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Na hora todo mundo levantou e foi pro parapeito da laje, ver onde que tava sendo o foco dos tiros. Era bem na entrada na favela, o que significava que tinha gente forçando a segurança dos soldados de lá. A porra da invasão que tava todo mundo esperando. O funk do paredão parou na hora e o Caburé mandou o DJ passar o recado pro povo: era pra meter o pé pra casa sem correria. Não que tenha adiantado de alguma coisa, já que conforme o tiroteio se intensificava, mais o desespero ia tomando conta da cabeça das pessoas. Não demorou nem 2 minutos pra geral começar a correr e a situação toda virar um tumulto do caralho.

Pela rua de trás, os envolvidos corriam pras suas motos e iam lá na frente, tentar parar quem tivesse entrando. Um frio percorreu minha espinha e eu tremi no lugar, apertando o corpo do meu parafal pra controlar o nervoso. Lembrei do Russo, do TK e, principalmente do sumido, o Barbás. Caralho... Onde eles tavam? Tavam bem? Cada rajada que eu ouvia, eu começava a rezar pra não ser em um deles. É... eu tinha que entrar logo, só a adrenalina pra não me fazer surtar pensando neles.

Quando eu fui descer, um dos seguranças do Caburé me segurou pelo pulso e ele fez um 'não' com o dedo.

— Vai descer não, vai ficar aqui. — Mandou.

— Por que, porra?

Ele não respondeu, só me puxou pelo braço e me fez andar com ele e os seguranças dele. A gente desceu apressadassos os andares da casa e saímos pela rua de trás. A idéia era pegar uns carros pretos que tavam do outro lado da rua. A merda era que um foco de tiro estava começando ali. Eles sabiam onde o Caburé estava e já tinham avançado até esse ponto? O quão impossível isso parecia? A gente ainda conseguia ouvir os tiros do outro lado da Rocinha... Mano?

Ouvimos a rajada pra cima da gente assim que saimos do beco pra rua, todo mundo se jogou no chão muito rápido. O parafal já tava na mão mesmo, foi até que bem rápido eu apoiar ele entre o chão e o meu ombro e começar a atirar, da mesma maneira que eu tinha tanto treinado nesses últimos meses. Eu aprendi a atirar direito com um fuzil nesse meio tempo, mas nunca tinha botado isso em prática até então. Eu consegui derrubar um dos caras que disparou contra a gente com um dois tiro na barriga, o outro um dos seguranças do Caburé de um jeito de matar. Os outros saíram correndo pelas vielas e dois dos caras que estavam com a gente foram atrás deles metendo bala.

A gente tava meio cercado ali, porque da rua de trás parecia vir mais e mais maluco querendo a nossa cabeça. Corremos de volta pra dentro do beco perto da quadra e nos abrigamos ali, trocando tiro contra os que tavam invadindo.

— Pra onde a gente vai? — Perguntei, botando a minha cara no cantinho do fim da parede, pra poder mirar nos caras que tavam vindo. Enquanto um dos seguranças dava uns tiros a esmo pra distrair eles, eu e mais um outro miravamos pra matar sem que eles tivessem notado.

— Pra Rua 1. Tenho que chegar lá pra dar ordem pra tropa. — Falou.

— Tem que dar ordem mesmo, não tava todo mundo lá defendendo a entrada? Como que tem tanta gente deles aqui dentro já? — Perguntei, meio em choque quando um tiro passou raspando em cima da minha cabeça.

— De lá de fora eles não vieram agora não, patrão. Os amigo tão segurando os alemão lá nas entradas, não tem nem como eles terem passado, eles já teriam alertado pra gente aqui no rádio. — O Suda falou.

— Vieram de onde então?

— Já deviam tá aqui. — O Caburé falou, chegando na confirmação de que ele realmente tava sendo traído.

A gente tava numa posição ruim, então, enquanto eu e mais um ficávamos ali trocando tiro pra segurar os caras no lugar, outros dois seguranças deram a volta por trás da rua pra pegar eles por outro ângulo. Era um movimento arriscado, mas tinha que ser feito, já que tavamos em menor número. O pessoal que o Caburé chamou no reforço pra ajudar a gente ali ficou presa em algum outro canto da favela e acabou defalcando na entrada da Vila, pra não deixar entrarem por lá, tiveram que voltar, o que deixava nós todos numa posição horrorosa ali. Era a nossa esperança, já que não sabiamos quanto tempo a gente ia conseguir segurar os invasores ali.

Eu nunca tinha estado em um tiroteio daquela forma antes, então, colocar as coisas que eu tinha aprendido em prática me deixava de perna bamba. Eu devia estar soando e tremendo de nervoso, mas me tava me esforçando pra manter os mãos firmes na arma. Pra economizar bala, eu ia dando de toquinho em toquinho no gatilho, esperando pela oportunidade de realmente pegar alguém.

Eu e o Suda tivemos que recuar, quando uma rajada estourou os tijolos da ponta onde a gente tava se escorando.

— Espera. — Pediu o Caburé e a gente teve que recuar vários passos. Nisso os caras tavam vindo pra cima da gente. Tivemos que voltar quase toda a rua e tomar cover na casa na esquina que tava atrás da gente. Na rua ao lado, o resto do pessoal tava escondido esperando um final. Foi ai que eu tive uma ideia do caralho.

— Salvador, segura ai os caras ai. — Pedi, já dando a volta pra me me embrenhar na rua do lado.

— Não, Nina, caralho. Volta aqui, porra! — Sussurrou pra mim, mandando eu voltar com a mão.

— Confia em mim, mano. Segura eles ai. — Pedi e ele, como não tava em posição de mandar algum dos seguranças parar de atirar pra ir atrás de mim, não teve como fazer nada além de me fuzilar com os olhos.

Eu fui abaixada e devargarzinho e encontrei os 3 outros escondidos atrás de poste.

— Eles tão entrando no beco onde a gente tava, vamo fechar eles lá. — Falei, contando o plano. — Tipo, um fica pra dar cobertura dos que tiverem de fora, os outros sentam o dedo.

— Vai dar bom. — Um deles concordou comigo, indo uns metros à frente pra ver onde os caras tavam. — Eles tão forçando lá mermo, não sabem que nós tá aqui não. Vai dar bom.

— Então, vamo. — Aproveitei pra arrumar a arma no meu corpo e me botar na posição. Devagar a gente foi em fila, na hora que a maior parte deles conseguiu se forçar no beco, a gente saiu metendo bala nas costas deles. O último da fila, ficou pra derrubar quem tava por fora. Enquanto o Caburé e o resto do pessoal apertava os caras da ponta de lá, a gente apertava eles dessa aqui e os alemão ficava encurralado bem no meio. Tinha sido uma cartada de mestre.

Em menos de um minuto, a gente tinha conseguido botar a parte parte deles no chão. Só sobrou os que tavam de fora e o parceiro que ficou responsável por eles não conseguiu derrubar. Esses correram pra se esconder e abriram caminho pra gente. Era a hora perfeita pra subir a favela como era o plano inicial.

Amor na GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora