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Os dias seguintes se passaram tranquilos até. Todos os dias, eu ia treinar com o Barbás lá na quadra da 1, o que significava que eu estava melhorando significativamente no tiro. Ele tinha me ensinado a desmontar e montar um fuzil todo. Mano eram tipo... MUITAS peças, quase um quebra cabeças e William não deixou eu largar de mão até eu ter acertado tudo de primeira. Ao menos eu tinha aprendido no final do dia. A verdade é que estava bem fácil com a pistola, rapidinho eu tinha pegado o jeito. Com o .762, por outro lado, eu não tava conseguindo manter a postura pra segurar o tranco pra trás. Era ruim até pra mirar. A parte boa é que eu tinha tempo pra tentar até conseguir...
Entre eu e ele, a coisa estava ficando cada vez pior. Acho que a gente tinha transado todos os outros dias da semana, perdemos até o baile pra ficar fodendo demais na cama dele. Era foda, a gente tava parecendo coelhos, na real mesmo.
Nesse exato momento, eu estava ajoelhada e apoiada sobre as pernas dele, depois de ter dado um agradinho pra ele depois de um dia foda. Barbás tava puto porque a Xica tinha marcado errado as vendas no dia anterior e o caderno de contabilidade deu merda, o Caburé falou bosta e eu achei que William fosse dar um soco na cara dele. O autocontrole desse homem era foda demais, se fosse eu já tinha surtado, na boa. Devia ser por isso que ela era considerado pelos caras da favela... Engolir a raiva, mesmo estando borbulhando por dentro, era uma puta de uma qualidade, mas fazia que ele tivesse essa máscara que frieza que ele tinha. Bom... ele descontou toda a raiva nos móveis da sala dele e eu vim dar uma ajuda à pobre mesa de maneira, ela não merecia ser chutada e socada como era.
Limpei o canto da minha boca com o gozo dele e de um sorrisinho.
— Tá melhor agora? — Perguntei.
— E tem como não estar? — Respondeu com um humor muito mais suave que anteriormente.
— Me diz você, ué. — Ri, levantando e dando um beijo na boca dele. A Xica tava me chamando lá em baixo. — Vou lá ver o que ela quer de uma vez.
— Faz o que tu tiver que fazer até 17h. Tem um negócio que eu quero te mostrar nessa hora.
Concordei com a cabeça e desci pra ver o que tava rolando. Acabei que fui ajudar a Shirley na boca e assumi a banca, porque ela queria ir comprar coisa pra comer. Fiquei ali fazendo umas vendas e conversando com o TK. Botei uma música na caixa de som e fiquei curtindo o 150bpm. Os adolescentes gostavam da agitação da boca quando eu tava ali comandando a coisa, então, eu sempre acabava vendendo um pouco mais. Jogar charme pra playboy era a minha especialidade. Eu gostava de fazer aquilo, era muito melhor do que ficar lá dentro nos bastidores. Ali eu via gente, conversava, brincava, socializava... Ficar trancada com uma vassoura era um pé no saco.
Quando a Xica voltou, a gente acabou atendendo juntas. A coisa virou uma festa e nem o TK que deveria manter a cara séria conseguiu, a gente ficou rindo pra cacete de coisas completamente aleatórias e conversando com os clientes. Virou uma festa, serio mesmo.
— E ai? O que mais? — Me inclinei sobre o balcãozinho dando um sorrisinho. Ele tinha pegado 2 pós de 10 e um prensado de 50 de maconha.
— Você pode ser? — Ele brincou, colocando as coisas na mochila.
— Eu sou cara, meu bem. — Dei uma risadinha. — Vai levar o paninho? É bonzão, eu juro.
— Vai usar comigo? — Rebateu de novo, rindo pra mim. — Seu sorriso é bonito.
— Sabe como é, né?! Eu não posso usar nada, se não meu chefe me mata. — Dei de ombros, indo buscar o pano de black lança pra ele. — Toma cuidado que isso ai vai te matar. Se liga. — Dei uma risinho contando o dinheiro das coisas que ele tinha comprado. — Vou pensar se te dou meu número, volta aqui outra vez que eu te conto o que eu decidi, valeu? — Ri pra ele, dando tchauzinho com a mão. — Onde cê disse que mora mesmo? Ipanema?
— Que porra é essa aqui? Virou bagunça nesse caralho? — Uma porrada na parede de tijolo atrás de mim me fez pular no lugar. O coração disparou na hora e eu virei pro TK, que pegou o fuzil do chão e passou a bandoleira pelo pescoço na mesma hora. Ele tinha um sorrisinho meio disfarçado no rosto. — Bora, desliga o som, filha. — Mandou o Barbás apontando pra caixa. — Antes que eu dê um tiro nessa porra, anda. Alto pra cacete. — Reclamou que nem um velho e a Xica correu pra fazer o que ele tinha mandado. — E tu, tá fazendo o que ainda? Já não comprou o que tu queria? Mete o pé.E é claro que o garoto foi embora. William sabia ser ameaçador quando queria e ali... é, ele tava bem ameaçador. Tava puto da vida, com uma cara de raiva e impaciência, um humor do capeta. Cruzei os braços, virando pra olhar pra ele com um beicinho. É... fazer charme era realmente minha especialidade.
— Na moral, ninguém ouviu o que o Caburé falou não? A polícia tá sem arrego, se eles entram ai, tu é o primeiro a rodar, porra. Tá dormindo no serviço, TK? — Brigou com ele primeiro. — E da próxima vez que isso tiver alto desse jeito, eu vou meter a porrada em vocês duas. — E virou pra gente com a mesma fúria. Xica pareceu inabalada, mas eu sabia que ela sempre ficava magoadinha quando ele brigava assim. Xica tinha o coração de um bebê.
— E tu. — Veio pra minha frente. — Vai dar porra de número nenhum não. Tá comendo merda?
— Cê trata o povo que vem aqui assim? Me admira que tu ainda ganhe dinheiro aqui.
— O jeito que eu mando nessa porra aqui é problema meu. — Respondeu daquele jeito dele. Normal, até eu já tava me acostumando.
— Suave, tu que sabe, patrão. — Dei o sorrisinho mais debochado que eu pude e virei de costas pra anotar a venda grande que eu tinha acabado de fazer. Foda... Enrolar playboy era fácil.
— Tu sabe que horas é? — Cruzou os braços, não saindo dali.
— Tô sem relógio. — Respondi, ainda não olhando pra ele.
— São cinco e quinze. O que eu falei pra tu mais cedo? — O tom dele ia ficando cada vez mais irritado. Me levantei quando lembrei do que ele tinha marcado comigo.
— Eita, eu nem vi a hora. O que é que tu queria? — Perguntei, indo pro lado dele.
— Larga saporra ai e vem. — Mandou. — Fecha 18h hoje, Shirley. Eu volto pra ver o que deu ainda.
Ele tava com Kawazaki parada do outro lado da rua, eu subi em silêncio, querendo só ver o que tava pegando. Fui quieta, tentando entender pelo caminho o que ele queria. O lugar onde ele parou, entretanto, foi o que me surpreendeu de verdade. Me arrepiei inteira quando vi a porta da escola da Vila e as crianças saindo pela porta da frente.

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Amor na Guerra
عاطفيةㅤㅤ ㅤ"Geral quer ser rei, conspiram pro tempo que não espera. Impérios caem com novos reis, os tempos passam a ser de guerra." MC Marechal ㅤㅤ ㅤO sonho do moleque é ser chefe, o do vapor, do gerente e do segurança também é. O sonho do chefe é sobreviv...