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Me vesti toda de preto, desde os sapatos até a jaqueta de couro e soltei os meus cabelos. Peguei meu celular minha identidade e coloquei no bolso, junto com uma boa quantidade de dinheiro. Antes de sair, eu arranjei um papel e uma caneta e deixei uma mensagem para as pessoas que eu amava "Confiem em mim." e coloquei debaixo do meu travesseiro. Quando tivessem procurando por mim, certeza que iam achar. Peguei uma um revólver .38 pequeno e coloquei por dentro da minha calça.
E saí de casa. Os passos firmes eram marcados com toda a certeza que eu podia ter. Não que eu não tivesse com medo... eu tava apavorada, mas eu não ia vacilar. Não dessa vez, não enquanto eu tivesse uma missão pra cumprir. Desci a favela a pé, por dentro dos becos e vielas, pois sabia que era menos movimentos, menos visado. Eu não podia ser abordada pela polícia agora. Logo me misturei à pequena multidão de trabalhadores que desciam a principal pra pegar o seu ônibus ou o metrô a caminho do trampo. Logo na entrada, tava o grupo de Mototáxis que nunca paravam e foi ali que eu achei a carona que eu precisava.
— Amigo, quanto até a Estrada da Gávea ali? — Perguntei.
— Até onde, dona?
— Até o final. Beirando ali o 99. — Disse.
— Dá 8. Eu só não entro lá dentro por cima, tá? — Avisou.
— Não vamo entrar. — Garanti e ele me deixou subir na garupa.
Ele saiu pra autoestrada e passou pelo túnel e deu a volta na praça da Graça. Pegamos a Estrada da Gávea era 7h ele subiu até realmente beirar as casas da favela. Instrui ele a parar num beco bem próximo da entrada mais escondida e famosa entre os envolvidos dali da parte alta. Eu sabia que, se o cara que fosse encontrar o meu pai saísse daquela favela, ele ia sair por ali e naquele horário. Desci e esperei, mas não deixei o motoqueiro sair. Tirei duas notas de 100 do bolso e botei na mão dele.
— Amigo, vou precisar da tua ajuda. Eu tenho que seguir meu marido pra ver se ele vai encontrar com a vagabunda da amante dele. A gente só vai esperar aqui e ir atrás dele lá na Zona Sul ver até onde ele vai. 200 tá bom?Deu 7h40 e eu já tava começando a perder as esperanças... Quando eu tava à um passo de desistir, eu ouvi o ronco de uma moto vindo a distância. Subi de volta na garupa do mototáxi muito rapidamente e quando o motoqueiro passou pela gente, eu sou que era dele que eu estava estava atrás. Todo descaracterizado, com o capacete na cabeça...
— É ele ali, moço. Segue ele, por favor. Não perde de vista, mas não deixa ele saber que a gente tá seguindo também, tá? — Passei umas instruções da maneira mais doce que eu podia. Assim fomos nós, pela caminho de volta.
Pela Estrada da Gávea novamente, saímos na Leonal Franca e mandei ele pisar fundo. Naquele hush normal dos dias de trabalho, estávamos nós ali, numa discreta perseguição ao meu suposto marido. Ele saiu pela Visconde de Alburqueque e pegou a Delfim, a estrada de frente pra praia mais famosa do Rio de Janeiro. O dia estava meio cinza, bastante nublado e o mar estava muito revolto. As ondas enormes quebravam sobre as faixas de areia anormalmente vazias, o vento gelado vindo do oceano me arrepiou a pele nua da nuca e eu fechei os olhos por um momento. Eu era maluca, muito maluca... Era uma ação ousada pra caralho, eu sabia que o que poderia vir a me acontecer não podia ser exatamente o que eu planejava. Eu não esperava facilidade pra chegar até o Carlos, mas estava contando com a sorte e o apoio do Pai Celestial pra me fazer chegar até lá inteira. Eu podia morrer ali, mas nem esse pensamento mórbido me fez desviar novamente os olhos da minha presa.
Ali na General Osório, nós começamos a ver a enormidade com que o Galo se erguia. Mais e mais o cara que a gente perseguia se embrenhava por dentro das ruas bonitas do bairro chique que precedia a favela. Em uma das esquinas da entrada do Túnel, em frente à uma galeria de arte e capoeira, logo antes do início das casas características, eu mandei o mototáxi acelerar e fechar a moto do "marido". Ele mais uma vez hesitou, mas eu pressionei e o cara acabou cedendo. Era uma rua aparentemente sem saída e tão vazia e silenciosa quanto uma catacumba. O lugar perfeito.
A ideia era o mototáxi fechar ele e fazê-lo parar, mas o filho da puta não conseguiu freiar a tempo e terminou relando na moto onde a gente tava, levando todos nós três pro chão. Com a adrenalina que tava sendo bombardeada nas minhas veias, eu nem senti a dor do impacto com o asfalto. Levantei de uma vez, meio cambaleante e fiquei olhando ele fazer o mesmo. O cara tirou o capacete e me olhou com raiva.
— Cês tão malucos, porra? Querem morrer? Que caralho é esse? — Brigou, levantando a própria moto. — Tomar no cu, caralho.
— Desculpa ai, irmão. — Falei, tossindo fingidamente. — Se machucou?
— Arranhou minha moto toda, seus filhos da puta. — Reclamou.
— Normal, po. Não é a primeira moto que eu arranho sem querer não. — Tirei uma com a cara dele, fazendo referência a maneira como eu conheci o Barbás. — Segue teu rumo. É pra essa favela ai que tu quer subir? — Apontei pras casas nas nossas costas.
— Tá me tirando, piranha? — Ele veio boladão pra cima de mim, tirando uma pistola da cintura e botando na minha cabeça. Engoli em seco, olhando ele bem nos olhos.

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Amor na Guerra
Romanceㅤㅤ ㅤ"Geral quer ser rei, conspiram pro tempo que não espera. Impérios caem com novos reis, os tempos passam a ser de guerra." MC Marechal ㅤㅤ ㅤO sonho do moleque é ser chefe, o do vapor, do gerente e do segurança também é. O sonho do chefe é sobreviv...