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— Eu achei chique demais. — Brinquei, tirando os brincos e devolvendo pro suporte. — Mas o brinco é pesado. Não dá eu dormir com ele. — Comentei, fechando a caixa de veludo. Fui até a cozinha e olhei na adega, pegando uma garrafa de vinho e uns copos pra gente. Tá, eu tava no clima... esperava que ele também.

Voltei pra sala devagar e o encontrei distraído, olhando pras joias e dando um sorrisinho de canto. Ele parecia feliz... Ver o Pedro e notar como ele tava bem de verdade deve ter tirado um peso enorme das costas do Barbás. Ele ia ter que passar por tratamentos bem longos, mas de um jeito ou de outro, ia ficar bem. Todos nós...

Agora que o furacão tinha passado, eu e ele estávamos catando os nossos caquinhos com calma. Fazia mais ou menos umas 4 semanas desde que tinha acabado o problema de vez, que a Rocinha tinha ido pras mãos dos três que sobraram do "levante". Até então o lance de ter três pessoas dando ordens na favela não tinha tido nenhum problema grave, apesar da maioria das pessoas serem contra a ideia. A verdade é que o Barbás, o Russo e o Parma dividiram bem o território entre si, cada um deles ficava responsável por um certo número de bocas e é isso. Como eram poucas, não foi escolhido ninguém pros cargos de "gerentes maiores" como o do preto, do branco e o geral. Sempre que tinham que era um assunto que fosse do interesse dos três, eles se juntavam pra discutir.

Outro ponto engraçado é que eles não eram vistos como autoridade na favela toda, na verdade, nenhum deles era tratado como o Caburé ou o M7. Eu não sabia bem o que aquilo significava, mas como o Barbás não parecia incomodado, eu nem esquentava. Agora... o trabalho era muito mais intenso que quando era só a Barcelos. Will ficava o dia inteiro na rua, subindo e descendo favela, ou então, trazia uma porrada de caderno pra casa pra ficar batendo um por um. Por isso, ele sempre tava estressada. Bom... por isso e por mais umas coisas que eu desconfiava. Os desfechos que teve a retomada da Rocinha tinham o abalado, por mais que ele, turrão, não confessasse aquilo pra ninguém. Sempre desconfiado, sempre nervoso, ficava agitado muito mais rápido que antigamente, onde eu jurava que ele era uma rocha que não se afetava por nada. Eu queria conversar sobre aquilo com ele, mas sabia que o Barbás ia acabar desconversando e negar.

De algum modo, era como se nada tivesse mudado na favela, tirando o fato de que, agora, o Will não ficava mais na boca da Barcelos. E eu? Eu andava meio inconstante. A dor da morte do meu irmão ainda tava latente no meu peito, mas eu já conseguia suportar e seguir em frente. Eu ainda não tinha voltado à minha boca, ao meu posto nela. A verdade é que toda a estrutura que a gente tinha lá tinha sido desfeita, pura e simplesmente. Barbás não tinha mais como gerenciar ela especificamente, TK agora era segurança dele e só dele, Shirley tava no hospital, então ela estava fechada por ora, enquanto a droga pro pessoal ali da frente vinha da boca da Vila, que já não tavam mais muito felizes em trabalhar com o dobro da capacidade.

Sabia que uma hora ou outra, eu ia ter que voltar a trabalhar, mas, pelo menos por enquanto, eu tava bem, quietinha no meu canto, me recuperando e curtindo um pouquinho da "lua de mel" que eu e o Will estávamos vivendo. É, a gente tava bem feliz... Apesar dos apesares, tudo parecia bem agora.

— Vai ficar só me olhando ai? — Ele chamou minha atenção. Mostrei o que eu tinha trago pra gente e chamei ele pela mão, subindo as escadas até o nosso quarto. Coloquei os copos na mesa de quina e me joguei na cama, trabalhando na tampa na garrafa.

— Vamos tomar um vinhozinho e transar. — Brinquei, mordendo o lábio inferior enquanto conseguia abrir o vinho finalmente. Servi a gente e ele sentou atrás de mim. — Tim tim. — Me virei de frente pra ele e brindamos. Ele se moveu pra ligar o ar pra gente.

Era tão gostosinho aquela sensação de que estava tudo tranquilo e que um problema não ia tirar a gente da cama no meio da madrugada. Dinheiro nenhum seria capaz de pagar as coisas que só a paz conseguia proporcionar. Hoje eu sabia e aquela era uma lição que eu ia levar pro resto da minha vida.

— Eu amei o presente. Obrigada... de verdade. — Me aninhei à ele, aproveitando a proximidade e a intimidade que a gente tinha conquistado durante todo esse tempo juntos.

— Achei que combinava contigo quando bati o olho. — Ele falou, encostando na cabeceira da cama e me trazendo junto com ele.

— Sério? É por causa do pingente? Ele é demais, parece um raio de luz assim...

— E é. — Confirmou. — Eu tava de olho só nas nossas alianças quando fui lá, voltando do desenrolo com o coronel do batalhão. Aí eu vi ele, me lembrou você...

— Por causa da luz?

— É. Você tem luz, Nina. — Ele passou a mão nos meu cabelos, enroscando ela nos fios, próximo a raiz. Eu amava quando ele pegava assim. — Na minha vida você foi assim, tipo uma luz.

Sorri, sentando sobre as pernas dele e beijando a sua boca. Coloquei o meu copo e o dele em cima da mesinha, sem me separar um centímetro. Eu amava aquele homem, amava de verdade. Ele me trazia a sensação de segurança que eu não conseguia sentir com mais ninguém. Com ele, eu acreditava que, independente da dificuldade, tudo ia ficar bem.

Amor na GuerraOnde histórias criam vida. Descubra agora