peixe menor sendo engolido por peixe maior, um atrás do outro. Difícil tu encontrar lealdade quando o que tá em jogo é o faturamento milionário da Rocinha. Tu sabe quando dinheiro cês movimentam ali?
— Não o total, mas só o lucro na boca onde eu trampava já tinha muitos zeros no final.
— Mais de 10 milhões, Nina. Isso por mês na Rocinha e no Vidigal. — Falou com muita sinceridade. — O anual chega a passar dos 150 milhões nos anos bons. Favela que dá mais lucro do Rio de Janeiro quando tá em paz, quem não quer? Cês tão ali, do lado dos endinheirados da Zona Sul. Cês botam o preço do pó quanto vocês querem e os playboy não vão parar de pagar, porque eles podem. É o melhor tipo de cliente que tu pode ter. Quem não quer? — Insistiu. — Se vocês fraquejarem ali, cês vão rodar. Podem não perder a favela pro M7, mas vão perder pra outro se tiverem saído fodidos da briga.
Suspirei de novo, esfregando meus olhos com força dessa vez. Puta que pariu.
— Vou te falar como quem tem experiência no assunto. Favela tu entra, domina os pontos e cessa o conflito. Tiroteio todo dia chama polícia. Não existe isso de ficar trocando bala todo dia ali por meses, anos... O Governador vai comer o cu de vocês, vai botar BOPE e exército pra subir e apartar, se a polícia não der jeito. A cara de vocês vai ficar estampada no jornal toda manhã, mesmo que cês vençam, cês não vão ganhar se deixar isso se estender.
— A gente não tem outra opção, pai. Não temos pra onde correr. — Rebati. — É ficar ali e tomar a favela, ou morrer tentando.— Aprendeu rápido como funciona. — Ele riu de canto de novo. — Sabe, Nina... Se o M7 viesse aqui hoje e me pedisse mais homem pra matar vocês e reconquistar a baixa, eu ia redefinir o nosso acordo e pedir 35% dele. E ele ia pagar porque é a única opção dele.
— 35% do faturalmento total? — Meu queixo caiu.
— É. Hoje em dia meu acordo com ele é 20%. É esse o acordo que eu posso estender pros teus parceiros. Eu quero uma parte do faturamento mental, em troca, eu ajudo a dar a favela na mão de vocês, garanto meu apoio em qualquer invasão de fora, desde que não seja da polícia, e não me meto nas decisões internas de vocês lá.
— É muito dinheiro, eu não sei se eles vão aceitar isso.
— Eles devia. Eu não tenho interesse nenhum em interferir na sucessão da favela. Por mim, vocês podem colocar qualquer um que esteja de acordo com a minha taxa. Meu interesse não é ter a Rocinha, só uma parte dela. Um desenrolo nesses termos vocês não vão achar com mais ninguém.
Suspirei, sabendo que ia ser difícil... De qualquer maneira, aquilo era muito mais do que a gente encontraria por fora. Era uma saída pica pra situação, talvez a única, mas que ia deixar um sabor amargo na boca, sabia. Infelizmente, na vida real não tinha milagre. Não dava pra ficar esperando cair do céu uma alternativa melhor. Ela não existia.
— Eu sei... e vou dar um jeito de fazer eles aceitarem ela.
— Ótimo. Assim que a favela desocupar, eu vou botar um tropa lá na porta da Rocinha. De qualquer jeito, essa guerra de vocês não vai poder durar. Se ela vai estar do lado de vocês ou do M7, depende só de vocês. — Murmurou e eu bufei, me sentindo cansada por ter que tratar daquele assunto. — Mas se tiver do lado do M7, eu vou arranjar um jeito de tirar você de lá. Você, sua mãe, seus irmãos e mais algumas pessoas que você gosta.
— Obrigada. — Sussurrei, pressionando os lábios uns nos outros. — Mas se eu entrei nisso, é levar até o final. Mesmo se ele for ruim. — Levantei, dando um último gole no meu suco. — Tenho que ralar, deve ter gente me esperando em casa. — Dei a volta e beijei ele na cabeça, como fazíamos lá em casa.
— Chega ai, tô indo pro Fallet. Te dou carona até lá embaixo e tu pega um táxi. — Falou, levantando também.
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Amor na Guerra
Romanceㅤㅤ ㅤ"Geral quer ser rei, conspiram pro tempo que não espera. Impérios caem com novos reis, os tempos passam a ser de guerra." MC Marechal ㅤㅤ ㅤO sonho do moleque é ser chefe, o do vapor, do gerente e do segurança também é. O sonho do chefe é sobreviv...