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— Não fode, caralho. Maluco é você que vem falando assim comigo. — Respondi.

— Agora tu escuta, porra. Escuta nesse caralho aqui, que tu é criança. Criança. — Falou alto e eu mais alto ainda.

— Irmão, eu apanhei e fui esculachada um dia inteiro nesse cacete pra tu vim aqui falar comigo como se eu não soubesse o que eu tô fazendo, vai se foder, porra. Não era chamar a atenção do Mandarim o que tu queria, tá chamado, porra. Ele tá olhando pra gente, e ai? — Eu cortei ele e ele a mim. Nenhum de nós se escutava, a gente só tava gritando um por cima do outro. Mano, acho que o Barbás e eu nunca tinhamos perdido a linha assim um com o outro.

— Mermão, tu quer fazer merda só por si própria? Faz sozinha nesse caralho. Fica sozinha. Não faz tua mãe, teus irmãos e eu ficar aqui que nem uns otários por tua causa não, porra. Tu não é mulher nem pra assumir as cagadas que tu faz, vem aqui dizer na minha cara que tava pensando na gente. Não fode, Marina. Tem que comer muito arroz com feijão pra isso ainda, porque tu é criança nessa caralho — Ele gritou, muito próximo de mim. — Mulher que é mulher de fé não faz uma porra dessas com a família. — Empurrei ele com toda a força que eu tinha, pra tirar ele de perto de mim. Eu tava com raiva, meu rosto tava ficando vermelho de tão puta que eu tava, eu sentia o coração batendo nos meus ouvidos.

— Você não sabe de porra nenhuma. Nenhuma! — Gritei, vendo minha mãe e todos os meus irmãos se aglomerarem na porta. — Do jeito que vocês iam fazer, a única coisa que iam conseguir era ele aqui, batendo no caralho da porra porta e enfiando tiro na gente. O Caburé tentou fazer desse jeito também e aí? Tá debaixo da terra, porra. Só que ninguém me escuta nesse caralho, eu ia falar, falar e vocês iam cagar pra mim, porque vocês não botam fé em porra nenhuma que eu faço. É assim mermo que tu me vê, como criança. — Rebati, gritando no mesmo tom comigo. — Só que tu tá se esquecendo que é da minha vida que cês tão falando e aqui quem tem a palavra final sou eu. Sou. Eu. — Bati o pé no lugar, apontando o dedo o mesmo jeito. Ele tirou minha mão da cara dele e saiu de perto de mim.

— Irmão, eu vou sair daqui antes que eu vire a mão na tua cara. Eu não bato em mulher nesse caralho, nunca bati, e vou continuar assim. — Na porta ele virou pra mim antes de sair. — Se é ser tão independente o que tu quer, fica sozinha nessa porra ai, é melhor. — E ralou.

Eu fiquei olhando ele sair com a mandíbula trancada. Raiva e frustração faziam lágrimas grossas descer pelo meu rosto sem que eu pudesse controlar. Gritei de nervoso e de um soco no pia, me escorando lá e deixando que todos os murmúrios de lamento me escapassem junto com a respiração. Nesse meio, eu comecei a chorar audivelmente. Meu coração tava pequeno no peito, as palmas estavam começando a ferir de tanto que eu apertava as unhas contra elas.

— Wallace, vai atrás dele, por favor. Vai ver se ele tá escondido direito. Não deixa ele fazer merda e ser enquadrado. — Falei, sentindo soluços presos na garganta me balançarem inteira.

— Tá, eu vou. — Ele sussurrou. — Vai dormir, Nina, mais tarde a gente conversa. — E me beijou na testa, saindo correndo atrás do amigo. Eu fiquei ali, me sentindo exposta sob os olhares da minha família.

— Depois eu vou dar a devida explicação pra todos vocês, eu preciso de um tempo agora. — Sussurrei quando passei por eles e subi direto pro banheiro. Joguei minhas roupas todas no chão e tomei um banho merecido. Depois, foi direto pra cama. Passei a chave no quarto pra ninguém mais entrar (só a Dalila conseguiria com a chave dela, afinal, aquele cômodo também era dela) e fiquei ali, abraçada ao meu travesseiro e agradecendo por ter conseguido voltar pra casa, ao mesmo tempo que gritava de agonia e tristeza pelo Barbás. Aquele otário filho de uma puta... 


[...]

Acordei mais tarde naquele dia, antes do sol de pôr. Porra, eu tava inquieta... Passei um tempo sentindo o cheiro do meu travesseiro e apreciando a sensação de "casa" por uns minutos, antes de levantar e ir tomar um banho. Desci para a sala e fiquei sentada lá uns minutos sozinha. Agora, enquanto eu estava de volta, eu só conseguia pensar como a vida era frágil e como a morte era nossa fiel companheira de todos os dias. Uma batida do coração, um sopro de respiração... isso tudo podia cessar por um passo errado. Menos que isso, nós podiamos morrer por pura falta de sorte. A violência, que era a nossa proteção contra a morte, também podia ser o atalho até ela.

— Oh Nina! — A Dalila notou minha presença ali e correu até mim, se pendurando no meu pescoço. Fiquei aninhada nela por um tempinho, até notar a presença do Wallace, que se sentou no chão bem na minha frente, colocando o bico sobre o colo. — O que que tu foi se enfiar lá?

— Eu não queria ameaçar meu pai. — Dei de ombros. — Desculpa, Wallace, mas eu tenho que tomar as rédeas da minha vida. Então eu fui lá dar minha cara a tapa.

— Tu podia ter confiado na gente...

— Wallace, não dava. Vocês não iam deixar eu ir e eu precisava. Eu tava ficando agoniada de ser a única ignorante nessa história toda, quando ela tem absolutamente tudo a ver comigo. — Falei por cima dele. — Não vamo discutir isso, tá? Já foi.

Ele ia falar alguma coisa, mas eu o interrompi.

— Por favor, mano. São águas passadas, na boa.

— Só quero dizer que se isso rolar de novo...

— Não vai, prometo. — E assim, eu dei aquele assunto por encerrado com ele. Escorreguei para o chão pra dar um abraço muito, muito forte nele. Depois, voltei pro meu lugar, abraçando os meus joelhos com os braços.

— Não vai, prometo. — E assim, eu dei aquele assunto por encerrado com ele. Escorreguei para o chão pra dar um abraço muito, muito forte nele. Depois, voltei pro meu lugar, abraçando os meus joelhos com os braços.

— Como foi lá? — Dalila perguntou.

— Eu consegui um acordo com ele. — Falei de uma vez e vi o Russo ajeitar a postura, olhando pra mim com curiosidade. — É a única forma que a gente vai ter de comer o cu do Misael com gosto.

— Que acordo, Nina?

— Seguinte, o Misael tá dando 20% na mão dele todo mês. A gente pode assumir o lugar dele nesse rolo, ai ele vem pro nosso lado nos 45 do último tempo e essa é a cartada final nele. Se a gente não aceitar, ele vai ajudar o Misael e ai a gente cai. — Expliquei, ocultando a parte que eu podia tirar eles dali caso chegássemos naquele ponto cabal. Aquilo era só a última opção, então, eu ia deixar aquela informação guardada só pra caso precisasse.

Eu e ele passamos o resto da tarde conversando sobre o assunto. Eu contei tudo com detalhes, mostrei as escoriações que eu tinha no corpo, uns roxos e uns arranhados, foquei nos pontos do acordo. Eu enfatizei várias vezes que nós precisávamos fazer os outros aceitarem o que o Carlos estava propondo, porque era ele quem ia fazer a balança pender pro lado vencedor. A gente sabia que ia ser difícil, mas era o que tinha que ser feito. Fiz ele entender isso e esperava que ele conseguisse passar o recado. Amanhã cedo ia ter uma reunião de todos eles, na qual ele avisou que era melhor que eu não fosse por um motivo que não quis explicar muito bem, mas prometeu que ia repassar tudo o que tava sendo dito ali.

Ai... ai era só rezar e esperar pelo melhor, a minha missão eu tinha cumprido.

Amor na GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora